Nascida em Angola e filha de portugueses que emigraram para lá, a executiva brasileira Paula Bellizia tem décadas dedicadas ao desenvolvimento de gigantes do mundo da tecnologia. Com passagens marcantes em empresas como Microsoft, Facebook, Apple e Google, ela foi anunciada, em fevereiro, como presidente para a área de serviços de pagamentos globais do Ebanx, unicórnio (startup avaliada em mais de 1 bilhão de dólares) curitibano que tem crescido em velocidade de cruzeiro com a expansão do comércio eletrônico durante a pandemia de Covid-19. Acostumada a ser uma luz de inspiração para outras mulheres que buscam ascender profissionalmente, Paula conta que sua nova missão é transformar o mercado financeiro em dez anos, promovendo diversidade e inclusão financeira no setor, e revela que a empresa “não tem pressa” para chegar à bolsa de valores americana. “O cenário externo é desafiador, mas o nosso negócio permanece bastante sólido e firme para os próximos passos no que diz respeito tanto a novas aquisições como a IPO”, afirma a VEJA.
A senhora é uma executiva com passagem em grandes companhias do mundo da tecnologia, como Microsoft, Google, Apple e o Facebook. Como essas experiências podem ajudar em sua jornada na presidência da área de pagamentos globais do Ebanx? Eu tenho essa perspectiva de ter trabalhado nas maiores empresas de tecnologia do mundo, as empresas mais globais e conhecidas por serem marcas fortes. Tudo o que eu aprendi nessas empresas tem a ver com velocidade, visão global, escala e uma cultura muito forte. E eu trago isso comigo no meu estilo de liderança. Eu tenho essa missão de expansão, de ajudar a construir os próximos dez anos do Ebanx.
Como é o desafio de chegar numa financeira após anos de atuação em gigantes de tecnologia? Eu chego num momento positivo, que marca os dez primeiros anos de trajetória do Ebanx, com uma boa perspectiva para o futuro. Quero ajudar a escrever a nossa história para os próximos 10 anos. Um pouco do meu desafio aqui como presidente de pagamentos globais é olhar para as oportunidades para conectar companhias digitais a mercados do mundo inteiro. A gente fez isso muito bem na América Latina e queremos levar isso para onde quer que os clientes desejem. Uma parte importante do meu desafio para os próximos dez anos é continuar desenhando esse impacto em todo o ecossistema não só de pagamentos mas nos países onde a gente atua. Nós estamos presentes ativamente em 15 mercados na América Latina. Nossas equipes estão presentes em 10 escritórios no mundo, para além da América Latina. Já temos escritórios na China, nos Estados Unidos e, recentemente, anunciamos um escritório no México.
Qual é a perspectiva de expansão global do Ebanx? Temos a perspectiva de continuar crescendo na América Latina, do ponto de vista de empresas e marcas digitais, por volta de 30%. Alguns mercados vão extrapolar esse número. Além do Brasil, o México, o Chile e a Colômbia vão continuar sendo um vetor de crescimento para nós. Em 2021, a gente cresceu em volume de transações algo em torno de 150%. Foram 370 milhões de transações pelo Ebanx. Em valores, a gente está falando de um crescimento de 110%. Então, a gente realmente tem crescido muito e o nosso foco na América Latina vai permanecer. A gente tem uma fortaleza muito grande em e-commerce, mas também temos ambições para outras indústrias.
O cenário de IPOs e fusões e aquisições se tornou um tanto nebuloso com o afloramento da guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Isso atrapalha a expansão e a captação da empresa de alguma forma? Como a senhora analisa esse momento? A gente está vivendo um momento difícil e triste na sequência da pandemia. Estamos observando isso atentamente. O que eu posso dizer é que o Ebanx permanece saudável financeiramente. Fizemos anúncios de investimentos recentemente. O cenário externo é desafiador, mas o nosso negócio permanece bastante sólido e firme para os próximos passos no que diz respeito tanto a novas aquisições como a IPO. Nós tivemos um 2021 cheio de novidades, anunciando as aquisições da Remessa Online e da Juno. Estamos de olho nas oportunidades de expandir o nosso portfólio com empresas que tenham uma perspectiva global, assim como o Ebanx.
O que pode ser aprimorado no cenário de serviços financeiros no Brasil? Eu fiquei bem impressionada na minha chegada, entendendo a nossa plataforma, o nosso modelo de negócio. Hoje, o Ebanx está conectando os nossos clientes a mais de 100 meios de pagamento. Assim como em tecnologia, o mercado de pagamentos vai continuar evoluindo rapidamente. Um dado que eu estudei na minha chegada é que o crescimento do uso de e-wallets, as carteiras digitais, foi em torno de 45% no último ano. Isso indica que os hábitos do consumidor, como ele compra, como ele paga, que tipo de serviço ele vai querer, vai continuar evoluindo de acordo com esses novos meios de pagamentos. Quando eu olho para o mercado de pagamentos, tendo essa vivência no mercado de tecnologia, o que eu posso dizer é que a velocidade das mudanças é enorme e isso traz muitas oportunidades para o setor.
Uma das marcas da sua gestão na Microsoft e no Google foi o envolvimento com projetos de diversidade e inclusão. Pretende levar isso para o Ebanx também? Eu estou muito feliz e inspirada também pelo que o Ebanx tem feito do ponto de vista da diversidade em cargos de liderança. Há pouco mais de um ano o Ebanx declarou compromissos específicos em relação à diversidade. A gente quer representar todas as esferas possíveis na sociedade e temos metas muito especificas para questões de gênero. Ainda há muito a ser feito sobre a presença de mulheres em posições de liderança em indústrias tradicionalmente mais masculinas. Fico feliz de ser uma história. E acho que as mulheres precisam de mais histórias para continuarem se inspirando a crescer e entender que construir uma carreira é possível e que o lugar delas é onde elas quiserem.
Como você avalia o desempenho do Banco Central para promover maior acesso às pessoas e competitividade no mercado financeiro brasileiro? É extremamente positivo. O Pix foi uma forma de pagamento rápida, inclusiva e transformadora para a sociedade brasileira. E volta para a nossa crença de que dar acesso para as pessoas é muito poderoso. Hoje, 50% da população brasileira está usando o Pix. Então, a gente avalia com muito bons olhos. Com o aumento da competitividade, ganha o consumidor. E sempre que o consumidor ganha, todos ganham. Acho que o ecossistema de fintechs no Brasil está escrevendo história e isso tem muito a ver com essa abertura que está acontecendo na atual gestão do Banco Central.