O escritor americano Philip Roth morreu cercado de amigos que o amavam, disse o biógrafo Blake Bailey. Sua perda foi lamentada por vários nomes ilustres da literatura mundial, quase sempre com o pesar por ele não ter sido reconhecido pela Academia Sueca de Literatura como merecedor de um Prêmio Nobel.
“Philip Roth morreu esta noite, cercado por amigos de longa data que o amavam muito. Era um homem querido e o nosso maior escritor vivo”, afirmou Bailey.
O escritor português Francisco José Viegas foi um dos que lamentou o fato de autor de “Complexo de Portnoy“, “Pastoral Americana” e “Complô contra a América” não ter recebido essa homenagem em vida. “Devia ter ganho. Mas eu acho que não ganhou, em primeiro lugar, por ser judeu e, em segundo lugar, por ser um homem livre”, disse Viegas à emissora de rádio portuguesa Antena 1. “Isso prejudicou-o numa Academia Nobel que, sem dúvida, não tem hoje em dia qualquer credibilidade.”
Ao jornal francês Le Figaro, o co-fundador da revista literária America, Joe Allen, já fazia a mesma crítica à omissão da Academia Sueca em setembro do ano passado. Em entrevista, Allen confessou não ler mais os autores contemporâneos, salvo o também americano Don DeLilli e Roth. “Ele é um gênio. Deviam ter dado o Nobel de Literatura a ele, em vez daquele saltimbanco, o Bod Dylan, e a esses fanfarrões”, disse, referindo-se ao compositor e cantor, vencedor em 2017.
Em artigo para o Le Monde, o escritor francês Marc Weitzmann, resumiu Roth como uma “identidade em perpétua reinvenção”. Apontou-o como discípulo de Henry James, leitor de Walt Whitman e Allen Ginsberg, amante de Gustave Mahler e fã de Jimi Hendrix e também como “o amante trágico e o demônio dionisíaco, o escritor e um cidadão ordenado, e o anarquista”. “Ele conseguiu coexistir harmoniosamente nessa dualidade em cada um de seus melhores livros, como também na vida, e acredito que foi a base não só de sua escrita, mas (…) alimentou sua liberdade”, escreveu Weitzmann.
O Le Figaro buscou o filósofo francês Alain Finkielkraut, amigo de Roth, para comentar a morte do americano. Finkielkraut lembrou-se de ter conhecido Roth na casa do escritor checo Milan Kundera, no início dos anos 1980, e de tê-lo depois encontrado frequentemente em Londres, Nova York e Connecticut.
“Sua amizade, assim como a de Kundera, foi uma das sortes da minha vida. Portanto, hoje, eu não choro”, disse. “Como escritor, ele não fará falta porque sua obra está aqui, imponente, majestosa, concluída. Mas a pessoa desapareceu para sempre. Essa constatação é banal, o que não impede de ser muito dolorosa para mim. Porque eu tive o privilégio de conhecê-lo. Philip Roth me fará falta. É o que posso dizer agora”, completou Finkielkraut.
Nos Estados Unidos, as repercussões foram mais intensas, dada a presença de Roth na literatura americana do século 20. O jornal americano The New York Times ressalta o fato de Roth, embora desprezado pelo Nobel, ter recebido outros prêmios de primeira linha: dois National Book, dois National Book Critics Circle, três PEN/Faulkner, um Pulitzer e o Man Booker International.
O jornal Sol, de Lisboa, trouxe na sua edição de hoje (23) a repercussão do escritor e jornalista americano Mark Harris, que observou a influência de Roth em várias gerações de escritores, críticos e leitores “Descansa em paz, Philip Roth. Oitenta e cinco anos é uma boa e longa vida, mas ainda me engasguei ao ver a notícia. Um gigante. Eu posso pensar em muitos leitores e escritores que não o amavam, mas nenhum que não pudesse aprender algo lendo-o”, disse.
O biógrafo americano T.S. Stiles ampliou seu lamento, nas redes sociais, para as próprias circunstâncias do país onde o escritor de origem judaica nasceu e morreu. “Philip Roth está morto. E os Estados Unidos têm um presidente eleito sob o slogan ´America First´, que elogiou os nazistas literais depois de eles gritarem ´os judeus não nos substituirão´ e assassinarem uma mulher desarmada que se levantava contra o racismo. Fica pior a cada dia”, registrou.