Quando caiu na estrada com a Renaissance Tour, no ano passado, Beyoncé ouviu um pedido da primogênita, Blue Ivy: aos 11 anos de idade, a garota proclamou que estava pronta para se apresentar com a mãe no palco. Apreensiva, Beyoncé negou o apelo em um primeiro momento, mas acabou vencida pela filha, que surgiu em cena pela primeira vez em Paris, diante de quase 70 000 pessoas. O que seria uma brincadeira pontual virou rotina, e a pequena passou a acompanhar a cantora em diversos shows. Dona de um Grammy que ganhou aos 9 anos pelo clipe de Brown Skin Girl, e agora com uma turnê no currículo, Blue Ivy é a principal expoente de uma nova geração de herdeiros da música que segue os passos dos pais desde muito cedo — e, mais que isso, desponta na indústria sob as asas dos genitores famosos.
Além de primogênita de Beyoncé e da irmã Rumi — creditada na faixa Protector, do Cowboy Carter —, outros pequenos com grandes sobrenomes ganharam espaço recentemente em projetos dos pais: é o caso de North West, de 10 anos, filha de Kanye West e Kim Kardashian, de Adonis, de 6, rebento do rapper Drake, e da prole de Madonna, com destaque para Estere, que, aos 11, roubou a cena ao dançar Vogue na The Celebration Tour — até no Brasil, diante de 1,6 milhão de pessoas em Copacabana. Por aqui, aliás, não é diferente: Marcelo Sangalo, filho de Ivete, toca na banda da mãe desde os 13, como percussionista.
Criados em berço de ouro, muitos desses mini nepo babies (o termo jocoso com que se designam os filhos de famosos nos Estados Unidos) não conhecem a vida sem fama. Para o bem e para o mal: paparazzi e fãs obcecados são parte da rotina dessas crianças que, não raro, estampam tabloides antes de falar. Por isso, subir ao palco ou cantar um verso ouvido por milhares de pessoas ao lado dos tutores não parece colocar medo. Não fosse o mundo inteiro observando, eles seriam como qualquer criança que implora para acompanhar os pais em um dia ordinário de trabalho no escritório, sedentos por fazer parte de tudo.
No caso de North West, as Kardashians têm a vida coberta por reality shows desde antes de seu nascimento, e a garota acumula 19 milhões de seguidores em um perfil com a mãe no TikTok. Acostumada à exposição, North abraçou também a influência do pai: há alguns dias, estrelou ao lado de Kanye (ou Ye) o clipe de Talking, vídeo em que canta, atua e assina direção e roteiro. Ela também alegou estar trabalhando em seu álbum de estreia, mas ainda não há detalhes sobre a produção. Na mesma linha, Adonis, filho de Drake com a francesa Sophie Brussaux, canta e atua no clipe de My Man Freestyle. Primeiro single do menino, a música é uma versão estendida do trecho que ele entoa em Daylight, faixa do pai presente no álbum For All the Dogs.
Rebentos seguindo a trilha de pais famosos estão longe de ser novidade, claro. No Brasil, há o exemplo clássico de Sandy e Junior: filhos do sertanejo Xororó, da dupla com Chitãozinho, os dois começaram na música quando tinham 6 e 5 anos, e foram um fenômeno entre os anos 1990 e início dos 2000. Lá fora, um caso mais recente é o de Miley Cyrus, que atuou pela primeira vez aos 9 anos na série Doc, estrelada pelo pai e astro do country Billy Ray Cyrus. Já na adolescência, Miley estourou em Hannah Montana, também ao lado do pai.
O escrutínio instantâneo possibilitado pelas redes sociais, porém, distingue os nepo babies musicais do passado dos de hoje. Agora, pessoas de todo o mundo têm acesso à “brincadeira” das crianças com um clique, e podem exaltá-las ou derrubá-las na mesma velocidade. Blue Ivy tem a aparência física vistoriada desde que nasceu, e sofreu ataques quando surgiu dançando com Beyoncé nos shows: na internet, a menina foi acusada de ser dura e dançar mal, julgamento que caberia a profissionais, mas não a uma criança se divertindo com a mãe. No filme da turnê, Beyoncé conta que a filha leu os comentários maldosos, mas, em vez de desistir, tomou as críticas como incentivo para evoluir. Já North West vira e mexe é xingada por ser considerada mimada ou malcriada, e é criticada pela relação que nutre com a mãe e o pai, que são separados. A pressão toda poderia — e talvez deveria, em alguns casos — fazer com que os pais proibissem os pequenos de se expor tão cedo, mas muitos permitem a aventura — desde que debaixo de sua asa. Eles são, afinal, herdeiros das dores, mas também dos louros de papai e mamãe.
Publicado em VEJA de 17 de maio de 2024, edição nº 2893