Por Márcio Kroehnn, na VEJA.com:
O economista Edmar Bacha, um dos criadores do Plano Real, lançou o termo Belíndia para definir a condição heterodoxa do Brasil nos anos 1970: a riqueza da Bélgica misturada à condição social da Índia. Passadas mais de quatro décadas, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 2012 divulgado nesta quinta-feira pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) trouxe novamente essa alegoria à cena. Durante a década de 2000, a média de crescimento anual do IDH brasileiro era de 0,82%. Ao estender essa curva para o intervalo de 2000 a 2012, o ritmo de crescimento anual desacelerou para 0,73%. Trata-se de uma redução no ritmo de expansão semelhante à que ocorre nos países com os melhores indicadores socioeconômicos, como a Noruega, líder do ranking, ou a própria Bélgica – o fato curioso é que o Brasil está bem longe de gozar do mesmo patamar de qualidade de vida que tais nações. Prova disso é que o país se aferra à desconcertante 85ª colocação no ranking – marca semelhante à verificada no levantamento de 2011.
No estudo composto por 187 países, o IDH do Brasil ficou em 0,730 em 2012 – está no meio do caminho entre a Bélgica, na 16ª colocação, com IDH de 0,897, e a Índia, na 136º posição, com IDH de 0,554. O indicador varia de 0 a 1 e a qualidade de vida é maior quanto mais alto o número dessa escala. No ano passado, o Brasil aparecia na 84ª colocação, mas a Organização das Nações Unidas (ONU) revisou os dados, o que fez o país perder uma posição no relatório referente a 2011. A metodologia do Pnud tem sido revista anualmente desde 2010, o que tem modificado os resultados anteriores – e tornado difícil fazer comparações anuais. Há dois anos, o Brasil aparecia classificado como na 73ª posição, mas a revisão reclassificou o país no 85º lugar. A explicação é a busca de dados mais confiáveis que permitam um maior nível de detalhamento da economia, da educação, da saúde, do meio-ambiente, entre outros dados comparativos.
No ano passado, Portugal foi o país que mais perdeu posições em 12 meses, caiu da 40ª para a 43ª posição. O maior crescimento foi da Líbia, que pulou 23 posições para a 64ª colocação – à frente do Brasil. A explicação do Pnud é a atualização do Fundo Monetário Internacional (FMI) da estimativa de crescimento da economia líbia nos últimos dois anos. O ranking dos 10 primeiros não sofreu alteração, com Noruega, Austrália e Estados Unidos nas três principais colocações.
Neste ano, o Pnud trouxe dois indicadores experimentais para mostrar o desenvolvimento dos países de forma mais ampla. O primeiro observa a disparidade entre os gêneros. O Brasil aparece também na 85ª posição, com 0,447 entre as condições de igualdade para homens e mulheres. Nesse caso, quanto mais próximo de zero, menores são as diferenças entre os sexos. A Holanda é a primeira colocada, com 0,045, seguida pela Suécia, com 0,055. Por falta de dados, alguns países não têm índice nenhum.
O segundo indicador tenta capturar as privações da população com saúde, educação e padrão de vida. Um dos dados mais importantes é o da população que vive abaixo da linha da pobreza, medida com a renda diária de 1,25 dólar de paridade do poder de compra (PPP, um indicador que mostra quanto uma mesma quantia pode comprar em cada país). Uma das prioridades globais é a erradicação da pobreza e da fome – ponto que leva destaque nas metas estabelecidas pela ONU em 1990, que apontam oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Reduzir pela metade a proporção de pessoas vivendo com menos do que esse valor até 2015 era um dos objetivos. No ano passado – com três anos de antecedência – ele foi cumprido. As Nações Unidas creditam o sucesso a Brasil, China e Índia, os países mais populosos. Brasileiros e chineses reduziram de 17,2% para 6,1% e de 60,2% para 13,1%, respectivamente, o nível de pobreza nos últimos sete anos.
O Brasil está, ao lado de Índia e China, entre os países que vão liderar o desenvolvimento humano nos próximos anos. A situação brasileira, especificamente, foi elogiada pelas Nações Unidas pelos cuidados com a economia nos últimos 20 anos, sobretudo o controle da inflação e a liberalização do comércio. A educação também foi citada, devido aos financiamentos educacionais que beneficiaram jovens de diferentes regiões do país – o programa Bolsa Escola serviu de exemplo para outros países da América Latina, como o México. E as políticas públicas de saúde ajudaram a melhorar o acesso da população mais carente aos tratamentos médicos. Mas, mesmo com todos os avanços e elogios da ONU, o país ainda está numa posição intermediária e bem distante de conquistar um alto nível de qualidade de vida. A continuar nesse ritmo, o país será alcançado – e ultrapassado rapidamente por seus correlatos, Índia e China.