Rooney Mara já havia trabalhado com o diretor australiano Garth Davis (com ela no vídeo acima) em Lion – Uma Jornada para Casa, que concorreu a seis Oscar. E essa foi uma razão fundamental para aceitar fazer o personagem-título de Maria Madalena, filme que propõe um retrato bem diferente da figura bíblica.
No longa, ela não é prostituta, como a definiu o Papa Gregório Magno em uma homilia de 591. Ela é não uma sedutora, mas uma seguidora de Jesus Cristo (Joaquin Phoenix) que deixa a família porque não quer se casar com um marido arrumado pelo pai e pelos irmãos, passa a andar com Jesus e seus discípulos e tem o insight que a permite interpretar a mensagem do messias de maneira diferente dos outros apóstolos. De maneira superior — o filme é feminista de modo que beira o panfletário.
A atriz americana, indicada ao Oscar por suas performances em Millenium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres, de David Fincher, e Carol, de Todd Haynes, foi criada no catolicismo e abandonou a religião. Para se preparar para o papel, ela viajou a Israel com o namorado, Joaquin Phoenix, antes de rodar o longa-metragem na Itália.
Mara conversou com o site de VEJA sobre religião, sua preparação e a transformação de sua visão sobre Jesus Cristo:
Como interpretar uma personagem conhecido sem saber de nada a respeito? Foi um trabalho enorme porque se trata de interpretar alguém que as pessoas acreditam conhecer e que é importante para tantos, mas, por outro lado, foi um pouco libertador pois não a estamos reinventando, e sim contando pela primeira vez sua história da maneira que achamos ser a verdadeira. O retrato que a maior parte das pessoas tem dela não é baseado na realidade. Isso tirou um pouco da pressão.
Quando Jesus diz que o reino de Deus está dentro de cada um e que todo o mundo tem acesso a ele, basta querer, Maria Madalena entende de imediato porque vem de uma posição marginalizada, enquanto os outros discípulos, não. Eles não têm essa experiência
Em que consistiu sua pesquisa? Eu li o Evangelho de Maria Madalena. O Garth Davis mandou pacotes de pesquisa. Mas me pareceu lição de casa. Então foi legal ir a Israel com Joaquin antes da filmagem na Itália para aprender muita coisa em primeira mão em vez de começar a ler. Principalmente os Evangelhos, não queria voltar a eles porque me fazia sentir estar de volta ao catecismo. Mas Joaquin estava lendo os Evangelhos muito intensamente, começamos a conversar e não podia acreditar que tudo aquilo estava na Bíblia. Então, iniciei uma leitura e vi que tem muita coisa bonita lá.
No filme, Maria Madalena percebe os ensinamentos de Jesus Cristo de forma diferente dos outros apóstolos. Isso acontece por ela ser mulher? Interessante. Nunca pensei dessa maneira. Mas acho que ela deve perceber as coisas de maneira diferente por ser mulher, sim. Por isso ela interpreta a mensagem sobre o reino de Deus de modo tão diverso dos outros discípulos. Maria está acostumada a tomar decisão. E, para ter uma relação com Deus, naquele tempo era preciso um rabino ou uma outra espécie de chefe religioso. Quando Jesus diz que o reino de Deus está dentro de cada um e que todo o mundo tem acesso a ele, não é preciso um intermediário nem necessário meditar por cinco anos. Você pode alcançar o reino agora. Ela entende isso de imediato porque vem de uma posição marginalizada, enquanto os outros, não. Eles não têm essa experiência.
Em um dos diálogos, ela diz que os outros discípulos pareciam soldados. Acha que Maria Madalena fala isso por ser mulher? Acho isso bem interessante e quero concordar, mas a verdade é que as mulheres nunca estiveram em posições de poder, então não sabemos. Eu espero, como mulher, que teríamos usado nosso poder de maneira diferente, mas não dá para afirmar.
Sobre os milagres de Jesus: você tenta racionalizar ou acredita? Conversamos muito sobre isso. Garth tentou tornar todos os personagens, inclusive Jesus Cristo, mais humanos do que jamais foram no cinema. Eu sou bem New Age. Gosto de medicina alternativa e outras coisas. Foi isso que me ajudou a ver Jesus de modo diferente pela primeira vez. Se eu estivesse viva naquela época, provavelmente o seguiria. Eu o enxerguei como alguém que cura os outros.
Você foi educada no catolicismo. Foi difícil romper com a religião? Na verdade, não. Minha família respeita muito minhas escolhas, e eu respeito as deles. A religião organizada não é para mim. Sou uma pessoa espiritual, sempre fui e acredito que sempre serei. Mas gosto de algumas partes de outras religiões.