O ano de 2020 estava prestes a terminar quando o presidente Jair Bolsonaro nos respondeu a grande dúvida nacional: por que Fabrício Queiroz depositou R$ 89 mil na conta da primeira-dama, Michelle Bolsonaro? Michelle, garantiu o presidente, é inocente. Quem precisa ser investigado é o próprio presidente.
De acordo com as investigações do Ministério Público, Queiroz e o filho número 01, o senador Flavio Bolsonaro, lideram um esquema de corrupção por mais de dez anos na Assembleia Legislativa do Rio. Eles contratavam servidores fantasmas e retomavam para si parte dos salários pagos com o seu, o meu, o nosso dinheiro. Em entrevista nesta terça-feira ao apresentador José Luiz Datena, da Band, Bolsonaro confirmou que era seu o dinheiro das contas de Michelle.
Disse o presidente:
“O Queiroz pagava conta minha também. Ele era de confiança. Está com esse processo agora. Desde que estourou o processo eu não tenho conversado com ele. Agora, ele está sendo injustiçado também, por quê?”, afirmou Bolsonaro.
“Vamos apurar? Vamos. Mas cada um com a sua devida estatura. E não massacrar o tempo todo como massacram a minha esposa, como eu falei desde o começo, que aquele cheque do Queiroz, ao longo de dez anos, foram para mim. Não foram para ela. Divide aí, Datena, R$ 89 mil por dez anos. Dá em torno de R$ 750 por mês. Isso é propina? Pelo amor de Deus.”
O presidente distorce os fatos. Queiroz e sua mulher, Márcia, depositaram 27 cheques na conta de Michelle de 2011 a 2016, totalizando R$ 89 mil. Ou seja, seis anos. Entre janeiro e junho de 2011, Márcia depositou cinco cheques de R$ 3.000 e um de R$ 2.000. Até abril de 2013, Queiroz repassou outros R$ 36 mil, em 12 cheques de R$ 3.000. Até dezembro de 2016, Queiroz depositou mais R$ 36 mil em nove cheques de R$ 4.000. Nenhuma dessas operações foi declarada à Receita Federal. O Ministério Público suspeita que o dinheiro depositado para Michelle faça parte do mesma esquema de desvio de dinheiro público montado por Queiroz e Flávio.
Bolsonaro tomou para si a responsabilidade sobre o dinheiro na conta de Michelle para manobrar o rumo do inquérito contra o filho. Como presidente, ele não pode ser investigado por qualquer crime não relacionado ao seu mandato, o que significa que se os promotores acreditarem nele, o caso ficará adormecido até que saia do Planalto. Michelle, por sua vez, é uma cidadã comum. Até agora, as suas contas não foram devassadas pelos promotores. Tudo o que se descobriu até agora é o que saiu do cruzamento das contas do casal Queiroz.
Na semana passada, a revista Época informou que a defesa de Flavio Bolsonaro está tendo a assessoria do Gabinete de Segurança Institucional e da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) para tentar anular todo processo. Em um dos documentos, a Abin deixou claro o objetivo: “Defender FB no caso Alerj demonstrando a nulidade processual resultante de acessos imotivados aos dados fiscais de FB”. FB é Flávio Bolsonaro, e Alerj, Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
O uso da máquina pública a favor da família presidente é inédito até mesmo para um país de ética tão flexível quanto o Brasil. O acionamento do GSI foi confirmado pela defesa do próprio senador, que afirmou se tratar de “suspeitas de irregularidades das informações” nos relatórios do Coaf, órgão que investiga transações financeiras irregulares. A GSI e a reconheceu que se reuniu com Flavio e os advogados, mas negou que tenha ajudado no processo. Acredite se quiser.