“Ninguém é responsável e diz que cargo ocupa. Ninguém respeita as leis e ninguém assume a culpa”, canta Marcelo Falcão no single Em Busca da Luz, que ele lança nesta sexta-feira, 20, em um clipe em formato 360° para ser visto usando óculos de realidade virtual. Em hiato com o Rappa, Falcão segue em carreira solo sem perder a verve contestadora e crítica que caracteriza as músicas do grupo. Em entrevista a VEJA, Falcão lamentou a maneira como o governo conduziu a crise causada pela pandemia, criticou o retorno das torcidas aos estádios e afirmou não saber quando o Rappa vai voltar a tocar junto. Leia a entrevista a seguir:
Na música, você pede por mais empatia das pessoas durante a pandemia. Esse pedido se estende também aos governantes? A letra é ácida. Venho de uma escola onde vemos a política brasileira como uma corja. Nunca fiz questão de bater palmas para eles. Nosso desabafo sempre foi por meio das nossas letras. Entre e sai político e sempre tem gente traindo a gente, como Judas traiu Jesus. As verdadeiras pessoas de bem estão passando necessidades. Não dá para escolher ídolos na política. Não vamos superar isso tudo com guerra, brigas ou fake news. Como eu canto na música, estamos, mesmo, em busca da luz. O dinheiro que arrecadarmos com as visualizações do clipe serão destinados ao projeto Mães da Favela, iniciativa da Cufa (Central Única das Favelas).
Como avalia a condução do governo durante a pandemia? Meu desabafo real é sobre esse descaso total com a saúde. Os governantes viraram as costas para a população e ficaram vendo o mundo girar. Decisões não foram tomadas e vidas foram perdidas. Antes do Rappa, eu trabalhei com hematologia dentro de UTI. Tenho amigos na área de saúde e acompanhei de perto essa tristeza. Tenho uma ojeriza à política deste país, onde os caras usam esse momento e o poder só para beneficiar-lhes e os deles. E esquecem que existe uma multidão precisando.
O clipe também faz menção ao movimento “Vidas Negras Importam”. Desde o Rappa, você já cantava sobre o preconceito racial. A sociedade não avançou nesse aspecto? Eu sou apenas uma célula dessa banda chamada o Rappa. Individualmente, eu carrego esse gene que faz parte da minha vida. Eu sempre consegui explicar muito bem que estar ligado a qualquer governo, só é bom para quem está no poder e não para o todo. O Rappa nunca foi prioridade no cenário musical brasileiro, mas sempre soubemos nos destacar denunciando esses desmandos. O jeito de ser do Rappa vai existir em mim sempre. Apesar de o mundo estar caindo, sou o cara da motivação. Eu sou um otimista.
O Rappa está em hiato. Há previsões do retorno da banda? O Marcelo Lobato e eu moramos no Rio de Janeiro, mas o Lauro e o Xandão estão morando em Portugal. Combinamos que quando tivermos vontade de voltar, vamos voltar. Por enquanto, eu estou cumprindo meu contrato com a Warner. Quero continuar fazendo música, tenho muita coisa para botar para fora.
A variante Delta preocupa, mas governos estaduais começaram a liberar as aglomerações, inclusive em estádios. Você finalmente vai poder voltar a assistir o Flamengo, seu time do coração, no Maracanã? Não é o momento de aglomerar. Se seguramos até agora, dá para segurar mais um pouquinho. Vai morrer gente se voltar a aglomeração. Estou com muita vontade de ver o futebol do meu time. Mas e se eu for lá no estádio, voltar contaminado e prejudicar a minha família? Não estou fazendo farra. Por mais que eu ame o Flamengo e esteja felizão com o desempenho dele na Libertadores, agora não dá. Deixa todo mundo se vacinar primeiro. Sou sempre pela vida. Futebol não é prioridade, por mais amante que eu seja do futebol, eu sou pela vida.