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‘Não me importo que achem que sou gay’, diz Hugh Jackman

Ator, que está no musical 'O Rei do Show', fala de seu amor pelo gênero e do que o faz seguir em frente

Por Mariane Morisawa, de Londres
Atualizado em 23 dez 2017, 08h45 - Publicado em 23 dez 2017, 07h24
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  • Com pontos no rosto depois da retirada de um câncer de pele, Hugh Jackman foi proibido pelo médico de cantar em uma apresentação das músicas de O Rei do Show para executivos do estúdio Fox. A apresentação era parte do esforço para a aprovação do projeto. Durante parte da canção From Now On, ele conseguiu se conter, fazendo apenas expressões faciais. Mas, depois de alguns segundos, não aguentou e soltou a voz.

    O projeto do musical dirigido por Michael Gracey levou sete anos para se concretizar, com composições de Justin Paul e Benj Pasek, a dupla ganhadora do Oscar por La La Land – Cantando Estações e do Tony, o “Oscar do teatro”, por Dear Evan Hansen, sucesso na Broadway – os dois concorrem ao Grammy por ambos. São músicas modernas, que em nada se parecem com as da época em que o longa se passa, o século XIX. O ator australiano faz P.T. Barnum, que foi um dos criadores do showbusiness, investindo em um circo que tinha números com pessoas diferentes, como um anão e uma mulher barbada. No elenco, também estão Michelle Williams, Zac Efron e Zendaya.

    Apaixonado por musicais, que o levaram a produções no palco e ao longa Os Miseráveis, Jackman conta em entrevista a VEJA que sofreu preconceito por isso e que sabe dos comentários que correm sobre sua sexualidade. “Não me importo”, diz o sempre simpático ator.

     

    Você parece ter se divertido com O Rei do Show. Ah, sim. É um papel que não começou comigo, mas que chegou até mim sete anos atrás, por meio de Laurence Mark. Eu amei o personagem, a história, essa ideia do nascimento do show business. Já tinha feito papéis similares no palco, mas nunca tinha tido a chance de fazer no cinema. Era uma oportunidade rara. Foi bastante trabalho, mas me diverti muito.

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    Por que gostou do personagem? O que achei interessante e inspirador em P.T. Barnum é que ele é complexo, imaginativo, que falava frases dignas de estampar adesivos. Mas ele lutava sujo às vezes também. Quando perdia, perdia espetacularmente, quando ganhava, ganhava espetacularmente também. Arriscava-se muito. E via possibilidades no mundo que ninguém mais enxergava. Respeito muito isso. Uma coisa é ter a visão, outra é realizá-la.

    Qual o maior risco que tomou no showbusiness? Acho que foi apresentar o Oscar. Foi assim que pareceu para mim na época. Não sei por quê. Talvez por causa do bilhão de pessoas assistindo pela televisão! Tinha feito coisas no palco, mas não sou Billy Crystal. Não sou comediante. Tinha mais a perder do que ganhar. Mas tive um momento de P.T. Barnum e pensei: “Quando estiver no meu leito de morte, realmente vou me arrepender se não fizer”. Se a gente fizer só o que é seguro… Não sou exatamente como Barnum, mas resolvi arriscar.

    Apesar de a história se passar no século 19, o filme tem elementos bem contemporâneos. Por quê? Barnum fez coisas inovadoras na época, como marketing, shows, circos. Então não parecia adequado fazer um filme de época. Se ele estivesse vivo hoje, não ia querer que as músicas fossem do século 19. Eu posso garantir que minha filha de 11 anos de idade não ia querer ouvir isso, não importa a qualidade. Ele era populista, ia querer músicas que fossem do gosto de todos. Desde o princípio, fomos atrás de artistas de hoje, como Bruno Mars, Pharrell Williams, Macklemore. Nós os abordamos, eles mostraram músicas, nós fizemos testes. Mas gradualmente esses dois jovens compositores da Broadway ganharam força. Tivemos de convencer o estúdio, porque eles tinham apenas 26 anos. Chegamos a dizer que tinham ganhado o Tony, o que não era verdade – mas agora é. No fim, eles produziram as melhores canções. Mas parecia o certo fazer algo moderno, fresco, novo, cool. Porque Barnum não ia gostar de ser peça de museu.

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    Você mencionou sua filha, que consome a era de agora em música. Qual foi a sua era? Para mim, como para a maioria das pessoas, foram meus anos de ensino médio. Então anos 1980. Mas eu sempre digo que tenho o gosto musical de uma adolescente. Amo Wicked, por exemplo. Minha filha ama a música deste filme, eu também. Todo o mundo que ouve gosta.

    Você é fã de musicais, não? Sim! Eu vou muito e adoro. Fui ver Dear Evan Hansen pela segunda vez. Claro que quando um musical é ruim é igual a uma meia fedida de adolescente! Também por isso não são feitos com tanta frequência.

    Seu amor pelos musicais foi problema em algum momento? Sim.

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    Achavam que você era pouco masculino por isso? Não exatamente por causa dos musicais. Quando eu tinha 10 ou 11 anos de idade, um professor me disse que eu era um dançarino talentoso e deveria fazer aulas de dança. Estamos falando da Austrália, no fim dos anos 1970. Achei ótimo e fui falar com meu pai. Meu irmão ouviu a conversa e disse que era coisa de maricas, em palavras mais duras. Eu falei: “O quê? Então não vou fazer”. Ao contrário do Billy Elliott, eu não segui em frente. Sete anos mais tarde, fui ver o musical Rua 42 com o mesmo irmão e meu pai. Tinha me esquecido completamente da história, mas ao final meu irmão veio se desculpar comigo por ter dito aquilo, que eu deveria estar em cima daquele palco. No dia seguinte, me matriculei na escola de dança.

    Algo mais? Sim. Eu interpretei o cantor Peter Allen no palco, um personagem muito espalhafatoso, muito gay. Minha mulher odeia teatro, mas adorava este espetáculo e sempre ia ver. No intervalo, ela ia ao banheiro e ouvia as mulheres falando: “Será que ele é?” ou “Ele é tão convincente!”. E ela gritava de lá de dentro: “Ele não é!” (risos). Então talvez algumas pessoas questionassem. Sei lá. Também não me importo!

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    Acha que ter começado tarde na dança atrapalhou? Com certeza fez diferença! Tanto que não me sinto dançarino, nem me tornei dançarino de verdade. Provavelmente teria dançado mais se tivesse começado mais cedo. Nenhum dançarino de verdade me consideraria um. Eles podem achar que eu até pego a coreografia rápido para alguém que não é dançarino. Então provavelmente. É como um tenista que começou aos 18. São muitos anos de treino perdidos.

    Sonhava ser um grande showman, como P.T. Barnum? Meu pai costumava me levar a shows cristãos – ele era cristão renascido, foi convertido pelo pastor Billy Graham. Eu me lembro quando eu tinha 14, 15 anos, de ir uma vez e ter uma sensação forte de que um dia estaria naquele palco. Sempre fiz teatro. Mas provavelmente queria ser um rockstar.

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    P.T. Barnum faz tudo o que faz para lutar contra a pobreza. O que o move a continuar? (risos) É uma questão para dez anos de terapia e ainda tenho dúvidas de que chegaria a uma conclusão! Para ele, foi esse elemento, sem dúvida. A realidade era muito dura, ele cuidou de dez irmãos. Quando seu pai morreu e ele ficou com todas aquelas crianças, os coletores de débitos levaram tudo, a não ser os sapatos. Ele tinha 15 anos de idade. Mas só isso não explica o fato de ter ido tão longe. Para mim, certamente não era a pobreza, apesar de achar que era mais pobre do que era – meu pai era muito controlado, era contador. Fico feliz, porque não era um homem materialista. Então ele gastava dinheiro em coisas que eu não entendia, por exemplo, educação. Ele pagava qualquer aula que eu quisesse fazer. Mas, se eu quisesse o último modelo de tênis, nem tinha coragem de pedir. Então para mim, simplesmente, honestamente, é um desejo profundo de aceitação. Quanto maior o buraco que você tem, de mais pessoas precisa para preenchê-lo (risos).

    Você leva seus trabalhos para casa? Como ator, não preciso permanecer no personagem, nada disso. Mas tenho ansiedade. Fico preocupado. Outro dia a mulher do Roger Federer me disse que, mesmo depois de uma derrota, ele chega em casa, joga tênis de mesa com os filhos, está pronto para outra. Não estou no nível de Roger Federer.

    Estar à frente de um projeto deve aumentar a ansiedade. Sim, a dedicação é grande. E infelizmente eu gostaria que os elogios me motivassem do que as críticas, mas não é verdade. Quando um diretor vem me elogiar, eu tenho vontade de pedir numa boa para parar. Porque senão a tomada seguinte não vai ser tão boa. Se ele me critica, sei que vou fazer melhor da próxima vez. Gosto de me penalizar. É exaustivo!

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