Durante uma reunião com ministros na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez uma declaração polêmica sobre pessoas com deficiência. “A OMS (Organização Mundial de Saúde) sempre afirmou que na humanidade deve haver 15% de pessoas com algum problema de deficiência mental. Se esse número é verdadeiro, e você pega o Brasil com 220 milhões de habitantes, significa que temos quase 30 milhões de pessoas com ‘problemas de desequilíbrio de parafuso’. Pode uma hora acontecer uma desgraça”, disse Lula, na semana passada, ao falar sobre os ataques a escolas. A fala irritou o apresentador Marcos Mion, que é pai de Romeo, jovem autista de 17 anos.
O titular do programa Caldeirão, da Globo, publicou um vídeo nas redes sociais rebatendo o discurso de Lula, chamando as falas de capacitistas — preconceito contra pessoas que têm alguma deficiência. “Temos de nos policiar, de aprender, de nos adequar. Isso não só é muito pejorativo, quanto incentiva outras pessoas que continuem usando esses termos, que precisam ficar no passado. Sem contar a enorme quantidade de brasileiros que não tem acesso à informação, daí chega o presidente e fala isso. A gente aqui lutando pela aceitação, conscientização, normatização de todas essas condições, noite e dia. Essa pessoa sem informação pode olhar para seu filho com deficiência intelectual e perder as esperanças, porque se o presidente diz que ele tem um parafuso desequilibrado, para que ela vai continuar lutando?”, declarou Mion.
Neste sábado, 22, Lula se desculpou pela declaração dada anteriormente. Ainda em Lisboa, o presidente firmou acordos com Portugal, entre eles a promoção dos direitos de pessoas com deficiência. “Destaco esse acordo também pois gostaria de pedir desculpas sobre uma fala que fiz na semana passada, durante reunião sobre violência nas escolas. Conversei e ouvi muitas pessoas nos últimos dias e não tenho vergonha de assumir que sigo aprendendo e buscando evoluir. É por isso que quero me retratar com toda a comunidade de pessoas com deficiência intelectual, com pessoas com questões relacionadas à saúde mental e com todos que foram atingidos de alguma maneira por minha fala”, escreveu o político no Twitter.
https://twitter.com/LulaOficial/status/1649878847519612933
“Não devemos relacionar qualquer tipo de violência a pessoas com deficiência ou pessoas que tenham questões de saúde mental. Não vamos mais reproduzir esse estereótipo. Tanto eu quanto nosso governo estamos abertos ao diálogo. Como presidente de um país com uma grande parcela da população de PCDs, estou disposto a aprender e fazer o possível para que todos se sintam incluídos e respeitados. É assim que avançamos enquanto pessoas, país e sociedade”, completou.
https://twitter.com/LulaOficial/status/1649878853676834817
Ativista pelos direitos de pessoas autistas, Marcos Mion se reuniu com Jair Bolsonaro em 2019 para falar da lei Romeo Mion, para criação da Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea), que seria emitida de forma gratuita e garantiria a prioridade de pessoas autistas nas áreas de saúde, educação e assistência social. O então presidente sancionou a lei com vetos em janeiro de 2020.
Em agosto de 2021, o então ministro da Educação de Jair Bolsonaro, Milton Ribeiro, fez uma declaração considerada capacitista parecida com a de Lula. “Nós temos, hoje, 1,3 milhão de crianças com deficiência que estudam nas escolas públicas. Desse total, 12% têm um grau de deficiência que é impossível a convivência. O que o nosso governo fez: em vez de simplesmente jogá-los dentro de uma sala de aula, pelo ‘inclusivismo’, nós estamos criando salas especiais para que essas crianças possam receber o tratamento que merecem e precisam”, afirmou Ribeiro na ocasião. Apesar de Marcos Mion não ter feito um vídeo crítico nos mesmo moldes ao que responde Lula, o apresentador também rebateu a fala em uma entrevista dada em setembro de 2021: “Esse cara é um irresponsável. No momento em que você se torna uma pessoa que tem que representar os interesses públicos e não tem empatia, você está no lugar errado. Ele não tinha que estar lá”.