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Um Trump intelectualizado: ele fala e a direita europeia escuta

Primeiro-ministro húngaro é o mais articulado representante do populismo nacionalista e anti-liberal em ascensão

Por Vilma Gryzinski Atualizado em 5 dez 2016, 11h21 - Publicado em 1 out 2016, 20h45
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  • Bom de discurso e de simbologia: Orban ganhou plataforma com repúdio à migração em massa

    Bom de discurso e de simbologia: Orban ganhou plataforma com repúdio à migração em massa

    Os húngaros vão votar amanhã para decidir um assunto que nem existe mais: as cotas de imigrantes que cada país da União Europeia deveria receber. A decisão de criar números obrigatórios foi tão mal recebida que nem se fala mais no assunto.

    Também há poucas dúvidas sobre o resultado do referendo: a política de cotas será rejeitada. Há pesquisas que mencionam até 80% de votos contra, uma vitória formidável para o homem que convocou a eleição, o primeiro-ministro Viktor Orban, já prevendo seu resultado.

    Muitos países têm políticos que comparam a Donald Trump. Orban já foi chamado de Trump húngaro, o que revela excesso de simplificação e falta de informação. Ele é muito melhor do que Trump, no sentido de que sabe articular com precisão intelectual e pendor mais embasado à provocação as ideias da nova direita europeia.

    Esses partidos em ascensão são nacionalistas, contra abrir fronteiras a estrangeiros muçulmanos e africanos, anti-americanos e anti-União Europeia e, na maioria, simpáticos ao neo-imperialista russo Vladimir Putin. Orban resume sua ideologia como “democracia não-liberal”, no sentido do liberalismo político e econômico clássico.

    “O mais popular tema do pensamento político hoje é tentar entender como sistemas que não são ocidentais, nem são liberais, nem democracias liberais e talvez nem sejam democracias, possam predominar em países bem sucedidos”, disse ele em entrevista ao Politico Dá como exemplos, além da Rússia putinista, a Turquia de Recep Erdogan, além de Cingapura e China.

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    Orban está no poder há mais tempo e é mais carismático do que os políticos com quem tem afinidade ideológica na Europa Oriental, como o primeiro-ministro da Eslovaquia, Robert Fico, e Jaroslaw Kascynski, líder do partido da Lei e da Justiça, majoritário na Polônia.

    Tem mais estofo intelectual do que Marine Le Pen, na França, e mais gravitas do que Geert Wilders, na Holanda. Depois da vitória do Brexit, o espaço dessa nova direita na Grã-Bretanha foi simplesmente abandonado pelo peso levíssimo Nigel Farage.

    A rejeição às elites globalizadas e ao modelo que predominou nas últimas décadas, de livre comércio, enfraquecimento do estado-nação e consolidação de instituições supranacionais, é o que move essa nova direita, populista e quase situada no extremo do espectro político.

    Muitos analistas acham que é uma ironia que países como Polônia e Hungria, mais beneficiados pela vitória do modelo americano, indutor da derrota pacífica do comunismo ao estilo soviético na Europa, e agraciados com as vantagens da União Europeia, agora se insurjam contra seus salvadores.

    Alguns atribuem isso à falta de tradições democráticas, ao excesso de bagagem histórica – geralmente do lado perdedor – e até a um apego antiquado às raízes cristãs. Orban, que é da minoria protestante na Hungria, utiliza muito bem a simbologia da resistência cristã às invasões muçulmanas do passado para caracterizar as ondas migratórias do presente como uma nova forma de ocupação.

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    Orban já foi chamado de “subversivo conservador”, líder da contra-revolução em curso na Europa e de Darth Vader da política húngara, um “jovem idealista destinado a salvar a galáxia” que, tal como o vilão originalmente nobre de Guerra na Estrelas, tornou-se “um liberal tão frustrado com o liberalismo que se revoltou contra ele” – segundo a Foreign Policy.

    A imagem de jovem idealista surgiu quando o regime comunista estava no fim, mas ainda era perigoso aparecer, como ele, de cabelo desarrumado e barba por fazer, defendendo a democracia. Ao caminhar para a direita, a Aliança da Juventude Democrata, Fidesz em húngaro, perdeu outros dirigentes e ganhou votos.

    O repúdio muitas vezes silencioso às ondas humanas que bateram na Europa nos últimos anos, que atingiram o ápice com a agora recuada política alemã de fronteiras abertas, deu a Orban o lugar na plataforma internacional que ele ocupa hoje.

    Quando Viktor Orban fala – e ele fala bem, com um estilo refinado, agressivo e engraçado ao mesmo tempo -, muita gente escuta, muito além das fronteiras da Hungria. Pode ser um perigo, pode ser um aviso, pode ser mais um capítulo da eterna história em que Anakin Skywalker e Darth Vader se repelem e se atraem ao mesmo tempo.

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