Na busca por um diálogo mais forte com as redes sociais, a televisão aberta tem adotado a tática de se aproximar dos influenciadores digitais – e seus milhões de seguidores. No SBT, por exemplo, Virginia Fonseca ganhou até um programa de auditório em horário nobre. Já na TV Globo, o clima segue tenso quando o assunto permeia as rodinhas de conversa entre os atores mais experientes. A maioria não suporta a possibilidade de ter que dividir os holofotes com os nada experientes tiktokers e youtubers que, veja só, passaram a ser escalados com maior frequência. Rafa Kalimann, por exemplo, está no ar em Família é Tudo. Uma das pioneiras a atravessar a fronteira das telas, Kéfera Buchmann fez Espelho da Vida, em 2018. A mais conhecida foi Jade Picon, que protagonizou Travessia, em 2023. Em contrapartida, Natallia Rodrigues foi uma das primeiras atrizes a vir a público, em 2017, já diante desse novo cenário, para fazer um desabafo sobre uma proposta de trabalho perdida porque não aceitou “comprar seguidores” no Instagram. A coluna GENTE procurou artistas consagrados para opinarem sobre esta tendência de mercado que valoriza o número de seguidores. Em unanimidade, eles reagem contra esta “invasão”.
Drica Moraes: “Tem atores maravilhosos que não são conhecidos pelo grande público, porque não tem muitos seguidores. Isso não pode ser um termômetro para convidar ou não um ator, os atores às vezes ficam enclausurados, fechados, durante uma vida inteira”.
Dira Paes: “Eu acho que são valores que não se equalizam. Eu acho que nunca a quantidade de seguidores vai definir a personalidade e o talento de ninguém. Nesse sentido, eu acho que a Alice está certa e nós estamos vivendo um momento que as coisas que confundem, mas um verdadeiro talento nunca se escondem e eu acho que na verdade vai mais da consciência da pessoa de saber o que que elas querem valorizar um no outro, o ser ou o ter”.
Edson Celulari: “Só vale para quem acredita nisso, tenho exemplos de grandes atores que estão sendo super procurados que não tem nem Instagram, Wagner Moura é um exemplo disso. Então isso vale ou não vale? Eu acho que não, sinceramente”.
Denise Fraga: “É uma coisa louca que o número de seguidores determine se você vai ser contratado ou não. Como se contratasse junto com aquela pessoa todo um rastro que ela carrega de audiência. Isso é uma cilada. Você tem, por exemplo, o influenciador, e quer que ele faça um trabalho de ator que muitas vezes não é capaz de fazer. É uma equação que nosso ofício determina uma habilidade que a gente estuda”.
Adriana Esteves: “Isso pode muito estar acontecendo na nova geração, a gente tem que conviver com isso, porque é um mundo novo o das redes sociais, mas não consigo entender que um ator com talento, vocação, aptidão ao ofício, tenha que ser seguido por milhões de pessoas, não é comparativo”.
Ailton Graça: “Existem caminhos, mas o caminho primordial, independentemente do que a pessoa está fazendo, é ter envolvimento com a arte e entender o ofício. O ofício não é ter likes, mas disputar pensamentos sociais e coletivos. Se a pessoa, mesmo como influencer, atinge esse ponto dentro da arte, ok. É preciso mais desse movimento, um mergulho na arte para entender o ofício, porque muita gente vai se tornar atriz e ator, mas pouquíssimas vão poder ser chamadas de artistas”.
Júlio Andrade: “Existe um movimento dentro do nosso cinema pautado nessa coisa de fora, dos seguidores, muito atual, mas acho que não vai se segurar, não vai se sustentar, porque o cinema se faz com amor, dedicação. Cinema e ator é coisa séria. Então, uma hora ou outra essa coisa vai cair por terra, é só um momento que vai embora”.
Maeve Jinkings: “Não é que eu ache que um influencer não seja capaz de fazer um trabalho sensível, mas se banalizou essa escolha recentemente, a ponto de muitos executivos basearem a escolha de um elenco em número de seguidores. Isso é uma cilada, uma bobagem. O que atinge o coração do espectador são as histórias. Eu como atriz trago humanidade para um personagem, estou trazendo a humanidade que existe em você. Se consigo te comover é porque, de alguma maneira, faço você se identificar em algum lugar da tua existência. E é um trabalho técnico e sensível que leva anos para se aprimorar. Repito, acho que muita gente é capaz de se desenvolver e fazer isso, mas não dá para reduzir isso a número de seguidores ou a uma influência”.
Irene Ravache: “Eles são bons naquilo que fazem, mas são departamentos completamente diferentes. Você não pode confundir pessoas desinibidas com pessoas que têm talento como ator ou atriz. Não estou dizendo que um é melhor do que o outro. São diferentes. As pessoas que hoje ocupam cargos de direção talvez sejam mal informadas a respeito do que se trata. ‘Tem um monte de seguidores, então vamos botar para fazer tal papel’. É de uma leviandade isso. Com a própria pessoa, com os atores e com o público. O que torna ainda mais lamentável quando você vê que um ator bom não teve um papel porque, no lugar dele, entrou uma ‘celebridade’. Mas celebridade para quem?”.
Armando Babaioff: “Quem está sempre fazendo as coisas, correndo atrás da apresentação, levantando cenário e carregando as coisas somos nós. Para, nessa hora, nessa altura do campeonato, estar substituindo uma renca de gente talentosa para colocar uma pessoa que é conhecida na internet?”.
Cláudia Abreu: “Sempre vão precisar de bons atores. Isso vai acontecer naturalmente. O grande problema é que o critério seja só o número de seguidores, porque isso não qualifica ninguém”.
Alice Wegmann: “Somos uma geração que tem que se formar em medicina e instagram. em psicologia e instagram. em atuação e instagram. Fiz 4 anos de teatro e tenho 17 de profissão, já aprendi sobre Shakespeare mas nunca me ensinaram a ser uma ‘it girl’. Amo moda. E amo influenciar a lerem mais livros, verem mais peças, ouvirem mais músicas. (…) Uma marca recentemente me procurou porque disse que ‘meu feed era bonito’, mas sequer sabia o que uma atriz representa para o seu país. Carreira se constrói a longo prazo, bons atores são aqueles que permanecem”.