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TSE decidirá se atuação das igrejas fere direito ao voto livre

Edson Fachin defende freio ao “abuso do poder religioso”; ministro Tarcísio Vieira, que pediu vista, informa à coluna que julgamento será retomado em agosto

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 7 jul 2020, 12h05 - Publicado em 7 jul 2020, 11h19

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) voltará a julgar o caso que pretende incluir o “abuso de poder religioso” como motivo para a cassação de mandatos políticos, punição hoje restrita ao abuso de poder econômico e político. O ministro Tarcísio Vieira, que pediu vista, confirmou à coluna que irá submeter o processo a julgamento em agosto. “Sim, eu pedi vista e já estou estudando a delicada matéria em meu recesso do TSE. A minha ideia é submeter o processo a julgamento o quanto antes, logo no início do mês de agosto”, afirmou.

O caso tem gerado preocupação e até revolta entre os fiéis do bolsonarismo, já que o apoio das igrejas, especialmente as evangélicas, foi importantíssimo para a eleição do presidente Jair Bolsonaro em 2018. Grupos pentecostais têm indicado nomes para a ocupação de postos-chave no governo. Isso sem contar o crescimento das bancadas evangélicas nos legislativos a nível federal, estadual e municipal.

A ação julga recurso que discute a cassação do mandato da vereadora Valdirene Tavares dos Santos, eleita em 2016 no município de Luziânia, em Goiás. Pastora, ela é acusada de praticar abuso de poder religioso durante a campanha ao promover suposta reunião no templo de sua igreja, inclusive com apoio de outros pastores da região, para pedir votos aos fiéis. Para o Ministério Público, a pastora de Luziânia utilizou de sua condição de autoridade religiosa para influenciar a escolha dos eleitores e intervir no direito constitucional da liberdade de voto. 

A prática não é incomum até em eleições majoritárias, quando líderes religiosos passam a pedir aos fiéis votos em candidatos que levantem bandeiras conservadoras. Em seu parecer sobre o caso, o ministro Edson Fachin ampliou o debate e levantou a questão do abuso de poder religioso. O magistrado afirmou que “a imposição de limites às atividades eclesiásticas representa uma medida necessária à proteção da liberdade de voto e da própria legitimidade do processo eleitoral, dada a ascendência incorporada pelos expoentes das igrejas em setores específicos da comunidade”. 

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Fachin tem razão. Igrejas, especialmente as evangélicas, exercem, através da figura do pastor, uma influência excessiva na vida daqueles que são considerados “discípulos”. Frutos da reforma protestante iniciada em 1517, primeiro movimento a defender a separação entre a igreja e o Estado, as comunidades evangélicas, em amplo crescimento no Brasil, negam a sua própria raiz ao ingressarem na disputa político partidária. Negam também uma das principais bandeiras do modo de vida ocidental ao tentarem influenciar a sociedade usando a força do estado, e não o poder da fé. 

O julgamento ainda estuda o caso e não chegou a qualquer conclusão. Mas a análise da matéria gera, em contrapartida, outra tipo de preocupação entre os membros da corte. “De minha parte, tenho preocupação com a cientificidade do Direito Eleitoral. Uma nova categorização de abuso, no caso, o do poder religioso, pode em tese deflagrar novas infinitas categorizações, fora das balizas legais, referidas a apenas três categorias de abuso de poder: econômico, de autoridade e dos meios de comunicação. Ainda estou estudando a matéria, mas a minha principal inquietação, sem antecipar qualquer conclusão, é essa”, afirmou o ministro Tarcísio Vieira à coluna.

As igrejas e o bolsonarismo se misturaram na última eleição sob a justificativa de que era preciso travar uma guerra cultural contra a “influência marxista”, que tem sido, na avaliação deles, vitoriosa em seus objetivos nas últimas décadas no Brasil. A vereadora não deve perder o mandato – ela obteve dois votos contrários à punição no julgamento até aqui -, mas apenas por falta de provas. O debate levantado pelo TSE, contudo, chega em boa hora e é essencial. Usando o nome de Deus, pastores pedem muitas vezes votos a determinados candidatos. É preciso criar, de uma vez por todas, um limite eleitoral: púlpito nunca pode ser palanque. E vice-versa.

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