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Xi Jinping paz e amor: ele fala baixinho e leva um porrete bem grande

Com o fim, ou suspensão, da agressiva diplomacia do lobo guerreiro, o líder chinês desfruta discretamente de Rússia e Estados Unidos enfraquecidos

Por Vilma Gryzinski 17 mar 2023, 08h02
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  • Falar grosso, agressivamente, tentando imitar o estilo do chanceler russo, Serguei Lavrov, foi uma fase recente da diplomacia chinesa cujos resultados estão sendo reavaliados. Para não mencionar que uma plateia indiana simplesmente riu da cara do desmoralizado Lavrov quando ele disse, achando que ia abafar, que a Ucrânia havia agredido seu país.

    Os chineses gostam de emular coisas que dão certo, não as que dão errado, o que deveria servir de lição de vida aos candidatos a imitadores.

    A nova orientação é usar um tom mais ameno, compatível com uma diplomacia que pretende projetar a China como modelo para o mundo não desenvolvido. E se for para imitar o que deu certo, nada melhor do que Teddy Roosevelt com sua conhecida política da fala mansa apoiada por um big stick (lembrete aos que ainda entram em surto ao falar em imperialismo americano: depois da Casa Branca, o presidente, um dos quatro esculpidos no Monte Rushmore, inclinou-se à esquerda).

    Os discursos recentes de Xi Jinping, tranquilamente instalado num sem precedentes terceiro mandato como imperador vermelho, são um exemplo primoroso dessa política paz e amor.

    “A modernização ao estilo chinês não segue o velho caminho da exploração colonial ou da hegemonia dos países fortes”, disse ele ontem num discurso por vídeo a líderes simpatizantes. Tradução: somos uma opção muito melhor do que os Estados Unidos e não ficamos falando de coisas chatas como direitos humanos e defesa das minorias.

    Como tudo na China, essa política tem um nome, a “iniciativa pela civilização global”.

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    Outro recado com endereço conhecido: “Os países precisam manter a mente aberta para a percepção dos valores de diferentes civilizações e evitar impor a outros seus próprios valores ou modelos e incitar confrontos ideológicos”.

    No papel, os princípios defendidos por Xi são incontestáveis: paz, desenvolvimento, igualdade, justiça, democracia e liberdade. Parece um dos pais da pátria americanos.

    Até em relação a Taiwan, a ilha cuja anexação parece cada vez mais inevitável, o tom tem sido deliberadamente menos agressivo. O que não muda uma vírgula da expansão marítima chinesa em todo o Pacífico com uma frota de navios de guerra novinhos em folha – a parte do porrete grande.

    A China está incorporando novos armamentos a um ritmo cinco ou seis vezes maior do que os Estados Unidos. Em fevereiro, especialistas em defesa calcularam que o país já tem mais lançadores de mísseis balísticos intercontinentais – o maior porrete que existe no mundo – do que os americanos.

    A cúpula chinesa sabe que o momento é delicado, com o acobertamento da origem da Covid-19 ainda não totalmente consolidado e crises das quais a China pode se beneficiar ou sair chamuscada.

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    Uma Rússia enrascada na Ucrânia é bom para o líder chinês, que tem um gigantesco e geologicamente privilegiado vizinho cada vez mais dependente, e melhor ainda são os Estados Unidos em surto de bancos podres – mas não tão grave que afete as finanças chinesas.

    A visita dele a Moscou na próxima segunda-feira é um sinal de que Xi se sente seguro o suficiente para aparecer ao lado de Vladimir Putin sem ser enlameado pela reputação do tirano russo. Outra prova de confiança: a China pilotou, à nova maneira discreta, a reaproximação entre a Arábia Saudita e o Irã, dois inimigos religiosos e ideológicos. Foi uma manobra tremendamente importante que marcou uma guinada geopolítica no Oriente Médio sem participação dos Estados Unidos.

    Os regimes ressentidos com os americanos estão em polvorosa, imaginando a nova ordem mundial em que os chineses dão mais cartas. A autorização do governo Lula para que dois navios de guerra do Irã ancorassem no Rio de Janeiro faz parte dessa agitação.

    A cúpula do G20, com participação de Putin, e a visita do presidente brasileiro à China se tornam palcos mais interessantes à luz desses novos desdobramentos. O risco é que tenha gente imaginando pegar carona na nova ordem global e acabar descobrindo que continua a fazer parte da turma da desordem – uma situação sempre vista pelos chineses com o mais absoluto desprezo.

    E comitiva de 39 parlamentares, nem na Conchinchina. Os anfitriões se desdobrarão em gentilezas, mas estarão dando risada por dentro.

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