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Direto de Doha: o corre-corre das reformas para a Copa do Mundo

Enquanto acelera fim das obras, Catar também tenta provar avanços em questões sobre condições de trabalho e Direitos Humanos

Por Da Redação 1 abr 2022, 09h56

Do lado de fora do Doha Exhibition & Convention Center, em West Bay, palco do sorteio dos grupos da Copa do Mundo de 2022 que acontece nesta sexta-feira, 1º de abril, às 13h (de Brasília), o Catar ainda corre contra o tempo para concluir duas importantes missões. A primeira é desmontar os canteiros de obra que transformaram a paisagem de Doha e seus arredores em lugares empoeirados e esburacados. Os tapumes proliferam por todos os cantos e enchem a cidade com o ruído das máquinas, mesmo tarde da noite. A segunda é tentar limpar a barra da organização do Mundial com relação a problemas com as condições de trabalhadores. Para colocar de pé modernas e enormes arenas de concreto e aço, como as 378 toneladas que compõem o estádio Al-Janoub, onde antes só havia areia, pedras e arbustos secos, o país enfrentou uma série de questionamentos e denúncias.

Desde 2013, quando uma investigação da Confederação Sindical Internacional – ITUC, na sigla em inglês – estampou as páginas do jornal britânico The Guardian, as condições de trabalho de operários estrangeiros estão sob escrutínio. Falou-se das jornadas extenuantes, com duração entre 12 e 14 horas, em muitos dias com temperaturas beirando os 50°C. E também das péssimas condições de higiene dos alojamentos, mesmo durante a pandemia de Covid-19.  Houve denúncias de retenção de passaportes e documentos, para impedir mudanças de emprego, da pagamento da jornada de trabalho por valores irrisórios (equivalente a R$ 6, a hora), de condições insalubres de moradia (casos de até doze operários compartilhando um mesmo alojamento sujo e mal-ventilado), de atrasos e até calote nos salários, por parte de empreiteiros, e de falta de segurança.

Segundo outra reportagem publicada pelo Guardian, no ano passado, até o final de 2020, em uma década, teriam morrido 6.751 operários envolvidos nas obras. Essa conta macabra inclui óbitos de indianos, paquistaneses, bengaleses, nepaleses e cingaleses, mas deixa de fora outras nacionalidades, comuns em canteiros, como quenianos, sul-africanos e filipinos.

“A decisão de conceder ao Catar, o direito de organizar a Copa do Mundo foi tomada de maneira inaceitável”, disse da tribuna do Congresso da Fifa, realizado na última quinta-feira, 31 em Doha, Lisa Klaveness, a presidente da Federação Norueguesa de Futebol e ex-jogadora da seleção do país. “ Não deve haver mais espaço para países-anfitriões que não garantam legalmente a liberdade e a segurança de trabalhadores ou o respeito das pessoas LGBTQIA+”, completou. Como de acordo com as leis do Catar o homossexualismo continua a ser um crime punível penalmente, no mesmo dia, dezesseis organizações focadas nesta causa expressaram preocupação e pediram garantias de segurança à Fifa e ao Comitê Organizador da Copa de 2022.

Estádio Al-Janoub, um dos palcos da Copa no Catar -
Estádio Al-Janoub, um dos palcos da Copa no Catar – (Cristiani Apolonio/Placar)
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Durante seu discurso de encerramento, na mesma tribuna – e, também, depois na entrevista coletiva com os jornalistas, no Centro de Exibições & Convenções de Doha, o suíço Gianni Infatino, presidente da Fifa – preferiu destacar os avanços nos direitos humanos no Catar. “Nos últimos doze anos, desde que este país foi escolhido para organizar o Mundial de 2022, houve um progresso imenso nas questões relacionadas aos Direitos Humanos e Sociais: é certo que ainda há o que melhorar, mas já houve avanços notáveis”.

Um deles, segundo Infatino, foi o fim do draconiano sistema da kafala (“patrocínio ou garantia” em árabe), pelo qual um estrangeiro não pode mudar de trabalho ou ir embora do país sem a permissão de seus empregadores, nem sempre com escrúpulos, muito comum nos países da região do Golfo Pérsico. Ele é definido por organizações de defesa dos Direitos Humanos, como a Anistia Internacional, como uma estrutura de “enganação e abuso”. Segundo um relatório da ONG, há denúncias de empregados que desembarcam no país pagando entre 1.200 dólares a 2.000 dólares a empresas de intermediação de mão-de-obra para obter uma vaga na construção dos estádios. Portanto, bem acima dos cerca de 275 dólares de salário-mínimo no país. Outro agravante é que para pagar essas caras taxas de recrutamento, muitos trabalhadores tomam empréstimos com juros altos. Ou seja, caem em uma teia de dívidas da qual é difícil se livrarem.

Mas, segundo as autoridades catarianas e dirigentes da Fifa, está havendo uma série de transformações que estão mudando este jogo. Entre elas, houve o reajuste no salário-mínimo, reformas nas leis trabalhistas e um aperto na fiscalização. “O Catar ainda não é um paraíso, ainda há muito trabalho a ser feito, mas mudanças e progressos estão acontecendo ”, disse Infantino. “Muitos dos que antes nos criticaram tornaram-se nossos parceiros e estamos transformando um evento mundial em uma oportunidade para mudanças”, concluiu, na mesma linha, Hassan Al Thawadi, secretário-geral do Comitê Organizador Catar 2022. Com cerca de 2 milhões de trabalhadores estrangeiros em atividade no país que organizará a próxima Copa do Mundo, a esperança é que o legado social que está brotando seja ainda mais relevante para a vida das pessoas do que estádios arrojados e prédios modernos e uma infraestrutura nova em folha.

Presidente da Fifa, Gianni Infantino, com a bola da Copa de 2022, em Doha, no Catar -
Presidente da Fifa, Gianni Infantino, com a bola da Copa de 2022, em Doha, no Catar – (Franck Fife/AFP)
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