Como qualquer outro segmento, a agropecuária e suas práticas precisam estar em constante mudança para se adaptarem às novas proposições que o macroambiente exige. O setor possui grande potencial para realizar ações que contribuam para a adaptação e mitigação das mudanças climáticas, proteção do meio ambiente, geração de oportunidades às pessoas e desenvolvimento econômico. Foi assim que a produção foi se desenvolvendo ao longo dos anos, com a mudança das práticas produtivas, adoção de tecnologias e até a mudança na forma de pensar as atividades. Vamos conhecer hoje as 5 principais abordagens históricas e apresentar uma nova: a “Agricultura 6.0”.
O histórico das práticas agrícolas teve início com a “Agricultura 1.0” (antes de 1950), marcada pelo uso de métodos rudimentares e tradicionais com uso de mão-de-obra intensiva e tração animal, com a finalidade voltada a abastecer as comunidades locais e os níveis de produtividade eram baixos. Com a transição para a “Agricultura 2.0” (1950), a chamada “Revolução Verde” impulsionou o processo de modernização agrícola com o uso de maquinários. Além disso, um olhar para a ciência possibilitou a criação de tecnologias, defensivos químicos, fertilizantes sintéticos e outros insumos para auxiliar o desenvolvimento das lavouras, o que permitiu uma produção em larga escala.
A “Agricultura 3.0” (década de 1990) foi marcada pelo desenvolvimento da computação e da eletrônica. Os dados começaram a ser utilizados para monitorar as atividades e resultados obtidos no campo. Tecnologias com sinal de GPS, sensoriamento remoto e orientação agrícola foram adotadas para otimizar processos e economizar recursos. Com isso, surgiu também o conceito de “agricultura de precisão”, para demonstrar a vantagem do manejo localizado de insumos, utilizando apenas o necessário, o que costumo chamar de “gestão por m2”.
Já a passagem para a “Agricultura 4.0” (anos 2000) se deu pela evolução de diversas tecnologias digitais, como: redes de sensores, Internet das Coisas (IoT), drones, softwares, processamento de imagens via satélite, computação em nuvem, análise de big data e aplicativos móveis. Nesse momento, os dados passaram a ser analisados por meio de diagnósticos que apoiam a tomada de decisão dos produtores.
Com a ascensão da “Agricultura 5.0” (2010 em diante), o uso da robótica, sistemas autônomos de decisão, redes de sensores sem fio, veículos não tripulados, aprendizados de máquina e algoritmos de inteligência artificial têm sido implementados nos processos de produção. Nessa fase, a chamada agricultura inteligente utiliza as soluções para refinar a análise de informações, aumentar a previsibilidade no campo, aumentar a sustentabilidade e eficiência da produção agrícola, contribuir para o desafio de escassez de mão-de-obra nas propriedades e muitas outras vantagens.
Dado que a evolução tecnológica no campo é contínua, as práticas atuais devem enfatizar o compromisso com o desenvolvimento sustentável e o uso cada vez mais racional dos recursos do planeta. Denominamos essa nova fase de agricultura integradora ou “Agricultura 6.0”, onde as soluções são especializadas e baseadas na natureza, com o objetivo de proteger, gerenciar e restaurar os ecossistemas. As práticas regenerativas são destaque nesse modelo, se apoiando na integração de diversas técnicas como:
- (a) a rotação de culturas;
- (b) sistema de plantio direto na palha;
- (c) uso de culturas de cobertura;
- (d) uso racional de defensivos e fertilizantes químicos;
- (e) aumento do manejo com insumos biológicos e/ou bioinsumos;
- (f) combinação de sistemas produtivos agrícolas, pecuários e florestais, com os sistemas integrados de produção; e muitas outras práticas que aumentam a biodiversidade do sistema, melhoram a qualidade do solo e causam impactos positivos no meio-ambiente.
A “Agricultura 6.0” também enfatiza a economia circular, que visualiza o fluxo produtivo de forma cíclica e reduz o desperdício de resíduos, substituindo o descarte por reutilização, além de reduzir o descarte inapropriado e contaminação dos ecossistemas. A bio-revolução também é destaque, com técnicas de biologia sintética, engenharia genética e pesquisa de microrganismos multifuncionais, os quais exercem influência positiva em diversas necessidades do campo. Novas soluções em biocombustíveis e bioenergia estão sendo desenvolvidas e aprimoradas, como o biogás, hidrogênio verde, SAF (combustível sustentável de aviação), entre outras. O mercado de créditos de carbono está cada vez mais forte e demonstrando um enorme potencial para o Brasil. A intensificação produtiva utilizando uma mesma área também é observada a partir do maior uso de diversas tecnologias. E, por fim, existe um crescimento da convergência colaborativa entre as áreas por toda a cadeia produtiva, com uma visão mais holística e integrada dos problemas do setor.
Todos os pontos anteriores constituem o que chamamos de “Agricultura 6.0”. Esse modelo integrador permite um olhar para o futuro da produção de alimentos, não apenas com a visão de aumentar a produção, mas de fazê-lo de forma responsável, consciente, respeitando os recursos e garantindo o futuro das gerações que vem por aí.
Marcos Fava Neves é professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP (Ribeirão Preto – SP) da FGV (São Paulo – SP) e fundador da Harven Agribusiness School (Ribeirão Preto – SP). É especialista em Planejamento Estratégico do Agronegócio. Confira textos e outros materiais em harvenschool.com e veja os vídeos no Youtube (Marcos Fava Neves). Agradecimentos a Vinicius Cambaúva e Beatriz Papa Casagrande.