Volto a tratar da teoria do custo e da inflação política, destacando a sua natureza transacional. Apoios, movimentos ou ações em favor de alguém geralmente exigem retribuições aos envolvidos na transação, como cargos, verbas e programas do governo. Essa troca implica a existência de crédito político e a capacidade de cumprir com o que foi acertado. Credibilidade é honrar acordos com contrapartidas equilibradas, sem prejudicar o político ou o governo.
Em um cenário adequado, ideias, programas, narrativas e ideologias deveriam prevalecer, mas a realidade política é frequentemente movida por interesses, desconsiderando a ética que sugere um processo baseado apenas em valores e ideais. Mas não funciona assim, sobretudo em um ambiente politicamente fragmentado.
A teoria do custo econômico diferencia valores explícitos (tangíveis e diretos) dos implícitos (perdas de oportunidades, gasto de energia etc.). Similarmente, na teoria que proponho, existem custos explícitos e implícitos. Os primeiros incluem a alocação de recursos e a oferta de vagas na administração pública, enquanto para o político são os benefícios recebidos pelo seu apoio. Os custos implícitos estão ligados ao desgaste de imagem, tanto para o governo, ao ceder verbas e espaços, quanto para o político, ao apoiar propostas polêmicas ou impopulares.
A agenda do próximo ano é politicamente inflacionária no sentido de que vão custar caro os apoios necessários para gerenciar temas complexos. Especialmente se houver um declínio na popularidade do governo.
“O tema mais desafiador será o início do debate sobre as trocas de comando do Congresso”
A pauta política do novo ano é complexa: cumprir a meta fiscal, progredir nas regulamentações da reforma tributária, aumentar a arrecadação, enfrentar questões ambientais, navegar em um mundo turbulento e ainda lidar com as eleições municipais. Sabe-se que aliados vão se enfrentar nas urnas. Integrantes do governo já estão em disputa por causa da corrida eleitoral e é desafiador atender a todas as demandas.
Teremos ainda a escolha do novo presidente do Banco Central, com potencial impacto nas projeções econômicas e do mercado financeiro. Uma escolha infeliz pode agravar as expectativas relacionadas à economia do país e afetar o ânimo de investidores. Lembrando que já em 2023 tivemos um fluxo relativamente baixo de investimentos diretos estrangeiros por causa de incertezas sobre a política econômica.
Porém, o tema mais desafiador será o início do debate sobre as trocas de comando do Congresso. A sucessão, que ocorrerá em fevereiro de 2025, já está em curso com articulações de bastidores que serão intensificadas ao longo do ano. A disputa se revela crítica para o governo, pois os novos líderes do Parlamento vão controlar a agenda legislativa nos últimos dois anos do governo Lula.
Apesar dos acordos e cooptação de apoios no Legislativo, nem a base nem a coordenação política são estáveis o suficiente para assegurar tranquilidade ao presidente. Caso consiga domar os conflitos de aliados, executar os acordos e ter um bom desempenho na economia, Lula terá um grande ano. Não será fácil. Até mesmo pelo fato de que os movimentos de 2024 anteciparão o debate sobre 2026.
Publicado em VEJA de 15 de dezembro de 2023, edição nº 2872