Alguns movimentos que apoiaram o impeachment de Dilma assinaram um manifesto protestando contra a demissão de Fábio Medina Osório. De saída, faça-se uma correção: o Movimento Brasil Livre não está entre os signatários, conforme se noticiou, inclusive o programa “Os Pingos nos Is”, da Jovem Pan, que eu ancoro. O texto em apoio a Osório sugere que ele é um paladino do combate à impunidade e que o Palácio do Planalto, numa articulação comandada pelo ministro Eliseu Padilha (Casa Civil), estaria interessado no contrário.
Aliás, em entrevista à VEJA, Osório diz a mesma coisa: “O governo quer abafar a Lava-Jato. Tem muito receio de até onde a Lava-Jato pode chegar”. Mas também é Osório quem diz, na mesma entrevista, sobre o presidente Michel Temer: “Ele é uma pessoa que admiro muito, elegante, bem-intencionado, quer fazer o bem para o Brasil, ao contrário do Padilha”.
Há aí uma contradição inelutável. Ou Temer é bem-intencionado e, nessa condição, o demitiu sabendo o que fazia. Ou, ao tê-lo demitido para abafar a Lava-Jato, então bem-intencionado não é. Fiquei com a impressão de que Osório quer acertar as suas contas com Padilha e, para tanto, ataca o governo, mas tentando preservar Temer, como se isso fosse possível.
Osório é chegado a frases de tom apocalítico: “Se não houver compromisso com o ataque à corrupção, esse governo vai derreter”. Certo! Mas ele mesmo afirma à VEJA: NADA CONHECE QUE DESABONE A CONDUTA DO PRESIDENTE.
Questão conceitual
A acusação dos ex-advogado-geral é grave: diz que o governo quer abafar a Lava-jato. Mas cabe aí fazer uma pergunta: como é que ele poderia fazer tal coisa? A operação, por acaso, é tarefa do Executivo? Só um grupo conseguiria hoje trabalhar contra a dita-cuja: a própria força-tarefa. Alguém acredita que o governo tenha mesmo condições de tolher o trabalho dos procuradores, da Polícia Federal e do juiz Sergio Moro? Entendo que não.
Não gosto do modo como o ex-advogado-geral se pôs nesse debate. Contra a orientação do governo, ele resolveu requisitar os dados dos inquéritos em curso, segundo disse, para mover ações de improbidade administrativa contra os políticos envolvidos. Antes disso, afirma ter se mobilizado para que as empreiteiras ressarcissem os cofres públicos pelos danos provocados ao erário. Ele diz que essas eram suas tarefas e que não cumpri-las seria prevaricar.
Vamos lá. De fato, o governo já havia orientado Osório a ficar longe do caso, no que, entendo eu, fazia muito bem. Imaginem a dor de cabeça que provocaria esse trânsito de informações. A suspeita de que, aí sim, o Executivo estaria atuando para se meter na Lava-Jato seria gigantesca. Mais: há um órgão do primeiro escalão que cuida das medidas a serem adotadas contra as empreiteiras e do ressarcimento aos cofres públicos: a Controladoria-Geral da União, com o devido acompanhamento do Ministério Público.
Mais: quem disse que é só a AGU que pode entrar com ações de improbidade contra os políticos? É claro que não! Se o preço de fazê-lo é o órgão mergulhar de cabeça nos inquéritos, então é melhor não, porque sempre haverá o cheiro da interferência indevida do governo.
Ok, ele diga o que quiser, e a obrigação do jornalismo é registrar a sua fala, mas tenho pra mim que o Executivo não pode ser acusado de querer abafar a Lava-Jato porquanto não haja nada a abafar no seu âmbito.
Acho que o advogado-geral alimentou mal as suas ambições e não se conformou com aquele que era o seu papel. Quando lhe foi dado atuar para impedir o governo de fazer bobagem, como no caso da demissão de Ricardo Melo, da EBC, é preciso admitir: Osório mandou muito mal e permitiu que o governo caísse numa roubada.
Também me parece despropositado que ataque a sua sucessora no cargo, como fez, tentando desqualificar Grace Mendonça, contra a opinião de pessoas sensatas, que a consideram competente.
Reitero: uma coisa é o governo querer manter o Executivo longe da Lava-Jato. Outra, distinta, é querer abafá-la. Seria, quando menos, necessário dizer como se faria isso. E, vamos convir, Osório não disse.