Saidinha, câmeras etc.: o que muda na segurança
O suposto debate sobre itens da segurança é basicamente mais do mesmo
Neste momento, dois temas são recorrentes quando o assunto é segurança. Um é a saidinha, que o Congresso aboliu, Lula vetou, o Congresso derrubou e por fim o ministro André Mendonça avisou que ok, mas só vale para quem ainda não tem direito à saidinha. Para quem já está saindo, continua tudo como dantes no quartel de Abrantes.
O outro são as câmeras nas fardas da PM, assunto precipitado pelo governador de São Paulo (onde as câmeras são obrigatórias), Tarcísio de Freitas, que a princípio negou-se a instalar, correu o risco de ser acusado de prevaricação, depois decidiu jogar fora as câmeras que já tem para comprar outras, novas, que os policiais possam desligar.
O ministério da Justiça publicou umas “diretrizes” sobre como as câmeras devem ser usadas, mas, como ninguém é obrigado a segui-las, Tarcísio vai fazer o que quiser. Ou seja, para os policiais, continuará tudo como dantes no quartel de Abrantes.
A saidinha é assunto polêmico: a impunidade é alta no Brasil e é comum que criminosos perigosos saiam da cadeia antes da hora. Especialistas dizem que restringir a saidinha atrapalharia a ressocialização, o que faz sentido, e que são poucos os casos em que o preso que sai desrespeita as regras da saidinha (mas 5% não são tão pouco assim).
As câmeras também são assunto polêmico — mas não deveriam: é evidente que a sociedade, que põe armas na mão de policiais, tem o direito de saber tudo o que esses policiais fazem enquanto estão carregando essas armas. Câmeras são usadas em outros países e é sabido que elas reduzem a letalidade (e também a mortalidade) da polícia. Por que alguém seria contra as câmaras?
A resposta que vem à cabeça é: para deixar a polícia matar impunemente. Jair Bolsonaro defendia o “excludente de ilicitude”, uma espécie de salvo-conduto para a polícia poder matar “vagabundo” na favela sem maior preocupação. Dar à polícia não apenas o direito de matar, mas também o de decidir quem deve morrer, equivale a criar uma pena de morte informal e privatizada e abolir o Estado Democrático de Direito. Sem falar que é inútil: o “método” está em vigor há décadas, e a violência só aumenta.
Saidinha e câmeras nas fardas são assuntos importantes, que precisam ser debatidos, mas não há debate algum acontecendo. Mais importante, nem saidinha nem câmera fazem parte de uma política de segurança ampla e consistente. Não existe política de segurança em lugar nenhum, nem na esfera federal nem nos estados.
Para melhorar a segurança, é necessário reformular e reestruturar as polícias (onde há alto grau de corrupção), suavizar o código penal em relação às drogas, endurecer o código de processo penal e a lei de execução penal. Mas para isso é preciso que políticos de direita e de esquerda dialoguem de maneira técnica e objetiva.
Mas ninguém está interessado em diálogo.
À direita e à esquerda, o único interesse é lacrar.
(Por Ricardo Rangel em 03/06/2024)