A edição especial de VEJA 1822 é um mergulho histórico no Brasil de 200 anos atrás, como se a revista já existisse naqueles conturbados dias da independência do Brasil de Portugal, quando Dom Pedro deu o célebre grito à margem do riacho do Ipiranga. Em 1989, VEJA lançara um exemplar que reconstruía um número de novembro de 1889, quando da Proclamação da República. Em 2000, a ideia foi repetida para celebrar os 500 anos da chegada de Pedro Álvares Cabral ao Brasil. Usar recursos atuais para mergulhar no passado virou um clássico imediato — e berço de uma nova visão sobre momentos decisivos da história brasileira. Agora, em tempo de internet e redes sociais, a empreitada é ainda mais rica (e divertida).
Para desfrutar deste trabalho minucioso é preciso levar em conta alguns critérios:
• O 7 de setembro de 1822 caiu num sábado. Deve-se imaginar, portanto, que esta edição tenha sido finalizada em 13 de setembro de 1822, a sexta-feira seguinte — é a data que aparece ao pé das páginas do impresso.
• Tudo o que ocorreria depois, portanto, ainda não aconteceu. Deu-se prioridade aos assuntos da semana, mas não só eles. Para oferecer um quadro daquele tempo, publicam-se também notícias sobre fatos acontecidos ao longo de 1822 e de anos anteriores.
• Para a reconstituição dos acontecimentos de 7 de setembro de 1822, deu-se preferência a textos de cartas, jornais e diários daquele período. Com algumas exceções: no caso das ilustrações, foi preciso recorrer a obras feitas posteriormente, mas sempre se referindo aos episódios-chave e a personagens da independência. Apenas na seção de humor, escrita pelo jornalista Edson Aran, VEJA se permitiu tratar de temas atuais — recurso necessário para a boa compreensão das brincadeiras, ao associar o ontem e o hoje, e daí extrair o riso.
• As reportagens são escritas no português de hoje, e não no de 200 anos atrás. As declarações entre aspas são literais.
Há, entre as várias atrações, uma entrevista de Páginas Amarelas com a imperatriz Maria Leopoldina, um perfil de José Bonifácio de Andrada e Silva e uma seção Gente encabeçada pela mais conhecida amante de dom Pedro I, que viria a ser a marquesa de Santos. Ao voltar no tempo, para tornar contemporâneo um momento seminal do Brasil, VEJA ajuda a esclarecer alguns mitos sobre as circunstâncias da independência. O maior deles foi construído em torno da celebrada pintura de Pedro Américo, de 1888, feita portanto mais de sessenta anos depois do grito do Ipiranga. Como notou a historiadora Lilia Moritz Schwarcz, coautora do livro O Sequestro da Independência — Uma História da Construção do Mito do Sete de Setembro, a “tela capturou nossa imaginação”. Ela mostra dom Pedro fardado, montado num cavalo garboso e em postura épica. Não foi bem assim, é o que revelam os fatos colhidos no calor da hora — e que VEJA publica, com o olhar de dois séculos atrás. Na realidade, o príncipe regente estava em trajes comuns; montava uma mula, “uma besta baia gateada”, e estava cercado por uma comitiva reduzida e cansada. Existem, naturalmente, versões conflitantes, relatos diversos, hiatos impossíveis de ser preenchidos — mas o mergulho naquela semana talvez seja o modo mais adequado de iluminar o que realmente aconteceu.
VEJA Especial 1822 começou a ser preparada no início do ano, com o olhar atencioso e refinado do escritor e pesquisador Paulo Rezzutti, membro de diversos Institutos Históricos e Geográficos do Brasil — um dos mais celebrados especialistas nessa fase da travessia brasileira, e que acaba de lançar Independência — A História Não Contada (Editora LeYa). Rezzutti cruzou datas, verificou frases — foi guardião fiel e incansável da premissa de só valerem os eventos daqueles dias, sem concessões. VEJA contou também com a atenção da pesquisadora Susana Camargo — que trabalhara nas edições de 1989 e 2000, em tempo pré-internet, de consultas presenciais aos arquivos, de memória e rigor infinitos. Findo o levantamento, em nove meses de trabalho, uma dezena de sites de bibliotecas e museus e mais de três dezenas de livros e revistas foram consultadas.
Com esta edição, VEJA espera colaborar para um atributo essencial da civilização: o conhecimento, ao avesso das notícias falsas tão ruidosamente espalhadas pelas redes sociais. Vale citar uma frase do poeta inglês Lord Byron, reproduzida na seção Veja Essa desta edição de 1822: “Aqueles que não raciocinam são fanáticos, aqueles que não conseguem são tolos e aqueles que não ousam são escravos”.
Boa leitura! Bom passeio histórico
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