Jair Bolsonaro (PL) começou 2022 desprezando o elevado número de vítimas de Covid no país, que já ultrapassava 620 mil, ao chamar de “insignificante” o registro de óbitos de crianças. E terminou o mesmo ano, o último de seu governo, dizendo que a derrota nas urnas “dói na alma”. A coluna fez uma retrospectiva do final de mandato do já quase ex-presidente.
Janeiro – Com dois anos da pandemia no país, com o exorbitante número de 622.801 vítimas fatais, declarou que o número de mortes de crianças é “insignificante”.
Fevereiro – “Somos solidários à Rússia”, afirmou o presidente em vídeo gravado já no Kremlin, sem medir a impropriedade de manifestar solidariedade aos russos naquele momento, o início da invasão à Ucrânia. “Há muito a colaborar em várias áreas”, disse ele em visita a Moscou, ao se reunir com o presidente Putin.
Março – Contrariando, mais uma vez, as orientações da OMS para manutenção dos cuidados de combate à Covid-10, afirmou que o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, anunciaria o fim da pandemia no mês seguinte: “Devemos, se Deus quiser, a partir do início do mês que vem, com a decisão do ministro da Saúde colocar um fim na pandemia, via portaria, nós voltarmos à normalidade no Brasil. Não se justifica mais todos esses cuidados no tocante ao vírus, praticamente acabou”. O fim da pandemia, claro, não veio.
Abril – Ao comentar a autorização da compra de próteses penianas para o Exército, assim defendeu: “Foram duas (próteses) compradas e depois abriu-se a licitação para mais 30, mas não compraram. Foi colocada uma margem a mais dessas duas”.
Maio – Em sua ânsia por causar distúrbios, disse que poderia descumprir decisão final do STF sobre o Marco Temporal para terras indígenas: “Não é ameaça, é uma realidade. Só nos restam duas alternativas: pegar a chave da Presidência, me dirigir ao presidente do Supremo e falar: ‘administra o Brasil’. Ou, a outra alternativa: não vou cumprir”.
Junho – Bolsonaro estava na Cúpula das Américas, nos Estados Unidos, quando foi a um culto evangélico dizer que “respirar” não é essencial: “Defendemos a família, a propriedade privada, a liberdade do armamento. Somos pessoas normais. Podemos até viver sem oxigênio, mas jamais sem liberdade”.
Julho – Incomodado com o apoio de Anitta à campanha de Lula, atacou a cantora em suas entrevistas: “Eu vi a Anitta cobrando do Lula: ‘Eu te dando o maior apoio, libera a maconha aí, Lula’. É o limite dela, né? Mandei para o Paulo Guedes: ‘Paulo Guedes, cuidado, você vai perder o emprego de ministro da Economia’”.
Agosto – Antes do debate na Band, Bolsonaro chegou aos estúdios dizendo que não apertaria a mão do adversário. “Fico do lado do Lula, não tem problema não. (Mas) Eu não vou apertar a mão de ladrão”.
Setembro – Em discurso na ONU, ignorou os dados técnicos que reforçam o aumento do desmatamento na Amazônia em seu governo: “Dois terços de todo o território brasileiro permanecem com vegetação nativa, que se encontra exatamente como estava quando o Brasil foi descoberto, em 1500”.
Nas festividades pelos 200 anos da independência do Brasil, gritou várias vezes ser “imbroxável”. Mais um lamentável registro que fica para a história.
Outubro – Semanas antes da eleição, contou em gravação que “pintou um clima” com meninas venezuelanas: “Eu estava em Brasília, na comunidade de São Sebastião, se não me engano, de moto. (…) Parei a moto numa esquina, tirei o capacete e olhei umas menininhas, três ou quatro, bonitas. De 14, 15 anos. Arrumadinhas, num sábado, numa comunidade. Vi que eram meio parecidas. Pintou um clima, voltei. ‘Posso entrar na tua casa?’ Entrei”.
No mesmo mês, os debates televisivos reuniram várias frases marcantes em sua luta pela reeleição. Em um deles, vociferou: “O seu Paulo Freire não deu certo”.
Novembro – Com a derrota nas urnas, seu silêncio poupou os brasileiros de se ocuparem com as verborragias colecionadas em quase quatro anos de governo. No discurso para reconhecer a vitória do oponente, preferiu um autoelogio. “A direita surgiu de verdade em nosso país. Nossa robusta representação no Congresso mostra a força dos nossos valores: Deus, pátria, família e liberdade”.
Dezembro – Quebrando o silêncio que se impôs desde a derrota nas urnas, disse a apoiadores qual o sentimento o acompanhava até aquele momento, às vésperas de deixar o cargo. “Estou há praticamente 40 dias calado. Dói. Dói na alma”. Saiu do país em silêncio, dois dias antes do fim de seu governo.