Leitores deste blog,
Tenho um convite irrecusável a fazer aos que apreciam o texto e o jornalismo de excelência: comparecer nesta segunda à Livraria Cultura, da Paulista, para o lançamento de “Todo Aquele Imenso Mar de Liberdade” (Editora Record), o livro que narra a trajetória de um dos maiores jornalistas políticos do país: Carlos Castello Branco, o Castelinho (1920-1993). Quem se ocupa da tarefa é Carlos Marchi, outro que sabe se tratar uma narrativa tendo a “Inculta & Bela” como sua inevitável aliada.
Castelinho, nascido em Teresina e mineiro de formação, começou a carreira em Belo Horizonte, mas se tornou jornalista político no Rio, onde trabalhou em O Jornal, Diário Carioca, Tribuna da Imprensa e O Cruzeiro. Na segunda metade dos anos 50, foi articulista da Folha, que publicava suas colunas na primeira página. Mudou-se para Brasília em 1961, arrastado por José Aparecido de Oliveira, para ser porta-voz de Jânio Quadros, cargo que o obrigou a deixar todos os jornais para os quais trabalhava. Depois da renúncia, migrou para o JB e lá ficou até o fim.
O jornalista que tinha um apreço quase opressivo pelos fatos pertencia, originalmente, ao grupo que gostava mesmo de ficção: a “Turma de Minas”, que reunia Otto Lara Resende, Fernando Sabino, Paulo Mendes Campos e Hélio Pellegrino. Castelinho queria ser romancista, ensaiou algumas coisas no terreno da imaginação, mas talvez estivesse preso demais às circunstâncias terrenas. E delas tratou com maestria, driblando duas ditaduras, a do Estado Novo e a militar. Chegou à Academia Brasileira de Letras. E foi a sua crônica política que o conduziu até lá.
Marchi faz a costura exata — um tributo à exatidão do biografado — entre a personagem e o país no qual se movia. Ao tratar com cuidado e precisão do homem e de suas circunstâncias, tem-se o perfeito registro do espírito de um tempo: sem mistificações, sem condescendência, sem moralismo barato.
Sabemos, hoje, leitores, o que é escrever num regime de plenas liberdades. Castelinho foi mestre quando era preciso sugerir, dar a entender, aludir. E ele o fazia, leiam o livro, sem perder a objetividade e sem se deixar levar pela paixão, embora, claro!, as tivesse. Era, por formação e convicção, um liberal. O trabalho que o levou à Academia também o levou algumas vezes à cadeia.
O trecho mais terno e sugestivo do livro passa um tanto longe do jornalismo e trata da sua briga — e rompimento — com Carlos Drummond de Andrade, em 1947. Os dois ficaram sem se falar com a década de 70, quando voltaram a se aproximar, construindo, então, na velhice uma invejável fraternidade.
O último terço de sua vida foi marcado por uma dor sem remédio: a morte de seu primogênito, Rodrigo, aos 25 anos, num acidente de automóvel em Brasília, em circunstâncias não muito claras. A roda de seu carro soltou-se. Castelinho passou a conviver com o fantasma da possibilidade de Rodrigo ter sido assassinado pelo SNI. A tragédia e a desconfiança não mudaram a objetividade de suas colunas, mas envenenaram a sua vida. O álcool passou a ser, então, um companheiro pouco recomendável para quem já tinha uma saúde frágil.
Nada, no entanto, tisna a grandeza do mestre da crônica e da análise políticas. Era informativo, elegante e preciso. Como o livro escrito por Carlos Marchi.