Há vários modos de contar a história do governo Jair Bolsonaro. Uma delas é sobre as tentativa do presidente e de sua família se livrarem do fantasma do ex-assessor Fabrício Queiroz. Desde dezembro de 2018, quando foram divulgados os primeiros dados sobre a participação do assessor do hoje senador Flávio Bolsonaro em um esquema de corrupção na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, parte considerável dos atos do governo JB estão relacionados com a tentativa de tapar buracos do caso Queiroz.
Para impedir o avanço das investigações sobre Queiroz e seus depósitos nas contas do filho mais velho, Flávio, e da primeira-dama, Michelle, o presidente já trocou os chefes do Coaf, da Receita Federal e da Polícia Federal – os três órgãos federais de controle de lavagem de dinheiro.
Foi também para proteger a si mesmo e à sua família que Bolsonaro indicou Augusto Aras para a Procuradoria Geral da República, de longe o maior acerto no cargo. A demissão de Sergio Moro do Ministério da Justiça e o rompimento com o lavajatismo só ocorreu porque as investigações da Polícia Federal sobre os negócios de Queiroz não foram suspensas como queria o presidente. Ao ser demitido, Moro afirmou que o presidente tinha interesse nos inquéritos envolvendo os filhos que correm na Justiça do Rio e no Supremo Tribunal Federal.
Todas as vezes que os jornalistas perguntaram ao capitão sobre o caso foram ofendidos ou assediados. No domingo, 23, um repórter do jornal O Globo pediu explicações sobre os depósitos na conta de Michelle. A resposta de Bolsonaro foi “a vontade é encher tua boca de porrada”.
Queiroz foi assessor de Bolsonaro e de Flávio por quase trinta anos. Ele está detido em prisão domiciliar, junto com a mulher, Márcia Aguiar, acusado de liderar um esquema de corrupção batizado de “rachadinha”, onde parte dos salários dos servidores do gabinete de Flavio era devolvido e depois repassado para a família Bolsonaro. De acordo com as investigações, entre 2007 e 2018, o ex-policial recebeu em salários totais R$ 1,6 milhão, mas também outros R milhões em 483 depósitos dos demais servidores do gabinete de Flávio Bolsonaro e R$ 900 mil depositados em dinheiro em espécie sem identificação. No total, a conta de pessoa física do ex-policial recebeu no período 6,2 milhões. Queiroz disse que recebia o dinheiro por compra e venda de carros usados.
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Clique e AssineAlém do pagamento de contas regulares, como mensalidades escolares, Queiroz depositou cerca de R$ 400 mil na conta de Flávio Bolsonaro. Na conta da primeira-dama Michelle Queiroz e sua mulher depositaram R$ 89 mil. Queiroz foi preso em julho quando estava na casa do advogado particular do presidente, Frederico Wassef. Até agora, não há nenhuma explicação da família Bolsonaro para os depósitos.
No caso de Flávio, a defesa tenta anular as apurações alegando que, como senador, ele só pode ser investigado pela Procuradoria Geral da República, em Brasília. Os procuradores do Rio alegam, no entanto, que à época dos crimes Flavio era deputado estadual e, portanto, as denúncias são legais.
O caso de Michelle é mais delicado. Ela não tem cargo público, nem foro privilegiado. Por isso, além das ofensas aos jornalistas, o presidente Bolsonaro pressiona o procurador geral Augusto Aras e mudar a direção do Ministério Público do Rio, em uma clara tentativa de brecar as investigações. As atitudes do presidente até aqui mostram que ele não pretende parar. Nem responder por que Queiroz depositou R$ 89 mil na conta da primeira-dama.