Galinha não voa, e o presidente Lula e o ministro Fernando Haddad sabem disso. Mas ambos têm insistido na avaliação de que a economia brasileira engrenou uma trajetória de crescimento sustentado. Afinal, o próprio “mercado” – essa entidade sempre tão demonizada pelo governo – já prevê aumento superior a 3% para o PIB neste ano. De fato, alguns indicadores merecem ser celebrados, como a queda do índice de desemprego para 6,6% (pelos dados da Pnad), o menor patamar desde 2012, o que tem estimulado a demanda interna e, por tabela, puxado o PIB.
Mas isso só conta parte da história, porque, olhando para outros números, a situação não parece tão promissora. A grande preocupação continua sendo o equilíbrio futuro das contas públicas, na medida em que a cada dia fica mais claro o esforço da equipe econômica para colocar de pé um Orçamento que depende, essencialmente, do aumento da arrecadação – e não se fala em cortes efetivos de gastos.
Essa preocupação apareceu com destaque na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, que cobrou “transparência” e “regras previsíveis” para as contas públicas e disse que a política “expansionista” do governo joga contra o controle da inflação. Se não há motivos para temer uma explosão dos preços, também está claro que dificilmente o País vai conseguir atingir o centro da meta de 3% nos próximos anos. E o remédio para isso, invariavelmente, se chama aumento de juros – a Selic já está em 10,75% ao ano, e a previsão é chegar próxima dos 12% até o início de 2025, asfixiando novos investimentos produtivos.
Tudo isso somado – o aumento sem trégua dos gastos do governo, atiçando a demanda interna, e a perspectiva de uma inflação ainda fora do centro da meta – leva à conclusão de que estamos diante de mais um “voo de galinha”, expressão que no jargão dos economistas é usada para representar uma economia que começa a andar mais rápido, mas que, por falta de condições estruturais, não consegue ir muito longe e tem de parar outra vez. “São duas forças contrárias: juros reais (acima da inflação) absurdamente altos e uma expansão fiscal enorme”, afirma um banqueiro. Ele compara a atual situação ao sujeito que resolve queimar os móveis da casa para fazer carvão no inverno, mas tem de deixar a janela aberta para não morrer intoxicado pela fumaça. “É o pior dos mundos.”
Há cerca de uma semana, aproveitando viagem a Nova York para a Assembleia-Geral da ONU, Lula e Haddad se reuniram com representantes das três grandes agências internacionais de rating – Moody’s, S&P e Fitch. Segundo Haddad, Lula queria ouvir por que o País ainda mantém grau especulativo se os números da economia – pelo menos, os que eles preferem olhar – vão tão bem. Poucos dias depois, a Fitch divulgou um relatório afirmando que o bom desempenho da economia brasileira nos últimos meses não alivia as incertezas fiscais do País. Se o mercado projeta crescimento de 3% para o PIB neste ano, também já há consenso de que o atual voo de galinha tem pouso marcado para o 2.º ou 3.º trimestres de 2025, quando as fragilidades estruturais da economia devem se tornar mais evidentes. “Assim que o excesso de gastos fiscais passar, e estivermos sentindo os juros que começaram a subir”, conclui outro banqueiro. É pouso certo.