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Política, negócios, urbanismo e outros temas e personagens gaúchos. Por Paula Sperb, de Porto Alegre
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O Brasil é muito maior que o medo e o ódio, diz Manuela D’Ávila

Mais votada nas eleições parlamentares que disputou, deputada gaúcha afirma que candidatura ao Planalto pelo PCdoB busca saída para a crise sem radicalismos

Por Paula Sperb
Atualizado em 4 jun 2024, 19h19 - Publicado em 14 nov 2017, 20h37
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  • O ano de 2018 vai ser decisivo tanto para o Brasil, que terá eleição após sucessivos escândalos de corrupção de sua classe política, quanto para Manuela D´Ávila, que anunciou que vai concorrer à Presidência da República pelo PCdoB após ter sido a parlamentar mais votada pelos gaúchos em todas as eleições que disputou – iniciou-se na carreira aos 23 anos. Agora, aos 36, ela deverá ser a primeira do seu partido a pleitear o comando do país desde a redemocratização. “O PCdoB tem 95 anos. A nossa história é a prova de que não lançamos candidatura para causar”, disse em entrevista exclusiva a VEJA no seu gabinete de deputada estadual, em Porto Alegre, em resposta a quem acha que o lançamento de seu nome é apenas uma estratégia para marcar território – o PT, diz, pode ser um aliado, mas apenas no segundo turno na eleição.

    Formada em jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), casada com o músico Duda Leindecker e mãe de Laura, de 2 anos e três meses, Manuela se apresenta como uma alternativa para o eleitor atingido pela crise econômica, mas não recorre a discursos radicais. “O medo e o ódio não são propostas para sair da crise que o Brasil vive”, disse, fazendo referência a um provável adversário na disputa, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ). Para ela, uma candidatura de extrema direita como a dele serve para impulsionar uma alternativa de centro. “O Alckmin, por exemplo, não é um candidato de centro, mas, diante do Bolsonaro, ele pode parecer”, disse.

    Em 2016, uma foto da senhora amamentando a filha Laura na Assembleia repercutiu no Brasil inteiro. Por quê?

    Decidi amamentá-la exclusivamente até os 6 meses. Era um dia normal na Comissão de Direitos Humanos e ela começou a chorar, chorar, e eu estava no meio da fala. Fiz o que todas as mães fazem: resolvi o problema dela. Amamentar não era um ato político. A repercussão dessa foto fez com que eu tivesse a dimensão de como o ato de amamentar é um tabu na nossa sociedade, que objetifica o corpo das mulheres. Cumprir a orientação da Organização Mundial de Saúde (OMS) é algo visto como um absurdo, um erro.

    A senhora sempre atuou pelo direito das mulheres. Depois do nascimento de Laura, a perspectiva mudou?

    Eu consegui muito mais conectar o tema da mulher com o tema do Brasil. Porque a maternidade torna muito visível o que é um Estado não adequado às mulheres. O que representa um Estado pequeno e a ausência de creches, de escola em turno integral, para uma mãe trabalhadora? O Brasil é um país muito violento com as mulheres. Pautas como salário inferior [ao dos homens] e assédio sempre fizeram parte da minha rotina de parlamentar. Mas talvez eu tenha compreendido o peso da maternidade na situação que a mulher vive no Brasil.

    Manuela D’Ávila
    A deputada estadual Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) amamenta sua filha Laura durante comissão na Assembleia Legislativa (Reprodução/Facebook)

    A primeira-dama, Marcela Temer, é embaixadora do programa Criança Feliz. O que acha do programa? O papel da mulher ainda é o de primeira-dama?

    A ideia é boa, inspirada no Primeira Infância Melhor [do Rio Grande do Sul], mas não existe investimento para ele, é só uma jogada publicitária. Então, na realidade, dizer que vai investir nas nossas crianças congelando o investimento em políticas sociais por vinte anos [PEC dos Gastos] é uma falácia. Sobre ser primeira-dama, quando a gente debate que “lugar da mulher é onde ela quiser”, é para fazer com que as mulheres saibam que podem estar em qualquer lugar. Não é que não possam se sentir bem no espaço de primeira-dama. É que queremos mostrar que podem estar em outros espaços também.

    Seu gabinete desenvolveu e distribuiu o “machistômetro”, um termômetro que indica atitudes machistas e orienta mulheres. Esperava os ataques que recebeu na internet?

    A gente fez o machistômetro como apoio para os debates sobre violência contra mulher. Ele era bastante simples, mas acabou gerando muito impacto. Essa onda de ódio na internet acontece sistematicamente, não só com o tema das mulheres. Existem candidaturas que têm tentado organizar e potencializar o ódio e o medo.

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    Por que a senhora faz vários vídeos para o Facebook respondendo a comentários nas redes sociais?

    Há pessoas que não percebem como o ódio é um instrumento político e pode sair das redes sociais para as ruas. Esses vídeos são feitos com o esforço de mostrar que é possível construir diálogos e soluções.

    Essa onda de ódio na internet acontece sistematicamente, não só com o tema das mulheres. Existem candidaturas que têm tentado organizar e potencializar o ódio e o medo (…) Há pessoas que não percebem como o ódio é um instrumento político e pode sair das redes sociais para as ruas.

    Quando anunciou a candidatura à Presidência, a senhora disse que eleição é seu “elixir da juventude”. Por quê?

    Quando me candidato, falam: “Ela é muito nova”. Quando é que eu vou ficar velha? Este é meu quarto mandato e minha sétima eleição, e continuo eternamente jovem. Por isso, a eleição é meu elixir, nunca envelheço perante os olhos dos críticos. Fui eleita pela primeira vez quando tinha 23 anos. Agora tenho 36. É praticamente a idade do presidente da França [Emanuel Macron, 39 anos], basicamente a mesma idade do primeiro-ministro do Canadá [Justin Trudeau, 45 anos], da prefeita de Roma [Virginia Raggi, 39 anos].

    Em 2011, a senhora presidia a Comissão de Direitos Humanos da Câmara e pediu a saída de Bolsonaro do grupo. Em 2018, vão disputar o mesmo cargo. Conhece bem seu adversário? 

    O Bolsonaro tem feito um esforço para aglutinar o ódio e o medo. Quando falei [no anúncio de sua candidatura] que o bom-senso da população é o principal adversário do Bolsonaro, é porque o medo e o ódio não são propostas para sair da crise que o Brasil vive. Fui colega dele por oito anos e sei que foi um parlamentar invisível. Ele não tem propostas sequer para as áreas nas quais estimula o ódio. Qual é a proposta dele para a segurança pública?

    Quando me candidato, falam: ‘Ela é muito nova’. Quando é que eu vou ficar velha? Este é meu quarto mandato e minha sétima eleição, e continuo eternamente jovem. Por isso, a eleição é meu elixir, nunca envelheço perante os olhos dos críticos.

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    Mas Bolsonaro é um risco?

    Ele é usado como alternativa de extrema direita para que que uma eventual candidatura de centro cresça, mas sem ser de centro. O Alckmin, por exemplo, não é um candidato de centro, mas, diante do Bolsonaro, ele pode parecer. Por isso precisamos debater ideias. Para que aqueles que defendem o fim do Estado não se passem por alternativas centristas, que não são.

    Como a senhora se tornou candidata à Presidência? É a primeira candidatura majoritária do PCdoB desde a redemocratização.

    No decorrer da construção do Congresso Nacional do partido [marcado para 17 e 19 de novembro], avaliamos que a melhor forma de apresentar as saídas que a gente interpreta como as melhores para a crise do Brasil seria lançando essa pré-candidatura. Foi um processo de uns seis meses da direção do partido comigo, de conversas, de diálogo.

    A crise é grave, tanto econômica como política. Quais são suas principais propostas?

    O tema central é a política econômica, retomar o crescimento. Politicamente, a candidatura defende uma frente ampla, que é a ideia de reunir setores maiores da sociedade. Como a gente faz para o Brasil entrar nesse período da revolução 4.0, da tecnologia, da quarta Revolução Industrial? Precisamos entender qual é o papel do Estado na indução desse crescimento. Precisamos saber qual é o Estado que servirá melhor o povo. De forma mais eficiente? Claro. Mas o debate sobre o Estado não é uma mera discussão sobre gestão. A gestão é fundamental, o Estado tem que funcionar, ser harmônico e ter menos burocracia. Mas a gente não pode fazer com que esse debate pareça que é o debate que vai resolver o problema da retomada do crescimento do Brasil. A gente está discutindo emprego. Melhorar gestão não necessariamente gera emprego.

    Quais são as medidas efetivas para melhorar esse desempenho da indústria nacional?

    Vou dar um exemplo das medidas [prejudiciais] do Temer, que é a alteração da TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) [mudança de taxa subsidiada para taxa de mercado]. Defendemos um referendo revogatório da alteração porque sem a TJLP a gente jamais vai ter emprego de qualidade no Brasil. Porque todos os países têm banco de desenvolvimento com taxa de juro de longo prazo para favorecer a indústria própria e de inovação, que geram empregos. A mesma coisa com os juros e câmbio. A economia brasileira tem que estar a serviço do povo brasileiro. Como a gente tem taxas de juro tão altas se elas não servem para a indústria nacional, para gerar competitividade? Como a gente tem um câmbio que não serve para a indústria brasileira?

    Há uma crise no Congresso, com parte significativa dos deputados investigada. Se for eleita, como conseguirá negociar com os parlamentares para ter governabilidade?

    O Congresso também vai ser eleito em 2018. É preciso fazer esse debate com a sociedade: quais os compromissos dos parlamentares que serão eleitos? Acredito muito no debate com a população e com o Congresso. Cito o exemplo dos 10% do pré-sal para a educação. Era um grande pacto para o futuro do país, que foi destruído agora. Mas naquela ocasião o Congresso votou a favor por causa do debate popular. Acredito nessa equação.

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    A senhora já disputou eleições, como a municipal em Porto Alegre, contra candidatos do PT. Como é ter o PT adversário?

    Nunca tive o PT como adversário. Nossas candidaturas sempre tentaram colocar os problemas das pessoas e da cidade no centro. Isso faz com que você enxergue os outros partidos de uma forma diferente. Tenho bastante tranquilidade com isso. Nós e o PT temos uma relação fraterna, mas somos partidos diferentes. É natural que tenhamos candidaturas diferentes e que nos encontremos, na frente, em eleições de dois turnos.

    Gleisi Hoffman, presidente nacional do PT, elogiou a senhora na semana passada, em Porto Alegre, mas disse que o partido não desistiu de uma aliança com o PCdoB. A sua candidatura é só para tentar ocupar o cargo de vice?

    O PCdoB tem 95 anos. A nossa história é a prova de que não lançamos candidatura para causar. Se fosse para causar, poderíamos ter lançado candidatura em todas as eleições e depois retirado. Lançamos a candidatura porque 2018 é o momento de discutir o futuro do Brasil, e não o passado. A gente tem uma caracterização política muito firme. Em 2016 houve uma ruptura, um golpe parlamentar e, a partir disso, se abre um novo ciclo. Temos uma interpretação muito parecida com a do PT sobre o passado. Mas as saídas para a crise nós temos as nossas e eles têm as deles. Sim, a gente acredita que vai se encontrar no futuro. Mas achamos que esse futuro é o segundo turno das eleições.

    Quando anunciou sua candidatura, a senhora disse que a participação do ex-presidente Lula na eleição do ano que vem é importante. Por quê?

    Eleição é momento de superação da crise, não de agravamento dela. Em uma eleição em que o Lula estivesse impedido de concorrer, a crise estaria agravada.

    Mas a senhora acha que o Lula não cometeu crime, como aponta a Lava Jato?

    Eu não sou juíza, mas, se ele cometeu crimes, é preciso que haja provas. O Lula e qualquer brasileiro têm que ser julgados pela lei, é isso que garante a democracia e a existência das nossas instituições. Enquanto não apresentarem uma prova de que ele cometeu crime, ele não cometeu crime. É assim com ele e deve ser assim como todos.

    E o que pensa da Lava Jato e da atuação do juiz Sergio Moro?

    A operação surgiu com o bonito interesse de combater a corrupção no Brasil, só que ela virou uma operação absolutamente política. Basta ver o que acontece hoje em Brasília, os desfechos e o entorno do presidente Temer.

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    Eleição é momento de superação da crise, não de agravamento dela. Em uma eleição em que o Lula estivesse impedido de concorrer, a crise estaria agravada.

    No início deste ano, um delator, Alexandrino Alencar, da Odebrecht, chegou a citar a senhora na Lava Jato. Como foi sua reação? Isso avançou na Justiça?

    Qualquer pessoa honesta se sentiria mal de ser citada por alguém naquela circunstância. Inclusive, citada de forma triangulada, não me menciona diretamente. O caso está fora da Lava Jato e está no Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul, não avançou ainda. Foi direto ao TRE por estar ligado à eleição, e não a outro tipo de crime. Ele me mencionou de forma equivocada. Fala coisas que não são verdadeiras, como eu ter recebido valor em caixa dois. Na verdade, eu recebi em caixa um, está registrado. Todas as doações da minha campanha foram legais. A prova maior é que ele diz que não se encontrou comigo. Qualquer pessoa honesta se sentiria mal de ver seu nome [envolvido] porque é uma injustiça. Mas, o.k., a Justiça vai comprovar isso.

    A senhora é a favor da legalização das drogas?

    É preciso discutir o tema na perspectiva proposta pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), unindo a sociedade para debater números, e não achismos. Quantos jovens morrem, qual é a situação da segurança, qual o resultado concreto. Os números mostram que a violência aumentou a partir de uma política de guerra às drogas. O Brasil pode fazer esse debate, vinculando inclusive a tributação das drogas a campanhas educativas de prevenção do consumo de todas as drogas. O Brasil subestima o consumo de drogas lícitas.

    Alguns grupos, como o MBL (Movimento Brasil Livre) usam o termo “comunista” como xingamento. Por que isso acontece?

    Por ignorância, por não saberem o que representamos. Somos aqueles que defendem a ideia do comum, de que é possível viver em uma sociedade com acesso ao básico.

    Como seria uma Presidência comunista no Brasil?

    Nosso projeto é de desenvolvimento com crescimento da economia a partir da indústria nacional, que significa emprego de qualidade com direitos sociais. As pessoas olham para outros países e buscam viver como as pessoas de lá vivem. Só que elas não enxergam que essa vida de andar tranquilo na rua, de poder ter o filho matriculado em escola pública, como é na Europa, tem por trás um projeto de país. “Quero viver como o inglês, que tem transporte público, mas sou contra o Estado.” Não combina. É preciso saber que aquilo existe a partir de um projeto de nação, que serve para Inglaterra, Holanda ou França. Qual é o nosso projeto? O governo do PCdoB será um governo amplo, que reúna setores, dialoga e constrói saídas que passam pela ideia de que é possível fazer do Brasil um grande país. Acredito nisso. O Brasil é muito maior do que o medo e o ódio que tentam plantar nos nossos corações.

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