Cinema, teatro, séries no streaming, festivais de música, feiras folclóricas, visitas a bibliotecas… Como o brasileiro consome cultura? A quarta edição da pesquisa Hábitos Culturais dos Brasileiros, realizada pela Fundação Itaú em parceria com o instituto Datafolha, tenta responder a essa pergunta mapeando as atividades culturais mais frequentes, o valor gasto com atividades presenciais e motivos que fazem com que as pessoas saiam de casa para consumir cultura – e as principais barreiras existentes. Alguns resultados são surpreendentes.
As atividades mais comuns, para a maioria dos entrevistados, em ordem de preferência, foram ouvir música online (82% realizaram essa atividade em 2023), assistir a filmes (70%) e séries (62%) em plataformas de streaming, participar de eventos ao ar livre (60%) e ouvir podcasts (48%). São hábitos acelerados pela pandemia que vieram para ficar. “Os hábitos digitais foram intensificados. O consumo de filmes, séries, música e podcasts no online está bem estabelecido”, afirma Jader Rosa, superintendente do Itaú Cultural.
Atividades culturais como espetáculos de teatro e museus são restritas a poucos
Outros modelos tidos como tradicionais de manifestação cultural, como espetáculos de teatro e de dança, visitas a museus e exposições de arte e saraus literários e de poesia tiveram aumento em relação às pesquisas anteriores, mas continuam restritos a uma pequena parcela da população. Para ter ideia, 58% dos entrevistados nunca foram a um espetáculo teatral e 53% nunca visitaram um museu.
Fora dos centros urbanos, há um interesse bastante expressivo por festas folclóricas, populares e típicas, principalmente nas regiões Norte e Nordeste. As visitas a bibliotecas também são importantes em cidades menores. “Em alguns casos, a biblioteca é o único aparelho cultural de uma região, e muitas das atividades se concentram ali”, afirma Jader Rosa.
Medo da violência impede o acesso a atividades culturais para 20% dos brasileiros
A pesquisa também aponta que o gasto médio com atividades de cultura presenciais é de R3 por mês. No online, o valor cai para R$ 108 mensais. Há uma clara preferência por atividades gratuitas – 20% dos entrevistados só participa de eventos sem custo, e o índice sobe para 36% no recorte das classes D e E. O custo é um fator impeditivo para 12% dos participantes da pesquisa. A insegurança e o medo da violência mantém 20% das pessoas longe dessas atividades, e a distância dos equipamentos culturais, a maior parte deles localizada nos centros, impede que 15% dos entrevistados tenham acesso a espetáculos e outras manifestações.
Pesquisa oferece caminho para políticas públicas como foco em cultura
Analisados de forma ampla, esses dados ajudam a formar um retrato do consumo cultural dos brasileiros. E, a partir deles, é possível elaborar estratégias. “A descentralização dos eventos é um necessidade importante. É preciso que as atividades aconteçam na periferia e dialoguem com aquele espaço, e não fiquem restritas aos centros”, afirma Rosa. Há também a necessidade de repensar modelos de fome nto e patrocínio que levem em conta esses múltiplos territórios, bem como a remuneração de artistas e profissionais além da necessidade de arrecadação com bilheterias.
Grandes eventos, como feiras e festivais, podem ser estendidos, para receber mais visitantes. E pode-se pensar em atividades mais pontuais, focadas em recortes específicos. A Bienal do Livro, por exemplo, é um evento muito amplo. Já a Flup, a Festa Literária das Periferias, é mais focada e dialoga diretamente com a temática de quem vive na região, atraindo um público próprio.
Outro fator importante é o envelhecimento da população. “Dados demográficos mostram que a população entre 45 a 55 tem menor participação cultural, e é preciso olhar para esse público”, diz Rosa. “É uma parcela da população economicamente ativa que poderia ser mobilizada”. O mesmo vale para outras parcelas. Estudantes do Ensino Médio, por exemplo, frequentam muitas atividades. Mas é preciso estimular a participação dos alunos do Ensino Fundamental. E mobilizar também aqueles que estão no Ensino Superior.
É uma tarefa complexa e que envolve o poder público, as instituições culturais e a iniciativa privada. Mas as informações coletadas ajudam a nortear o processo.