Uma campanha criada pela Faculdade Zumbi dos Palmares e lançada esta semana na internet quer reparar um erro na iconografia de um dos maiores escritores brasileiros, Machado de Assis (1839-1908). Negro, foi retratado em pinturas como um homem branco – e esses retratos se reproduziram, e continuam a se reproduzir, nas orelhas de seus livros. A campanha Machado de Assis Real modificou um dos retratos mais conhecidos do escritor e propõe, agora, que os leitores imprimam a imagem e a coloquem sobre as fotos antigas do autor em seus livros.
“O racismo no Brasil escondeu quem ele era por séculos”, diz o texto da campanha. “Sua foto oficial, reproduzida até hoje, muda a cor da sua pele, distorce seus traços e rejeita sua verdadeira origem. Machado de Assis foi embranquecido para ser reconhecido. Infelizmente. Um absurdo que mancha a história do país.”
“Uma foto do Machado de Assis real está disponível aqui no site, para ser colada sobre a foto antiga, preconceituosa”, continua o texto. “Uma errata histórica feita para impedir que o racismo na literatura seja perpetuado. Para encorajar novos escritores negros. Para dar a chance de a sociedade se retratar com o maior autor do Brasil.”
Também faz parte da campanha um abaixo-assinado online que pede que as editoras troquem a antiga imagem de Machado de Assis por essa nova versão. “Criamos este abaixo-assinado para que as editoras e livrarias deixem de imprimir, publicar e comercializar livros em que o escritor aparece embranquecido e substitua a imagem preconceituosa pela foto de Machado de Assis Real”, diz a petição. A meta é chegar a 7.500 assinaturas – até o momento, são mais de 5.200 apoios.
A discussão sobre o branqueamento de Machado de Assis em retratos não é nova e foi, inclusive, intensificada em 2018, depois da descoberta do pesquisador independente Felipe Pereira Rissato do que parece ser a última fotografia em vida do escritor. “Estampado na revista argentina Caras y Caretas, no ano de sua morte, o Machado de corpo inteiro é um homem evidentemente negro”, diz reportagem de VEJA publicada à época. “Trajado com perfeição, a barba e o bigode irretocáveis, apresentado como ‘presidente de la Academia de la Lengua Brasileña’. Ainda assim, ou por isso mesmo, esse instantâneo afro-brasileiro rompe com o modelo ático legado à posteridade. No improviso da tomada da foto se revela o racismo que hoje em dia felizmente se tornou inaceitável.”