Depois de obter a aprovação parcial do marco fiscal e da reforma tributária, os desafios da equipe econômica continuam elevados e exigindo muita perícia e prudência — especialmente pelo fato de que os acordos com o Centrão não asseguram apoio integral à agenda do governo e porque a própria equipe econômica sofre com o fogo amigo. E, ainda, porque existem bancadas organizadas para proteger suas agendas no Congresso.
Assim, a busca pela receita para financiar o esforço fiscal e alcançar a ousada meta de zerar o déficit primário no Orçamento da União será jornada de elevada complexidade, tanto pelas dificuldades do tema quanto pela variedade de propostas. Algumas matérias já estão em andamento no Congresso Nacional, outras devem ser enviadas em agosto e outras devem aguardar a conclusão da reforma tributária, hoje sob análise do Senado.
O cardápio é variado. Começa com o voto de qualidade do Carf, passando pela tributação offshore e das apostas esportivas e, ainda, as expectativas de arrecadação com a decisão do STJ sobre a cobrança da CSLL (contribuição social sobre o lucro). Existe ainda a intenção de tributar os fundos exclusivos de investimento. Hoje, o recolhimento do imposto de renda ocorre quando é feito o resgate do dinheiro.
“É certo que o cardápio de medidas imaginadas pela equipe econômica para aumentar a arrecadação sofrerá alterações”
Apenas o anúncio da intenção de tributar tais fundos já movimentou mais de 30 bilhões de reais em direção a outros investimentos. Em 2017, o ex-presidente Michel Temer (MDB) editou medida provisória com o mesmo objetivo. Na ocasião, o governo divulgou que iria aumentar a arrecadação em 10,7 bilhões de reais, mas a proposta não foi adiante. Uma das polêmicas é quanto à tributação do estoque desses fundos. Mesmo contra a opinião de Arthur Lira, a equipe econômica ainda pensa na reforma do imposto de renda e na cobrança de tributos sobre dividendos.
O cenário que se apresenta é o de construir apoios às propostas no Legislativo; não se queimar com o fogo amigo; e, ainda, lidar com os movimentos de contribuintes visando a reduzir os custos tributários das iniciativas.
Mesmo com um cenário complexo de desafios fiscais e tributários, o Brasil vive um momento positivo após superar o temor de que os caminhos econômicos do governo fossem incertos e menos previsíveis. Conta a favor do país a resiliência do Banco Central na condução da política monetária e a certeza de que medidas antirreformas não vão prosperar. O vento a favor também vem de fora com exportações e investimentos diretos e especulativos. A melhora da classificação do país pela agência Fitch revela que existem entre os poderes da União e de modo significativo o interesse e o empenho em se construir uma jornada de estabilidade fiscal e de redução de gastos.
Finalizando, é certo que o cardápio complexo de medidas imaginadas pela equipe econômica para aumentar a arrecadação sofrerá alterações na tramitação pelo Congresso Nacional. Existe uma resistência transversal de muitas bancadas de pressão contra um aumento significativo da carga tributária. Porém, a beleza da democracia em funcionamento é a pluralidade de opiniões, o debate civilizado de ideias e o respeito às instituições. Esperamos que tais aspectos prevaleçam no segundo semestre político do país.
Publicado em VEJA de 2 de agosto de 2023, edição nº 2852