Há uma certa ironia em visitar uma galeria para apreciar a arte de rua: se o ambiente urbano ao ar livre faz parte de sua composição, e é essencial para a mensagem da obra, a que propósito serviria um grafite dentro de um museu? Para o misterioso artista Banksy, os muros das cidades são as telas de seus desenhos, geralmente atrelados ao histórico político e econômico da região. Mesmo assim, mais de 750.000 pessoas já visitaram a exposição A Arte de Banksy, que chegou a Londres na quinta-feira, 20, e fica em cartaz na cidade até novembro. A exibição não-autorizada tem ingressos que vão de 180 a 400 reais e reúne 110 peças do artista provenientes de coleções particulares – entre elas, rascunhos originais, impressões, fotos e esculturas.
Quem visitar a mostra poderá ver obras autenticadas produzidas entre 1997 e 2008, período em que o artista trouxe ao mundo seus trabalhos mais célebres, como Menina com Balão, leiloada em 2018 por US$ 5 milhões, e Love Is in the Air, arrematada por US$ 12.9 milhões no início de maio. Para essa exibição em específico, nenhuma obra foi retirada das ruas. Mas isso tem acontecido com certa frequência, e desencadeia discussões sobre a legitimidade da ciranda milionária criada em torno de obras que, em tese, foram feitas de maneira gratuita, tendo as ruas como galeria.
Em 2013, o grafite Trabalho Escravo foi retirado de um muro londrino depois de ser vendido pelo equivalente a 5,5 milhões de reais. Um ano depois, uma exposição batizada de Roubando Banks?, em Bristol, reuniu obras do artista vendidas pelos donos dos muros grafitados, e que foram posteriormente leiloadas – a estimativa é de que as peças valessem, à época, de 800.000 a 3 milhões de reais. Mais recentemente, em fevereiro desse ano, um mural de uma garota brincando de bambolê com uma roda de bicicleta, feito na cidade de Nottingham, foi removido depois de ser vendido a uma galeria de arte que desembolsou cifras na casa dos seis dígitos pela obra. A arte está em exibição no Moyse’s Hall Museum, em Suffolk, na Inglaterra. O mesmo comprador já havia adquirido outro Banksy em 2019 – segundo ele, com a intenção de “salvar” os grafites antes que eles fossem danificados pela exposição ao ar livre.
A valorização milionária de Banksy e o mercado de exposições não-autorizadas de suas obras são um fenômeno um tanto contraditório. Não raro, seus desenhos de protestos criticam o capitalismo e alfinetam a desigualdade social – uma mensagem que, ironicamente, rende milhões de dólares. A situação ganha tons ainda mais surreais quando se lembra que Banksy perdeu o direito da obra The Flower Thrower para a empresa Full Collor Black, que lucra estampando o desenho em seus cartões comemorativos à revelia de seu criador. Em diversas ocasiões, o artista declarou que prefere que a obra continue onde foi feita, mas vendas e exibições nunca foram impedidas – ele aceita as intempéries artísticas, sejam elas os efeitos do tempo e de vândalos ou a compra por colecionadores e galerias.
Confira vídeo de divulgação: