A Boeing confirmou oficialmente neste sábado 25 que rescindiu o acordo bilionário para a compra da Embraer. – a informação foi antecipada na sexta-feira 24 por VEJA. O negócio envolvia a criação de uma joint-venture composta pelo negócio de aviação comercial da Embraer e uma segunda para desenvolver novos mercados para a aeronave de transporte aéreo médio e mobilidade C-390 Millenium.
A sexta-feira 24 era data-limite inicial para rescisão, passível de extensão por qualquer uma das partes caso algumas condições fossem cumpridas, de acordo com a Boeing. A companhia americana exerceu seu direito de rescindir após a Embraer não ter atendido, segundo ela, às condições necessárias.
“A Boeing trabalhou diligentemente nos últimos dois anos para concluir a transação com a Embraer. Há vários meses temos mantido negociações produtivas a respeito de condições do contrato que não foram atendidas, mas em última instância, essas negociações não foram bem-sucedidas. O objetivo de todos nós era resolver as pendências até a data de rescisão inicial, o que não aconteceu”, disse Marc Allen, presidente da Boeing para a parceria com a Embraer e operações do grupo. “É uma decepção profunda. Entretanto, chegamos a um ponto em que continuar negociando dentro do escopo do acordo não irá solucionar as questões pendentes”.
A Boeing informou que irá manter com a Embraer o contrato vigente relativo à comercialização e manutenção conjunta da aeronave militar C-390 Millenium assinado em 2012 e ampliado em 2016.
Como VEJA revelou na sexta-feira, a crise causada pelo novo coronavírus (Covid-19) e a dificuldade de operação de voos foram a pá de cal para que a empresa dos Estados Unidos desistisse da negociação de 4,2 bilhões de dólares pela compra da companhia brasileira. A negociação envolvia a fusão entre as duas empresas, que teria 80% da nova companhia comandada pela Boeing e já tinha sido aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o Cade.
Segundo fontes ouvidas pela reportagem, a diretoria da Embraer estava ciente de que a Boeing daria para trás e que o acordo foi por água abaixo. A pressão do presidente americano, Donald Trump, em meio ao auxílio destinado pelo governo dos Estados Unidos para manter a empresa viva com as dificuldades amargadas pelo setor aéreo graças à pandemia inviabilizaram o acordo.
Em entrevista a VEJA, Richard Aboulafia, vice-presidente de análise do Teal Group, consultoria de aviação norte-americana, afirmou que a não consolidação do acordo não causa impactos relevantes à situação da Embraer. “A Embraer era uma fonte importante para os engenheiros para viabilizar a montagem de um novo Boeing de tamanho médio, mas não parece que esse projeto sairá do papel tão cedo. O único problema mais sério para eles é que eles não terão uma aeronave para concorrer com a Airbus, que tem o modelo A220, mas isso não é uma prioridade para a companhia”, afirma ele. Segundo ele, a Boeing terá de pagar entre 75 milhões de dólares e 100 milhões de dólares pela quebra do acordo. As negociações também dependiam do aval da União Europeia já que, em setembro, o bloco anunciou que abriria investigaçãosobre a compra da divisão comercial da Embraer.
Com 25 bilhões de dólares em caixa e um gigantesco passivo para resolver — decorrente da queda de duas aeronaves do novíssimo 737 MAX e do cancelamento de pedidos de centenas de unidades do modelo —, a empresa americana teme não sobreviver até o fim do ano, conforme declaração recente de seu recém-empossado presidente, Dave Calhoun. A Boeing pediu um auxílio de 60 bilhões de dólares ao governo americano para transpassar o duro momento. De acordo com um comunicado emitido nesta semana, a Embraer informa que, caso o acordo não fosse consolidado, não havia garantias de que a data para a consolidação do negócio fosse postergada. Segundo a companhia, as conversas para a prorrogação do prazo com a Boeing estão mantidas.
A operação previa duas transações. Uma delas consiste na aquisição pela Boeing de 80% do capital do negócio de aviação comercial da Embraer, que engloba a produção de aeronaves regionais e comerciais de grande porte, de operação comercial. A segunda tratava-se da criação de uma joint venture entre a Boeing e a Embraer voltada para a produção da aeronave de transporte militar KC-390, com participações de 49% e 51%, respectivamente, para a operação de defesa.
Na ocasião, a Embraer informou que a transação avalia 100% das operações de aeronaves comerciais da empresa em US$ 5,26 bilhões e contempla um valor de US$ 4,2 bilhões pela participação de 80% da Boeing na joint venture. Os negócios de defesa e jatos executivos e as operações de serviços da empresa associados a esses produtos permanecerão como uma empresa independente e de capital aberto. Os investimentos mais pesados da divisão comercial, que tem forte concorrência com a Airbus, ficariam a cargo da Boeing.
Embraer se manifesta – No início da tarde deste sábado 25, a Embraer se manifestou por meio de nota divulgada por sua assessoria de imprensa. Segundo a empresa brasileira, os americanos fabricaram “falsas alegações” como pretexto de tentar evitar seus compromissos de concluir a transação. “A empresa buscará todas as medidas cabíveis contra a Boeing pelos danos sofridos como resultado do cancelamento indevido e da violação” do acordo, disse a Embraer.