Mauro Cid, na delação, informou que Bolsonaro discutiu a hipótese do golpe com sua ala militar e com os comandantes das Forças Armadas, relata Aguirre Talento, do UOL. Para piorar, o então comandante da Marinha, almirante Almir Garnier, teria aderido.
É uma notícia tenebrosa, a mais grave até aqui. Mas não deveria surpreender ninguém. O histórico de ameaças feitas ao poder civil por Bolsonaro e seus generais é muito eloquente. Só tolos acreditavam que oficiais-generais não estavam discutindo abertamente o golpe. É impossível contar ou listar aqui tais ameaças, mas há três episódios particularmente reveladores que merecem ser relembrados.
Em maio de 2020, Bolsonaro decidiu fechar o Supremo e discutiu o assunto com os generais-ministros Braga Netto, Luiz Eduardo Ramos e Augusto Heleno. Braga Netto e Ramos concordaram, mas Heleno observou que “não é o momento para isso”. A reportagem, da revista Piauí, nunca foi desmentida.
Em julho de 2021, o então ministro da Defesa, general Braga Netto, se cercou dos comandantes das Forças Armadas para mandar um recado singelo: sem voto impresso e auditável, não haveria eleições em 2022. No mesmo dia, Bolsonaro repetiu publicamente a ameaça de Braga Netto. A reportagem, de O Estado de S.Paulo, nunca foi desmentida.
Na manhã de 10 de agosto de 2021, a Marinha enviou tanques para a Praça dos Três Poderes, numa clara intimidação para obrigar o Senado a aceitar a PEC do Voto Impresso, a ser votada naquela tarde. A ideia do desfile-intimidação foi do almirante Almir Garnier, já comandante da Marinha.
A inclinação golpista vem de longe (cá entre nós, vem de 1889), apenas se intensificou com a perspectiva da derrota eleitoral.
Para contrabalançar, uma boa notícia: os comandos militares, informa Míriam Leitão, do Globo, já tomaram a decisão de expulsar os golpistas. Estão apenas esperando que a Justiça defina as culpas.
É excelente que as Forças Armadas tenham finalmente compreendido que a única maneira de preservar a imagem da corporação e demonstrar que os golpistas são mesmo “elementos isoladas” é justamente punir tais elementos.
Mas vamos ver como os Altos-Comandos reagem diante da hipótese de expulsar seus próprios ex-integrantes, em um ou outro caso, oficiais-generais que chegaram ao posto de comandante de Forças, como o almirante Garnier.
Em tempo: deve-se reconhecer que as Forças Armadas, enquanto corporação, não aderiram ao golpe. Mas é erro grosseiro repetir, como o ministro Múcio e outros têm feito, que “as Forças Armadas salvaram a democracia brasileira”. Recusar-se a cometer crime é obrigação básica de todo mundo. Ninguém salva alguém por simplesmente não participar do atentado contra sua vida.