Aos 6 anos de idade, a atriz búlgara Maria Bakalova começou a cantar e fazer aulas de flauta. O talento musical precoce ainda não era suficiente para a garota, que, segundo ela, se encontrou na arte como uma forma de escapar para outras realidades. Assim, optou pelas artes cênicas e começou a almejar o letreiro de Hollywood no horizonte. “Sonhava em chegar em Los Angeles rolando minha mala por aquelas icônicas ruas cheias de palmeiras, com o famoso letreiro ao fundo”, disse ao Deadline. Na adolescência, porém, a ficha caiu e tão logo percebeu a dificuldade que era encontrar um rostinho da Bulgária nos cinemas americanos.
A chance de ouro veio e a jovem, hoje com 24 anos, a agarrou com unhas e dentes. Em um teste com mais de 600 candidatas, Maria conseguiu o papel de Tutar Sagdiyev, filha adolescente de Sacha Baron Cohen na comédia Borat: Fita de Cinema Seguinte. Sua dedicação lhe abriu as portas de Hollywood, a começar por uma indicação na categoria de melhor atriz cômica no Globo de Ouro, que acontece no domingo, 28.
Na trama, a jovem é uma adolescente de 15 anos do Cazaquistão que o pai despreza por ser mulher. Quando Borat parte rumo aos Estados Unidos para dar um chimpanzé-artista ao ex-vice-presidente Mike Pence, para criar uma ponte até Donald Trump, a garota se esconde na jaula do animal e vai junto. Porém, o devora durante a longa viagem. Resta então, claro, ao satírico Borat dar a própria filha aos republicanos — alfinetando as polêmicas em torno de poderosos afeitos a “novinhas”. Entre inúmeras cenas hilárias, Maria protagoniza a mais polêmica do longa. Ao se bandear para o lado dos republicanos, ela consegue uma entrevista com Rudolph W. Giuliani, advogado pessoal do então presidente Donald Trump. Ela flerta com ele durante a conversa e, depois, Giuliani aparece abrindo a calça em um quarto de hotel na presença da jovem. Mais tarde, o advogado, que não sabia que estava sendo filmado para o “documentário”, afirmou que estaria só tirando o microfone da roupa.
“Coisas como essas não acontecem com pessoas como nós, búlgaros. Na maior parte do tempo, há eventualmente um ou outro pequeno papel extra em um filme para interpretar uma prostituta ou um cara mafioso”, disse Maria sobre a oportunidade. Vencer os estereótipos era uma luta à parte, ladeada com outra tão difícil quanto: a de batalhar contra as próprias inseguranças. Superar os medos de falar em inglês e de deixar transparecer seu sotaque búlgaro – algo que, na época, ela considerava um obstáculo intransponível para uma carreira hollywoodiana – foram seus maiores desafios, a ponto de Maria mudar seu foco para o cinema europeu, onde uma carreira de sucesso parecia mais acessível. Ainda assim, todo ano varava a noite assistindo às cerimônias do Oscar, dizendo a si mesma: “Deus, por que não nasci em um país de língua inglesa para ter a chance de um dia chegar lá?”
Sua sorte começou a mudar quando os diretores Kristina Grozeva e Petar Balchanov, dois dos maiores cineastas búlgaros da última década, ministraram a única disciplina de atuação para cinema na Academia Nacional de Artes Cênicas e Cinematográficas Krastyo Sarafov. Encantada com as aulas, Maria se voluntariou para ajudar com as tarefas ocasionais da dupla para assim comparecer às palestras semanalmente, bem como viajou com eles para um set de filmagem e prestou serviços de assistente pessoal não-remunerados só para “assistir e aprender”.
Eventualmente, foi convidada pelos cineastas para um teste para um pequeno papel no filme O Pai (2019), que levou o prêmio de melhor filme no tradicional festival de Karlovy Vary, na República Tcheca, e conseguiu interpretar uma breve cena de flashback. A participação no longa ajudou a jovem a chegar em Nancy Bishop, diretora de elenco para Borat: Fita de Cinema Seguinte, que, na época, era um projeto ultrassecreto – muito embora a turma de Bakalova na Academia Búlgara estivesse extática com a possibilidade de participar de uma misteriosa comédia americana. Cética, a jovem suspeitava que o projeto encobria coisas nefastas, como sequestro, tráfico de pessoas e venda de órgãos humanos. Mas, “só para não ser a única que não mandou uma fita de audição”, chegou em casa às 5 da manhã e se gravou atuando, para, na manhã seguinte, ser chamada para testes – que, muitas vezes, exigiam dela algumas coisas, digamos assim, incomuns. Eram esquetes de improviso descobrindo todo tipo de amenidades da civilização moderna, por exemplo um ar-condicionado ou uma porta, ou ainda tinha de comer um peixe direto do aquário. Um ano depois do vídeo de audição, o postou no Instagram (sem som) para celebrar o caminho percorrido.
“Eu estava pronta para fazer qualquer coisa, mesmo agora estou pronta para qualquer coisa. Talvez isso venha diretamente da minha vontade de ser atriz. Tinham muitos momentos arriscados durante a produção, mas somos atores e a arte está acima de tudo”, disse ao Deadline. O sangue nos olhos deu resultado. Maria assinou com uma relevante agência de talentos nos Estados Unidos e tem alguns projetos encaminhados para 2021, entre eles uma série de comédia com estrelas hollywoodianas para a Netflix. Hoje, aliás, há até quem diga que a garota está cotada para o Oscar pelo trabalho em Borat. Uma jornada e tanto.