Turistas desbravam o Maciço Virunga, conjunto de montanhas vulcânicas que delimita a tríplice fronteira entre Ruanda, Uganda e República Democrática do Congo, para viver uma experiência única: observar de perto os últimos gorilas-das-montanhas restantes no planeta. O trekking pode durar de duas a oito horas. Por dia, apenas oitenta pessoas são autorizadas pelo governo a fazer as caminhadas, e cada uma paga uma taxa de 1 500 dólares pelo passeio. Os visitantes não precisam levar suas mochilas (carregadores fazem o trabalho) e têm direito a paradas para saborear lanches e sucos. No fim do passeio, embarcam em picapes 4 x 4 com ar condicionado e lá se refrescam com champanhes e vinhos.
Se até pouco tempo atrás os safáris na África exigiam dos viajantes disposição para enfrentar obstáculos como estrutura hoteleira precária, logística ineficiente e mesmo a violência gerada pela instabilidade política da região, agora o cenário é diferente. Em nações como Ruanda, o rústico deu lugar ao luxo — e isso tem sido ótimo para os negócios, que conheceram uma explosão sem precedentes. “Estamos entre os destinos mais desejados e exclusivos do planeta”, diz Belise Kariza, diretora do Conselho de Desenvolvimento de Ruanda, órgão criado pelo governo para a captação de investimentos. Na década de 90, o país foi palco de uma guerra sangrenta entre as etnias hútus e tútsis, que terminaria com o saldo de 1 milhão de mortos e milhares de desaparecidos. O genocídio ganhou as telas de cinema com o premiado Hotel Ruanda, que retrata a história do Hôtel des Mille Collines, onde muitos fugitivos se abrigaram durante os conflitos. Anos depois, o lugar seria reformado para se tornar um dos primeiros hotéis de luxo do país. Hoje em dia, Ruanda conta com resorts e lodges que cobram diárias de até 7 000 dólares. Priorizar o negócio trouxe resultados concretos para a nação. Em pouco tempo, o turismo virou uma das principais fontes de divisas. No ano passado, o setor movimentou 500 milhões de dólares, ou 20% a mais do que em 2017. O objetivo é dobrar o valor até 2024.
Os gorilas não são o único atrativo de Ruanda. A capital, Kigali, se transformou numa cidade pulsante, com clubes noturnos, bons restaurantes e museus que retratam a vida selvagem do continente. Com certa dose de exagero, o país ganhou recentemente o apelido de “Suíça da África”. “Não à toa, Ruanda está entre as nossas tendências de viagem para o ano que vem”, diz Tomas Perez, presidente da Teresa Perez Tours, referência em turismo de luxo no Brasil. Aqui, as agências vendem pacotes semanais para as principais atrações de Ruanda com preços que podem chegar facilmente a 100 000 reais por pessoa.
Outra das nações mais pobres do continente, Zimbábue quer seguir pelo mesmo caminho. Desde a queda do ditador Robert Mugabe, em 2017, após uma dinastia de 37 anos no poder, o país africano estabeleceu como meta tornar-se mais amigável para os negócios. Na década de 90, ele recebia 1,5 milhão de visitantes todos os anos, oferecendo as melhores opções de visualização de animais de grande porte em seu ambiente natural. Com o aumento da caça, da violência e dos escândalos de corrupção, os estrangeiros sumiram. Agora, a ideia é trazê-los de volta. Em 2018, novos empreendimentos de luxo começaram a surgir no país, a maioria deles com diárias a partir de 1 500 dólares. Reformado recentemente, o Bumi Hills Safari tem piscina de borda infinita com vista para o Lago Kariba, onde manadas de elefantes costumam se refrescar. O hotel também possuiu um helicóptero para passeios como o sobrevoo do Parque Nacional de Victoria Falls, com quedas-d’água que têm de 61 a 128 metros de altura — as maiores do mundo. Entre 2018 e 2019, o índice de ocupação dos estabelecimentos turísticos nos arredores do Parque Nacional cresceu 50%, e os quartos com as melhores vistas precisam ser reservados com seis meses de antecedência. Não há nada melhor que ver grandes animais em ação e, ao mesmo tempo, desfrutar uma estada exclusiva, exatamente o que Ruanda e Zimbábue oferecem a viajantes dispostos a pagar caro pela experiência.
Publicado em VEJA de 18 de dezembro de 2019, edição nº 2665