No auge da greve que amotina petroleiros e o agravamento da epidemia de coronavírus, a Petrobras anunciou, nesta quarta-feira, 19, lucro recorde no ano de 2019. De acordo com a empresa, o lucro líquido registrado foi de 40,137 bilhões de reais, um crescimento de 55,7% em relação ao ano anterior. Os resultados foram impulsionados pela alta produtividade do pré-sal e os sucessivos registros de produção recorde atestados no ano passado. A recente alta do dólar também impulsionou as contas, já que a empresa exporta combustível para o exterior. O arrumar da casa e o fim da cultura de se firmar contratos fraudulentos com empreiteiras, como revelou a Lava-Jato, também reavivaram as contas da companhia, assim como a crescente contínua desde que a empresa passou a respeitar a flutuação do preço do barril de petróleo nos moldes internacionais, regra que começou a vigorar no final de 2016. Naquele ano, a companhia registrou perdas de mais de 14 bilhões de reais — cenário que, ano a ano, veio melhorando.
No início do mês, Roberto Castello Branco, presidente da estatal, afirmou que o coronavírus não afetou as exportações da Petrobras. Uma possível greve de caminhoneiros, porém, pode turvar os resultados imediatos para a empresa. Claramente, os impactos da paralisação dos petroleiros não foi contabilizada. A Federação Única dos Petroleiros (FUP) informa que a adesão é de mais de 60% dos funcionários da área operacional da Petrobras, envolvendo 21 mil trabalhadores mobilizados em mais de 120 unidades da estatal, entre plataformas, refinarias e usinas térmicas.
Uma alta no preço dos combustíveis para o consumidor, porém, foi descartada pelo diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Décio Odonne, em entrevista a VEJA. “Se houver impacto na produção de derivados, para compensar, seria possível aumentar a importação. E, se isso ocorrer, não se espera impactos no valores – já que a Petrobras e as demais empresas produtoras ou importadoras praticam preços de paridade internacional”, cravou. “A produção diária e os estoques de combustíveis garantem a oferta ao mercado”, informa a Petrobras, em nota.
Em novembro, na esteira do aumento das tensões crescentes entre Estados Unidos e Irã, VEJA ratificou que o reinado do petróleo ainda está longe do fim. Na ressaca de um leilão frustrado de refinarias na Bacia de Santos, num primeiro momento, o mercado regurgitou mau humor, o dólar subiu repentinamente, e a bolsa caiu. Os ânimos se acalmaram pouco a pouco, à medida que ganhava corpo a percepção de que o resultado frustrante se devia mais ao modelo adotado para a operação do que às perspectivas do setor petroleiro. Feitas as contas e avaliados os danos, constatou-se que o setor seguia firme e forte, e que o otimismo que o cerca estava preservado — o que fortaleceu a Petrobras.
Na ocasião, aproveitando a vantagem que as regras permitiam, a companhia brasileira, em consórcio com duas empresas chinesas, exerceu seu poder de preferência na compra das áreas mais promissoras. Com isso, as outras quatro companhias habilitadas a participar desistiram de fazer lances pelas duas áreas remanescentes.
Ninguém duvida que os automóveis, ônibus e caminhões poluidores estão com os dias contados. Mas, ainda que o número de veículos elétricos aumente drasticamente, a energia que eles consomem terá de ser gerada, em grande parte, por usinas termelétricas abastecidas com derivados do petróleo. Além disso, os países emergentes levarão um tempo bem maior para aderir às novas tecnologias. “É consenso que o processo de transição da matriz energética é um fenômeno global irreversível. O que não se sabe é quanto tempo essa revolução demorará para acontecer”, afirma Carlos Assis, sócio da consultoria Ernst & Young. E a Petrobras aproveita.