Para Marilyn Monroe, eles eram “os melhores amigos das mulheres”, além daquela gotinha de Chanel Nº5. No vozeirão da cantora galesa Shirley Bassey, na trilha sonora de um clássico do 007 com Sean Connery, de 1971, são “eternos”. Os diamantes, as pedras preciosas mais populares do mundo, encantam pela raridade e por suas qualidades: a dureza, o brilho e o cintilar que os tornam insuperáveis quando lapidados. Há, agora, um forte desafiante a fazer frente às míticas e caras gemas naturais: a versão de laboratório.
Trata-se de reproduzir artificialmente uma linda equação da natureza, promovida ao longo de bilhões de anos por meio do depósito de magma sob a crosta terrestre, a profundidades de até 120 quilômetros. Entre pipetas e buretas, em salas assépticas, o grafite de carbono é submetido às mesmas condições das rochas naturais. E, mágica: de uma perspectiva química, são praticamente idênticos, ainda que feitos com a ajuda de equipamentos especializados, e, a olho nu, será muito difícil identificar as diferenças (veja no quadro).
A peça de brilho intenso produzida em laboratório remonta aos anos 1950. Nos primórdios, as pedras resultantes eram imperfeitas e utilizadas principalmente para finalidades industriais, como corte de pedras, mineração e ferramentas odontológicas. A tecnologia avançou, é natural, os custos da produção diminuíram e a qualidade das gemas melhorou, criando o cenário perfeito para o atual uso na indústria joalheira.
Há, por óbvio, uma pergunta que não quer calar: qual é a diferença do preço final entre o original e a cópia? Algo em torno de 70%, mas nada de sair pulando de alegria. Basta saber que, no mercado internacional, os diamantes naturais sem cor e translúcidos valem ouro. O diamante Cullinan, por exemplo, com 3 160 quilates, extraído em 1905 na África do Sul, tem valor estimado, embora inalcançável, de 2 bilhões de dólares. No mundo das coisas reais, uma peça de 1 quilate pode custar de 2 300 a 14 500 dólares.
Paga-se, portanto, menos por um produto de qualidade próxima, possibilidade que despertou o interesse dos consumidores. “Com os diamantes criados em laboratório é possível ter uma joia que você nunca poderia ter antes, com a mesma beleza e durabilidade das feitas com pedras naturais”, diz Daniel Berringer, gemólogo do Instituto Brasileiro de Gemas e Metais Preciosos. “Se juntarmos os diamantes com outras pedras criadas em laboratório, como safiras e rubis, é possível ter uma peça que até a rainha da Inglaterra pagaria parcelado”, brinca.
Os diamantes sintetizados já abocanham 6% das vendas, procurados sobretudo por jovens adultos, em consonância com as novas exigências de um mundo sustentável. “Em breve, será tão estranho usar diamantes minerais quanto se tornou usar pele de animais”, arrisca Luiz Antônio Barboza, gemólogo do Instituto Gemológico do Brasil. É possível. “A grande maioria dos nossos clientes tem entre 28 e 45 anos”, diz Julia Blini, cofundadora da Gaem, primeira joalheria brasileira a trabalhar unicamente com diamantes de laboratório. “Já tivemos casais que nos buscaram para fazer anéis de noivado, por exemplo, porque queriam ter certeza de que aquele diamante não tinha impactos humanos ou ambientais”, diz a coproprietária Luna Nigro. A Gaem utiliza essas pedras preciosas combinando-as com ouro 18 quilates reciclado e rastreado.
Atenta ao crescimento, a dinamarquesa Pandora, gigante do mercado joalheiro mundial, também aderiu ao movimento com pompa e circunstância. “Os jovens querem marcas comprometidas, não compram greenwashing”, diz Martin Pereyra Rozas, vice-presidente da empresa. A marca lançou em março uma coleção feita exclusivamente com diamantes cultivados e anunciou trabalhar apenas com metais reciclados em toda sua linha de produção. Para o executivo Rozas, a linha de diamantes recriados tem o bom efeito colateral de fazer da pedra preciosa um item razoavelmente acessível e competitivo. “Queremos substituir a ideia de diamante apenas no dedo anelar para diamantes em todos os dedos”, diz, referindo-se ao hábito de se usarem diamantes apenas em anéis de noivado. Vale então, com o apoio da ciência a mimetizar o que brotou depois do Big Bang, lembrar da canção entoada por Shirley Bassey, com melodia e letra de John Barry: “Diamantes nunca mentem para mim, pois quando o amor acabar eles continuarão brilhando”. Que assim seja, mesmo sinteticamente.
Publicado em VEJA de 12 de abril de 2024, edição nº 2888