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Temporada de casamentos: Gestoras de recursos vivem momento de consolidação

Juros altos, custos maiores e regras mais rígidas vêm provocando o movimento no mercado

Por Juliana Machado e Antônio Gioia
27 set 2024, 06h00
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  • A agenda de João Carlos Mansur, fundador e presidente da gestora de recursos Reag, nunca esteve tão concorrida. A empresa surgiu em 2012 com foco em fundos imobiliários, mas foi diversificando suas atividades até se consolidar como uma das mais relevantes gestoras independentes do país, com 180 bilhões de reais em ativos sob gestão. Boa parte do crescimento veloz da companhia deve ser atribuída ao apetite por aquisições. A Reag comprou casas como a Empírica e a Quasar, especializadas em crédito, mas não pretende parar por aí. “O mercado está maduro para uma consolidação”, diz Mansur, em entrevista exclusiva a VEJA NEGÓCIOS. “A junção entre a necessidade de ganhar escala e o aumento das exigências regulatórias tem estimulado vários negócios.” Como bom mineiro, Mansur trabalha em silêncio. No entanto, quem circula pela região da Avenida Faria Lima, coração do mercado financeiro de São Paulo, sabe que a sua próxima tacada será na gestão de patrimônio, ou wealth management. Atualmente, a Reag tem cerca de 8 bilhões de reais geridos nessa atividade. A meta é triplicar esse número no curto prazo, por meio de novas aquisições.

    arte gestora de finanças

    A trajetória da Reag traduz um movimento que se intensificou nos últimos dois anos no Brasil: a consolidação do mercado de gestoras de recursos, que envolve desde a aquisição ou fusão de concorrentes até o lançamento de produtos com novas estratégias, sobretudo nos segmentos imobiliário e de crédito privado. O objetivo é um só: sobreviver. “Com um ciclo longo de juros altos no Brasil e no mercado americano, o negócio de gestão virou um grande desafio”, afirma Guilherme Malouf, sócio do escritório de advocacia Machado Meyer e responsável por fusões e aquisições grandes no setor de gestão, como a venda da Panorama Capital para a AZ Quest. “Nesse ambiente, é mais complicado captar recursos. Combinar operações vira uma saída de injeção de capital.”

    A vida dos gestores, de fato, ficou mais difícil. Esses profissionais costumam ser remunerados de duas maneiras: cobrando taxa de administração (um percentual sobre o montante total gerido) e embolsando parte do ganho que superar um indicador financeiro (por exemplo, 20% sobre o que exceder o CDI). O problema é que, com o aumento da competição e da taxa de juros, as duas fontes de receita vêm sendo pressionadas. Para ter ideia, estatísticas da Anbima, entidade que regula o mercado de capitais, mostram que a taxa média de administração dos fundos multimercados, que são livres para aplicar em quaisquer classes de ativos, caiu pela metade em cinco anos. No fim de 2019, a taxa média era de 1,87% ao ano. Em junho de 2024, encolheu para 0,95%. Ou seja: para ganhar 1 real por ano, o gestor tinha de gerir 53,48 reais em 2019 e 105,26 em 2024. O total de recursos administrados, porém, não cresceu na mesma proporção. Considerando valores deflacionados, o patrimônio líquido dos fundos multimercados diminuiu 6,6% de 2019 a 2024, dinâmica semelhante à que se viu nos fundos de ações, em que a contração foi de 17,3%, também conforme a Anbima.

    Campos Neto, presidente do Banco Central: a taxa básica Selic deve subir até o fim deste ano
    Campos Neto, presidente do Banco Central: a taxa básica Selic deve subir até o fim deste ano (Raphael Ribeiro/BCB/.)
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    Uma situação parecida ocorreu com a taxa de performance. O retorno da maioria dos fundos multimercados é comparado ao CDI. Segundo levantamento da consultoria Elos Ayta, em 2024, até agosto, o CDI rendeu 7,43%, enquanto o IHFA, que mede a rentabilidade média dos fundos multimercados, variou 2,86%. Em outras palavras: poucas gestoras de fundos multimercados conseguiram cobrar taxa de performance, um drama que se repete também com os gestores de ações.

    arte gestora de finanças

    Ao que tudo indica, a situação não deverá ficar mais fácil. Segundo o Boletim Focus mais recente, divulgado pelo Banco Central, a expectativa do mercado para a Selic no fim de 2024 é de 11,25% ao ano. Com Roberto Campos Neto, presidente do BC, endurecendo a política monetária para conter a inflação, o cenário piora para os investimentos de risco (como ações) e melhora para a renda fixa em geral.

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    Para tornar o panorama ainda mais complexo, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) endureceu o jogo. No fim de 2023, a autarquia publicou a Resolução 175, que traz uma série de atribuições novas para as gestoras. “Há mais obrigações relacionadas ao compliance, à prevenção da lavagem de dinheiro, ao conhecimento do cliente, entre outras”, diz Fernando Camargo Luiz, gestor da Trópico Investimentos. Isso eleva estruturalmente os custos e a complexidade do trabalho, e estimula as fusões para fatiar as dificuldades.

    Pátio Victor Malzoni (SP): prédios corporativos estão no portfólio da gestora Pátria
    Pátio Victor Malzoni (SP): prédios corporativos estão no portfólio da gestora Pátria (Daniel Cymbalista/Fotoarena/.)

    Na corrida pela sobrevivência, grandes nomes entraram no jogo. É o caso da gestora Pátria, que pagou 650 milhões de reais pelos fundos imobiliários do banco Credit Suisse. No início do segundo semestre, a empresa fechou mais duas aquisições. A primeira foi a da VBI Real Estate, que administra 10 bilhões de reais em fundos imobiliários. O Pátria detinha 50% das ações da gestora e comprou os demais 50%. O outro negócio envolveu a compra da colombiana Nexus Capital, casa com 800 milhões de dólares em fundos imobiliários. Ao que tudo indica, as aquisições devem seguir. “Todos na gestão de fundos imobiliários estão sentindo o aumento do interesse por aquisições”, afirma Paulo Bilyk, presidente da Rio Bravo Investimentos. “Fundos abertos sofrem saques em períodos difíceis, como tem sido nos últimos anos. Fundos listados, que pagam renda, garantem maior estabilidade de patrimônio.”

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    Outra área promissora é a de crédito, em que os produtos têm retorno atrelado ao CDI ou à inflação. Não à toa, nos últimos dois anos, diversas casas tradicionais em multimercado investiram em novos times para entrar nesse campo, como é o caso de Ibiúna, Absolute, Occam Brasil e Legacy. Há exemplos até entre as gestoras de ações, como a Drýs Capital, antiga Equitas, que montou no ano passado uma vertical de crédito privado e infraestrutura, em um movimento defendido pela casa como estratégico.

    Para os profissionais do mercado, o processo de consolidação está longe de acabar e deverá alterar o perfil das gestoras. “Há cerca de 1 000 empresas de gestão de recursos registradas na CVM e esse número pode quase dobrar em cinco anos”, afirma João Baptista Peixoto Neto, presidente da Ouro Preto Investimentos. Isso abre espaço para fusões e aquisições não só pela necessidade de cortar custos e de entrar em novos negócios, mas pela vontade de acelerar o crescimento. “Logo teremos várias empresas independentes fazendo a gestão de centenas de bilhões de reais, assim como ocorre nos Estados Unidos”, diz. O mercado de gestão de recursos no Brasil deverá continuar amadurecendo nos próximos anos — e a perenidade dos negócios certamente seguirá sendo testada.

    Publicado em VEJA, setembro de 2024, edição VEJA Negócios nº 6

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