Uma reportagem da Folha desta quarta desmoraliza de vez o programa — se assim se pode chamar — de ciclovias da cidade de São Paulo, a única, como direi?, obra de vulto de Fernando Haddad. Não só isso: a reportagem evidencia também, ainda que sem querer, as consequências de uma política autoritária e elitista. Já chego lá. Antes, uma digressão importante.
Haddad está com rinite alérgica. Por isso, decidiu tirar uma licença, que terminaria na quinta. Mas aí vem o feriado de 9 de Julho, então ele resolveu fazer a revolução constitucionalista do seu próprio conforto. Só volta na segunda próxima. Para quem nunca havia exibido sinais dessa moléstia leve, parece que a dele foi brava. Tenho rinite há 45 anos e nunca perdi um dia de serviço por causa disso.
Mas não reclamo, não! Que o prefeito Haddad fique na casa dele ou sei lá onde. Ele está naquela categoria de homens que rendem o dobro quando trabalham a metade. Se ficam, então, sem fazer nada: melhor! Não perturbam a vida de quem é ocupado. Assim, digo eu, fique em casa, prefeito! Mas volto às ciclofaixas.
A Folha visitou algumas em vários pontos da periferia. Reproduzo: “as ciclovias estão tomadas por sujeira, buracos, enchente, falta de sinalização, iluminação e fiscalização”. As fotos revelam a nojeira. Mas não só. O jornal traz outro dado relevante. “Das 32 subprefeituras da capital, só 6 não ganharam ainda ciclovias sob a gestão Haddad, todas na periferia: Sapopemba, Itaim Paulista e Guaianases, na zona leste, M’Boi Mirim, Cidade Ademar e Parelheiros, na zona sul. Desses locais, Sapopemba, Itaim Paulista e Cidade Ademar têm mais de duas mil viagens de bicicleta por dia, segundo pesquisa do Metrô. Entre 96 distritos, eles fazem parte dos 20 com mais ciclistas.”
Ao explicar o estado miserável das ciclofaixas na periferia, o diretor de planejamento da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), Tadeu Leite, afirma que as ciclovias chegam em alguns bairros periféricos antes de outras melhorias de infraestrutura. Pois é… Ocorre que aí não está a desculpa, mas a natureza do problema. Em vez de concorrer para melhorar, então, a infraestrutura das áreas mais pobres, Haddad opta por lhes dar de presente aquela faixa vermelho-amarronzada.
Tem explicação
Como se explica que haja mais ciclofaixas na região central e em áreas ricas, onde há menos bicicletas, do que nas áreas pobres e por que o estado de abandono das pistas na periferia? Para chegar à resposta, é preciso entrar um pouco na cabeça de um esquerdista como Haddad.
Um político como ele não está interessado na eficiência. Ao implementar aqueles desertos vermelhos, ele não está pensando na mobilidade — ou faria tudo com mais vagar, com mais cuidado, com mais perícia, com mais diálogo com os moradores. Esquerdistas não estão nem aí para a realidade. Eles pretendem é vender uma ideia e reeducar as pessoas a seu modo.
Os comunistas, por exemplo, nunca se importaram se suas escolhas iriam dar certo ou errado. Queriam era o triunfo de um valor. Durante a coletivização forçada da agricultura na extinta URSS, empreendida por Stálin, calcula-se que morreram 25 milhões de pessoas. É que o bigodudo assassino não estava coletivizando para matar a fome de ninguém. Ele o fazia porque queria pôr fim à propriedade privada no campo.
Haddad, um discípulo de Stálin e autor de um livro sobre a viabilidade do sistema soviético quando este já chegara ao fim, não implementa ciclovias para fazer o trânsito fluir melhor, para atender à demanda dos poucos que andam de bicicleta, para tornar melhor a vida na cidade. Ele as implanta porque é autor de uma tese. E quer impô-la onde há mais reação.
Assim, a área central e alguns bairros mais ricos, onde Haddad impôs as ciclofaixas, são para ele o que a Ucrânia foi para Stálin durante a coletivização forçada da agricultura. Se pudesse, o prefeito metia uma faixa nos quintais. Perto ele já está: em alguns lugares, elas foram desenhadas nas calçadas.
A natureza do ciclofaixismo de Haddad está exposta: ele quer comprar briga com aqueles que não votaram nem votarão nele e largou ao léu os que votaram. Afinal, ele é um homem de esquerda.