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Antonio Fagundes: “O Nobel só escolhe autores que nunca lemos”

O veterano ator e leitor voraz fala a VEJA sobre a literatura na novela 'Bom Sucesso', e se diz "irritado" com as escolhas da Academia Sueca

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 11 out 2019, 11h41 - Publicado em 10 out 2019, 18h05

“Eu tive sorte. Tive uma doença chamada mononucleose, uma anemia profunda, aos 6 anos de idade”, diz Antonio Fagundes em uma declaração difícil de ser associada à palavra “sorte”. O veterano explica: “Fiquei em repouso absoluto e comecei a ler gibis. Aprendi a gostar de ler, procurei histórias mais profundas, e não parei até hoje. Enfim, tive sorte.” Ele conta a história no primeiro episódio do podcast Clube do Livro por Antonio Fagundes, produzido pelo Gshow, da Globo. O programa em áudio serve como conteúdo extra da novela das 7 Bom Sucesso, na qual ele interpreta Alberto, dono da editora Prado Monteiro.

Leitor dedicado, Fagundes devora de dois a três livros por semana. “Sempre que dá, entre uma cena e outra, pego meu livrinho e leio”, diz. À VEJA ele fala sobre o (bom) vício:

 

A paixão pela literatura teve um peso na decisão de aceitar o papel do editor Alberto? Foi, sim, uma das razões pelas quais eu aceitei o papel. Mas eu não sabia que seria algo tão próximo assim dos meus amores. Eu conhecia o trabalho dos autores Paulo Halm e Rosane Svartman (de Totalmente Demais) e tinha interesse em trabalhar com eles.

Sua carreira no teatro tem forte influência da literatura. A literatura criou o gosto pelo teatro – ou o contrário? Eu aprendi a gostar de ler muito cedo. Como também comecei no teatro muito cedo. Então, as coisas caminharam juntas. Uma impulsionou a outra. Quanto mais você tem prazer na leitura, mais você tem prazer em descobrir bons textos. Em quase todas as peças que fiz, eu não conhecia o livro original. Mas, assim que me aprofundava neles, me apaixonava. Uma das peças que fiz no Brasil, aliás, foi Cyrano de Bergerac. Era um texto que eu não conhecia e pelo qual me apaixonei.

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Cyrano de Bergerac é citado na novela por sugestão sua. Por que tanto apreço por este livro em particular? Primeiro, porque é um clássico extraordinário. Segundo, porque é uma história de amor imbatível. Um personagem cheio de humor, ácido, que é um poeta, um espadachim, um escritor. Cyrano é um grande protagonista. Eu o sugeri para os autores, pois vi uma similaridade com o Alberto na novela: assim como o personagem francês, o Alberto abre mão de seu amor para proteger a amada – no caso, a Paloma (Grazi Massafera).

O que tem lido de interessante? É tanta coisa. Da nova geração, gostei muito do livro O Tribunal da Quinta-Feira (Companhia das Letras), do Michel Laub, de Porto Alegre. E acabei de ler Carmen: Uma Biografia (Companhia das Letras), do Ruy Castro, sobre a Carmen Miranda. É extraordinário.

É raro ver uma novela que celebra a literatura como Bom Sucesso. Esse é um caminho para estimular a leitura num país tão carente de educação? A educação vem antes. Primeiro, é preciso rever muitas posturas na área. O número de analfabetos funcionais é grande. Temos muitas pessoas no Brasil que sabem ler, mas não entendem o que leem. O problema começa lá atrás, quando esses indivíduos estão sendo alfabetizados. Uma vez superada a barreira inicial, que é tão grande, a literatura é importante para uma pessoa se reconhecer, formar sua cidadania, entender e respeitar o outro. A literatura ensina a respeitar a diversidade. A se colocar no lugar do outro. Discutir diferenças de forma ponderada e racional. Algo de que precisamos no nosso país.

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O senhor conhecia os bastidores das editoras antes da novela? Fizemos algumas visitas à editora Sextante, no Rio, conhecemos os proprietários, foi bem interessante. Mas eu já tinha, sim, conhecido algumas. Fico sempre muito encantando quando entro em lugares assim. É um universo onde tenho prazer. Tive de me controlar para não levar embora umas trinta caixas de livro. Por isso, nem vou à Bienal. Eu fico muito nervoso, quero comprar tudo.

O Nobel de Literatura foi entregue nesta quinta-feira. Para quem daria a honraria? Fico irritado com o Nobel, pois sempre escolhem uns autores que nunca lemos na vida. Deixam de lado gente importante. Eu queria muito que o romancista americano Philip Roth tivesse sido premiado. Um autor extraordinário. Mas não foi, ele morreu (em 2018) e infelizmente perderam a chance de honrá-lo.

Já pensou em sair da posição de leitor para se tornar um escritor em algum momento? Minha agenda não me permite ter tempo para escrever. Quem sabe se eu parar de atuar. Se alguém me obrigar a parar de atuar, então repenso isso.

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O que espera para seu personagem na novela? É um personagem que já começou a novela com um problema terminal. Começou marcado para morrer. Então, só espero que eles me deem um pouco mais de vida na novela. Meu medo é que queiram matar o personagem antes do fim.

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