Editorial de O Estado de S. Paulo (15/2/2021)
A prioridade nacional é a vacinação de todos os brasileiros maiores de 18 anos contra a covid-19, respeitando-se, é claro, a ordem de precedência estabelecida pelas autoridades de saúde. Não é a única prioridade em um país marcado por tantas chagas abertas, mas não é possível dar a atenção necessária a temas como recuperação econômica, reformas estruturais, políticas educacionais e preservação do meio ambiente, enquanto cerca de 1,5 mil brasileiros morrem em decorrência da doença todos os dias. Uma situação como essa paralisa a Nação.
Não se pode vislumbrar um futuro mais promissor para o País se o morticínio causado pelo novo coronavírus não for interrompido o mais rápido possível. A perda de tantas vidas, dia após dia, drena as forças da sociedade, que não pode simplesmente olhar resignada para o ignominioso comportamento do presidente Jair Bolsonaro na condução do País em meio a esta tragédia sem precedentes. São quase 240 mil vidas perdidas por uma única causa em tão pouco tempo, e há de chegar o dia em que o presidente da República terá de responder à Justiça por sua parcela de responsabilidade na produção deste terrível resultado.
É consenso que apenas uma massiva e rápida campanha de vacinação – como só o SUS tem experiência em fazer – pode frear a circulação do vírus e impedir o crescimento desenfreado das internações e mortes por covid-19. Mas, se depender da iniciativa do governo, muita gente morrerá até que o País possa contar com as doses de que tanto precisa.
Em audiência no Senado, na quinta-feira passada, o ministro da Saúde foi incapaz de responder a uma singela pergunta formulada pelas senadoras Rose de Freitas (MDB-ES) e Simone Tebet (MDB-MS): quando haverá vacinas suficientes para imunizar todos os brasileiros elegíveis?
Diante da desidiosa atuação do governo federal, que trata a emergência sanitária na base do improviso e da negação, um grupo de empresários, entidades de classe e veículos de imprensa, entre os quais o Estado, se uniu para ajudar a agilizar a compra de vacinas, o transporte, a distribuição e a aprovação dos imunizantes no País. A sociedade se mexe.
O movimento “Unidos pela Vacina”, é importante frisar, não visa a comprar diretamente os imunizantes. O objetivo é usar a força da sociedade para pressionar todas as esferas de governo, nos limites de suas responsabilidades, a fim de garantir que entre 60% e 70% da população esteja vacinada até setembro.
“Não vamos sair comprando vacinas”, disse a empresária Luiza Trajano, do Magazine Luiza. “O governo federal não precisa de dinheiro para vacinas. Se a necessidade fosse dinheiro, seria mais fácil. Mas podemos agilizar a compra com a influência das nossas empresas.”
De fato, a atribuição de comprar vacinas é do Ministério da Saúde, que as distribui aos Estados e estes, aos municípios. O movimento “Unidos pela Vacina” ajuda muito como mais um instrumento de pressão da sociedade sobre um governo que custa a pegar no tranco.
Os membros do movimento foram divididos em grupos de trabalho. O principal, como não haveria de deixar de ser, é o que trata da disponibilidade de vacinas em quantidade para atender toda a população.
A ciência fez seu trabalho. E com louvor. A partir do primeiro caso registrado de covid-19, no fim de 2019, em poucas semanas o sequenciamento genético do novo coronavírus já havia sido realizado. Daí para o desenvolvimento de não uma, mas de ao menos seis vacinas seguras e eficazes contra o patógeno levou pouco mais de um ano. Um feito científico sem precedentes.
Portanto, há vacinas. O governo federal é que não trabalhou com diligência para trazê-las aos brasileiros a tempo de salvar vidas. E não o fez porque Jair Bolsonaro não quis. É tão simples quanto isso. Passa da hora de fazê-lo agir como presidente da República.