Antagonistas e complementares, Mônica e Cebolinha dispensam apresentações. Já se vão quase seis décadas desde a criação do menino que troca o R pelo L e da garota de dentes proeminentes, dupla que se enfrenta pela posse do coelho de pelúcia Sansão e, consequentemente, pelo título de dono da rua. As aventuras pueris das crianças do Bairro do Limoeiro, desenhadas por Mauricio de Sousa, não só resistiram ao teste do tempo como se alastraram no imaginário de gerações, cravando lugar no terreno da cultura pop nacional — local feito de fãs rendidos à invasão de heróis americanos. Para não serem relegados apenas à memória afetiva, Mônica e sua turma se adaptaram. Ganharam tramas adolescentes, versões em graphic novels e foram animados para a TV e o YouTube (canal com 8,2 bilhões de visualizações). Apostar em uma versão live action parecia o passo óbvio, mas delicado. Foi com precisão cirúrgica que o cineasta Daniel Rezende trouxe a peculiar estética dos gibis para o mundo de carne e osso no filme Turma da Mônica — Laços (Brasil, 2019), em cartaz no país.
O primeiro impasse envolveu encontrar os atores mirins ideais para encarnar os personagens. Uma peneira de 7 500 inscritos e diversos testes chegou a Giulia Benite (Mônica), Kevin Vechiatto (Cebolinha), Laura Rauseo (Magali) e Gabriel Moreira (Cascão). O elenco é adorável, assim como tudo o que o cerca: casas coloridas, quintais à mostra, parques bucólicos e famílias saídas de propagandas de margarina. Ali, não existe o monopólio de celulares e videogames dominando a infância, a vida acontece ao ar livre. A trama de contornos vintage, mas ambientada em um universo atemporal, honra não só os gibis originais como também a HQ de mesmo nome, assinada pelos irmãos Vitor e Lu Cafaggi, em 2013, em que o roteiro se inspirou.
Na história, o quarteto de protagonistas se une para encontrar Floquinho, o cão verde do Cebolinha (colorido digitalmente) que desapareceu. Outros elementos do universo de Mauricio de Sousa permeiam a aventura, desde detalhes do cenário até um alucinado Rodrigo Santoro como Louco e o cemitério assombrado das tramas do Penadinho. Mas são os fantasmas típicos da infância que pautam a jornada, como o medo da perda, a dor do bullying e as paulatinas descoberta e aceitação de si mesmo. Apesar de alguns excessos dramáticos, o filme mantém a essência do humor ingênuo dos quadrinhos. O resultado cumpre a difícil missão de agradar a todos.
Publicado em VEJA de 3 de julho de 2019, edição nº 2641
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