Após mais de uma hora de conversa dura entre Ricardo Nunes e a então secretária municipal das Relações Internacionais de São Paulo, Marta Suplicy, nesta terça-feira, o entorno do prefeito fala em constrangimento, decepção e traição. O desligamento foi publicado no Diário Oficial desta quarta.
“Foi o maior cavalo de pau que eu já vi na minha vida”, disse um dos presentes na reunião.
Chamada por Nunes à sede da prefeitura, Marta chegou por volta das 17h15 e saiu antes das 19h do Viaduto do Chá. Os dois lados já sabiam, há algum tempo, sobre o fim da linha da participação da ex-secretária na gestão municipal, mas ainda havia uma questão a ser resolvida: de quem partiria a iniciativa para a demissão?
Na equipe do prefeito, um grupo queria decretar, de forma enérgica, a exoneração. Só assim, o chefe do Executivo paulistano demonstraria que tem “pulso firme”. Outros argumentaram que o melhor caminho é alimentar a narrativa da traição. As conversas de Marta com Lula para se aliar ao principal rival nas próximas eleições foram sempre pelas costas de Nunes. “Ela que peça demissão”, diziam esses aliados.
Incredulidade e reaproximação
Tudo começou durante uma viagem do prefeito aos Estados Unidos. Em um grupo de WhatsApp, Marta disse a quadros importantes da esquerda que já havia conversado com o presidente sobre a possibilidade de ser vice de Guilherme Boulos, líder nas pesquisas e principal rival de Nunes no pleito de outubro.
A informação vazou, o emedebista soube e ficou incrédulo. “Se isso ocorrer, será uma grande traição”, afirmaram, na época, integrantes da comitiva de Nunes no Texas.
Nesta semana se consumaram novos capítulos, nos quais o ex-presidente do PT e deputado federal, Rui Falcão, foi peça fundamental. Secretário de Marta por quatro anos, quando ela governou a cidade de São Paulo, Falcão serviu de elo, em 2022, para as pazes da ex-prefeita com Lula — mesmo após a posição contrária a Dilma Rousseff, no processo de impeachment da petista.
No ano seguinte, o deputado seria convocado pelo presidente para, mais uma vez, reaproximar Marta ao petismo. A agenda oficial de Lula foi alterada, na segunda-feira, e uma reunião marcada entre Falcão e Lula no Palácio do Planalto também recebeu a ex-secretária de Nunes e seu marido, Márcio Toledo. Após o encontro, todos apareceram sorridentes em uma foto, divulgada pelo petista.
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“Uma imagem vale mais do que mil palavras”, disse o deputado, aproveitando o jargão para dar a entender a jornalistas o que já havia sido vazado pela imprensa: ela disse sim ao pedido de Lula para ser vice de Boulos.
Há dois anos, o deputado do PSOL abriu mão da candidatura nas eleições estaduais para abrir caminho ao PT, em troca de apoio para concorrer à prefeitura. E, conforme acordado, está recebendo ajuda do petismo na disputa municipal.
Decepção
Interlocutores dizem que o prefeito se sentiu “muito decepcionado”, não apenas pelo episódio político, mas também pela relação pessoal que desenvolveu com Marta. O prefeito costumava sair para jantar com ela junto a sua esposa, Regina, e o marido de sua ex-secretária, Márcio Toledo.
Na reunião que sacramentou a saída de Marta da gestão municipal, Toledo teria falado mais do que a esposa e sido mais incisivo. Ricardo Nunes também falou pouco e o bate-boca ficou por conta dos auxiliares. A melhor saída encontrada foi uma demissão “em comum acordo”.
Marta alegou que não poderia dividir o palanque de Jair Bolsonaro. “Seguirei caminhos coerentes com minha trajetória, princípios e valores que nortearam toda a minha vida pública”, escreveu em sua carta de despedida. Aliados de Nunes rebatem.
“Já teve almoço, foto… quantas notícias do prefeito com Bolsonaro? Se fosse verdade, ela teria saído nas eleições presidenciais”, exclama um dos integrantes da equipe do prefeito, que participou da conversa.
“Ela chegou a dizer que o Boulos é inexperiente. O marido dela já disse que ele arranjou Covid para fugir do debate. Tudo muito contraditório. Foi uma conversa constrangedora”, acrescenta.
À espera de um anúncio oficial, Marta tem tudo para ser a vice escolhida por Lula para Guilherme Boulos. Por outro lado, Valdemar Costa Neto, cacique do PL, afirma que Bolsonaro irá escolher o vice de Nunes. Aguardam-se os próximos capítulos das eleições deste ano, com o roteiro bem parecido ao de 2022.