A revolução tecnológica na agricultura tornou-se peça fundamental para enfrentar os desafios contemporâneos da produção de alimentos em escala global: maior demanda devido à uma população cada vez maior e os impactos climáticos na agricultura. Nesse contexto, a biotecnologia surge como um protagonista, moldando e aprimorando as práticas agrícolas de maneira inovadora. Representa a aplicação prática de conhecimentos da biologia, química e tecnologia para aprimorar a produção de alimentos e otimizar o uso de recursos. Essa abordagem multidisciplinar permite que cientistas desenvolvam e agricultores explorem mais o potencial genético das plantas.
Quando se fala de biotecnologia, também se pode ouvir o termo “melhoramento genético”. Apesar de estarem intrinsicamente ligados, esses dois conceitos possuem definições e aplicações distintas. O melhoramento genético visa aprimorar características através de seleção natural ao longo do tempo. Já a biotecnologia realiza manipulações diretas no DNA em laboratório, criando organismos geneticamente modificados (OGMs) ou transgênicos, para proporcionar características específicas.
Mas, afinal, o que é transgenia? Um organismo transgênico, ou organismo geneticamente modificado, nada mais é do que o resultado de um processo controlado em que ocorre a transferência do material genético de uma espécie para outra. Essa prática permite aos pesquisadores selecionar e incorporar genes de interesse em plantas ou culturas, conferindo-lhes propriedades desejáveis.
A aplicação da biotecnologia vem oferecendo uma gama de benefícios para o setor alimentar. Dentre eles, destacam-se:
- 1) o aumento de produtividade e proteção do potencial produtivo por meio da modificação genética;
- 2) a redução do uso de insumos e consequente redução dos custos de produção, uma vez que produtos modificados podem oferecer maior resistência a pragas e doenças;
- 3) a melhoria na qualidade final dos produtos, sendo possível alterá-los geneticamente para enriquecer o valor nutricional;
- 4) cultivares mais resistentes à secas e temperaturas extremas, uma vantagem significativa para combater os desafios climáticos existentes;
- 5) maior facilidade no manejo integrado com químicos.
O Brasil, podemos falar da soja “Roundup Ready” (ou soja RR), que é tolerante ao herbicida glifosato, facilitando o controle de plantas daninhas. Também na soja, a tecnologia “Intacta” inclui genes capazes de alterar o organismo de insetos que se alimentam destas plantas, proporcionando o controle de pragas e redução no uso de produtos químicos. Na cana, pesquisas em biotecnologia possibilitaram a produção de cultivares resistentes a pragas como a broca da cana, que acomete os canaviais. Na produção animal, há décadas já são utilizadas biotécnicas de reprodução que visam potencializar a eficiência reprodutiva, como a inseminação artificial. Posteriormente, novas biotecnologias na área reprodutiva foram surgindo, como exemplo da transferência de embriões in vivo e fertilização in vitro.
Um estudo da CropLife e AgroConsult mostrou que o uso de transgênicos na agricultura brasileira gerou renda extra de R$ 143,5 bilhões desde o primeiro uso, há 25 anos. Esta renda foi distribuída em toda a cadeia produtiva, atingindo também benefícios de preços ao consumidor final. Para seguir estimulando o desenvolvimento do setor, fundos de investimento destinaram US$ 35 bilhões para startups do setor de biotecnologia entre 2019 e 2021, abrangendo as subcategorias de saúde humana, agropecuária, bioenergia, meio-ambiente e outros.
Não há evidências científicas consistentes que indiquem que alimentos transgênicos aprovados para consumo representem riscos significativos à saúde humana. Vale ressaltar que a adoção dessas tecnologias é acompanhada por rigorosos processos regulatórios, além de pesquisas contínuas e comunicação transparente, sendo acompanhados de forma minuciosa pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, a CTNBio e seus pares em outros países.
Biotecnologias proporcionam maior produtividade das lavouras, reduzindo a demanda por novas áreas; reduzem o uso de químicos no ambiente; e possibilitam redução de custos, maiores margem e agregação de valor. Não há como ter desenvolvimento sustentável na produção de alimentos e a atingir segurança alimentar global sem uso da biotecnologia.
Marcos Fava Neves é professor Titular (em tempo parcial) das Faculdades de Administração da USP (Ribeirão Preto – SP) da FGV (São Paulo – SP) e fundador da Harven Agribusiness School (Ribeirão Preto – SP). É especialista em Planejamento Estratégico do Agronegócio. Confira textos e outros materiais em harvenschool.com e veja os vídeos no Youtube (Marcos Fava Neves). Agradecimentos a Vinicius Cambaúva e Rafael Rosalino.