Irmã de Vitor Belfort, ex-lutador de MMA e bicampeão de UFC, Priscila Belfort desapareceu em plena luz do dia em janeiro de 2004. Há mais de vinte anos, seus pais, Jovita e José Marcos, buscam uma resposta para o sumiço da jovem, que tinha 29 anos à época. Em entrevista a VEJA, os dois falam da série documental de quatro capítulos Volta, Priscila, recém-lançada no Disney+, que dá detalhes sobre o caso e serve como um apelo para que alguém se pronuncie sobre Priscila.
Confira a entrevista:
Por que decidiu transformar a história sobre o sumiço de Priscila em uma série documental?
Jovita: As pesquisadoras Bruna (Rodrigues) e Fernanda (Camargo) me procuraram porque elas tinham muita vontade de contar essa história. Na época em que a Priscila desapareceu, elas eram adolescentes e aquele caso ficou na mente delas. Ficamos conversando, aí namoramos e casamos com a ideia. Então, ficamos dois anos levantando toda a vida da Priscila e da nossa família, porque eu tinha três objetivos: um era realmente reabrir o caso. Porque, como se passaram vinte anos, o crime já prescreveu, então acho que agora está na hora de, quem sabe, descobrir o que aconteceu. Porque uma pessoa sabe. Ela pode ter essa vontade de denunciar o que aconteceu. Então, já conseguimos reabrir o caso, e agora o objetivo maior é que essa pessoa misteriosa realmente apareça, anonimamente, como ela quiser.
E os outros objetivos?
Jovita: O segundo objetivo era que meus netos, Davi, Vitória e Kiara (filhos de Vitor Belfort com Joana Prado), conhecessem a Priscila. Não só eles, claro. Porque nenhum repórter que escreveu que ela era viciada na época do desaparecimento me procurou, nem a ninguém da família, para saber quem era a Priscila, que era um doce de menina. Até hoje, amigas dela guardam cartas dela, de quando ela estava em um intercâmbio. Quis mostrar a amizade da Priscila e do Vitor também. E meu terceiro objetivo era mostrar para todos que existem duas vítimas no caso de desaparecimento: o desaparecido e a família. O Vitor fala que perdeu metade da mãe dele, metade do pai, e metade dele também foi embora. Por sorte ele tinha a Joana. Não só a família Belfort, é a família da Maria, da Silvia, que sofrem também. O desaparecimento é uma morte diária. É muito importante que as pessoas agora vejam esse documentário do Disney+. Precisamos do apoio da sociedade.
Como manter a esperança depois de vinte anos sem ter uma resposta? De onde vem essa força?
José Marcos: Para manter essa força, a gente tem que primeiro orar para Deus, para Deus proteger e desvendar esse caso. A Priscila era uma menina doce, como a mãe falou. Ela era esportista, alegre, amiga e solidária. O caso ficou muito mascarado, como se ela tivesse alguma marginalidade, coisa que nunca existiu. E eu posso falar com certeza, porque sou o pai dela, falava com ela quase que diariamente. Eu morava em Belo Horizonte e ela no Rio, a gente se falava sempre. Inclusive na véspera do desaparecimento dela, conversei bastante com ela à noite, ela não demonstrou nada, nenhum temor. E foi uma surpresa muito grande tudo o que aconteceu.
Jovita: Na própria série, todas as amigas falam que ninguém acredita que ela iria desaparecer voluntariamente. Ela tinha toda a liberdade para isso. Agora, o que salvou a todos nós foi realmente Jesus Cristo, a nossa fé. O meu filho, em um dia em que eu estava com outras mães lá em casa, ele falou: ‘Mãe, você não sabe o que é isso, ter pais vivos e se sentir órfão. Eu não tenho mais mãe’. Então, aquilo foi duro. No outro dia, levantei da cama e comecei a ser uma ativista do tema de desaparecidos.
Jovita, hoje a senhora atua na Superintendência de Enfrentamento das Pessoas Desaparecidas no Rio de Janeiro. Como lida com tantas famílias que passam pelo mesmo trauma?
Jovita: Infelizmente, essa era uma das minhas preocupações quando assumi a Coordenadoria de Pessoas Desaparecidas, que hoje é uma Superintendência de Pessoas Desaparecidas e Documentação — porque toda pessoa que não tem documento é considerada desaparecida; ela é invisível, não existe para o Estado nem para a sociedade. Quando tive contato com as mães, aos poucos, nesse ativismo, me deparei com mães doentes, com mães que o marido foi embora e irmãos com sérios problemas psicológicos. Mas o pior foi ver pessoas que, quando falavam para o empregador que tinham uma filha desaparecida, eram mandadas embora. Para arranjar emprego, elas tinham que mentir, porque o patrão não quer uma funcionária que precisa procurar pela filha. Então, nós temos psicólogos, assistentes sociais, alguém para cuidar só de documentação, e estamos implementando núcleos pelo estado do Rio de Janeiro — ainda são poucos, mas já são um exemplo para São Paulo, Paraná. Andando na rua, você vê várias câmeras. A última coisa que a gente conseguiu fazer na minha secretaria foi que essas câmeras todas do estado passem a procurar não só carros e criminosos, elas vão estar a serviço de procurar pessoas desaparecidas, então cada vez a gente avança um pouco.
E como manter viva a memória da Priscila?
Jovita: Eu não esqueço da Priscila um dia sequer. Ela está aqui, ela não é esquecida nunca. A gente tem que falar, tem que fazer documentário, porque senão o caso cai no esquecimento. Se eu estivesse na cama esses anos todos — que é a minha vontade real, porque meu mundo parou em 2004 –, ninguém mais falaria da Priscila, nós não chegaríamos aqui.
Confira o trailer de Volta, Priscila, do Disney+
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