Os protestos dos moradores de Terra de Areia, a 122km de Porto Alegre, que ocorrem desde a semana passada em apoio à greve dos caminhoneiros ganharam reforço religioso na manhã desta segunda-feira (28). Com a maioria das lojas fechadas e prefeitura sem expediente, cerca de 1.500 pessoas fizeram uma caminhada pacífica de 6km que culminou em um culto ecumênico com a presença de um padre e de um pastor luterano. O ato religioso ocorreu em um posto de gasolina onde mais de cem caminhões estão estacionados. No extremo sul do estado, em Santa Vitória do Palmar, o prefeito chegou a declarar o combustível como utilidade pública para desapropriação.
“Foi um ato cívico, de paz, sem interrupção das estradas, foi tudo tranquilo. Caminhamos pedindo não a intervenção militar, mas por intervenção divina para esse momento. O que sinto é que o grito de justiça que os caminhoneiros estão pedindo é correto. Sinto necessidade da gente se manifestar, repudiar a desigualdade social. Não posso calar diante disso. Creio que a sociedade não valoriza tanto o caminhoneiro porque nunca tinha pensado no quanto ele significa para a vida social, sobre o quanto o caminhão é importante. Sem ele, a vida se torna um caos. Em países mais desenvolvidos com ferrovias o caminhão não é tão importante”, disse a VEJA o padre Ceverino Craco, de 52 anos. Ele é pároco há 23 anos e há sete atua junto à comunidade de Terra de Areia.
Nascido no interior do Rio Grande do Sul, em São Marcos, município que tem a popular “Festa dos Caminhoneiros”, o padre chegou a cogitar a vida na estrada antes de optar pela religião. “Dirigia carreta desde criança, muitos na família são caminhoneiros. Guardo parte do meu coração no caminhão, mas Deus quis que eu dirigisse outro tipo de carreta [a religiosa], mas ainda guardo dentro de mim essa vocação”, contou à reportagem.
Mas não só os católicos estavam representados no ato ecumênico. Os moradores evangélicos escutaram o pastor da Igreja Luterana Ilvo Augustin, de 61 anos. Natural de Crissiumal, no noroeste gaúcho, há dezesseis anos ele atende os luteranos da região de Terra de Areia, especificamente em Itati, mas já passou pelo oeste de Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso.
“Há 35 anos trabalho com o povo. O que vejo é uma exploração por parte dos governantes. Precisamos apoiar o povo que vem sofrendo. Não se trata só dos caminhoneiros, mas a população como um todo. Lutamos pacificamente, não buscamos intervenção militar. Os caminhoneiros estavam sendo rejeitados pela própria sociedade. Hoje a população nota que eles é que fazem o Brasil andar. Devemos olhar para essas famílias. Imagine o motorista que fica trinta dias fora de casa, voltar ao lar e não ter o dinheiro necessário, não ter casa própria, não garantir os filhos na faculdade. É um povo que trabalha mais de doze horas por dia na estrada para conseguir o mínimo. Tudo isso se soma à manifestação e faz com que a gente se sinta a favor do povo sofridos do país”, disse o pastor a VEJA.