Houve um tempo em que a plateia do cinema só parava de falar para se concentrar na tela quando um leão imponente rugia no meio do arco dourado do logo do Metro-Goldwyn-Mayer, o MGM. Um dos mais antigos e tradicionais estúdios de Hollywood, que revelou de Greta Garbo a Gene Kelly, casa de clássicos como E o Vento Levou… e Cantando na Chuva, hoje, quem diria, aguarda ser adquirido por uma empresa de tecnologia — à frente das negociações, a Amazon deve fechar o negócio essa semana por 9 bilhões de dólares.
Os tempos áureos passaram e a MGM padece em dívidas, sendo controlada por fundos de investimentos desde que declarou falência, em 2010. Estima-se que, dos 9 bilhões de dólares envolvidos na negociação, 2,7 bilhões devem ser destinados para quitar antigos compromissos.
A aquisição será um marco na história de Hollywood. A glamourosa indústria de filmes americana, aos poucos, se vê ser engolida pela incontornável era dos streamings. O eixo mudou, e o reduto cinematográfico não compete mais em pé de igualdade com as gigantes da tecnologia. Se a compra for finalizada, a Amazon terá em mãos um catálogo com mais de 4.000 filmes para engrossar a plataforma Prime Video, entre eles franquias populares, como James Bond e Rocky. O estúdio também é responsável por grandes produções televisivas, como The Handmaid’s Tale, Fargo e Viking.
Em tempos de Netflix, os estúdios e canais de TV começaram a correr atrás do prejuízo, lançando também suas plataformas ou se unindo a outros canais. Nas últimas semanas, a Warner, dona da HBO, e o Discovery anunciaram uma junção que cria uma companhia de 150 bilhões de dólares. A Disney, que já ostenta os estúdios Pixar, Marvel e Lucasfilm — e reúne os conteúdos produzidos por eles na plataforma novata Disney+ — oficializou este ano a compra da Fox e vai lançar no dia 31 de agosto, na América Latina, o Star Plus, outra plataforma de streaming, mas voltada para o público adulto com um catálogo que vai incluir conteúdos esportivos da ESPN e séries do universo FOX, Disney e Hulu. Enquanto isso, empresas de tecnologia continuam a se movimentar: a Apple tem investido bilhões em produções próprias, o YouTube também.
A história do MGM se mistura com a do próprio cinema. O estúdio foi fundado em 1924 pelo magnata Marcus Loew, ainda durante a época do cinema mudo. Até 1954, a empresa dominou o mercado cinematográfico, e chegou a figurar entre os indicados a melhor filme no Oscar todos os anos durante duas décadas. Em 1981, a United Artists, fundada por Charlie Chaplin, Mary Pickford, Douglas Fairbanks e D.W. Griffith, se uniu ao grupo, aumentando ainda mais o império.
Nem todos os filmes clássicos do MGM, porém, estarão disponíveis para a Amazon se a compra for concretizada. Isso porque, em 1985, o empresário Ted Turner adquiriu a companhia e, no ano seguinte, vendeu os direitos de distribuição da empresa junto com a United Artists, mas manteve o controle da biblioteca de filmes anteriores a maio de 1986 — que estão sob domínio da Warner Media desde 1995, quando a empresa de Turner se fundiu ao então Time Warner.
O Amazon Prime tem cerca de 200 milhões de assinantes — número que engloba outros serviços da loja virtual, o que não serve como comparação com as demais plataformas de streaming. A líder Netflix superou este ano a marca de 200 milhões de assinantes. Enquanto o Disney+ chegou rapidamente aos 104 milhões. Essa corrida ainda tem muitos quilômetros a serem percorridos.