Ao contrário do que previam estudiosos e pensadores da chamada teoria clássica da secularização, a religião não combaliu. Amparados nos avanços da Ciência e da tecnologia, muitos cientistas sociais da era moderna acreditavam que a dimensão religiosa não vingaria. Em “A Gaia Ciência”, o filósofo alemão Friedrich Nietzsche parecia descrever esse espírito apontando para aquilo que chamara de “morte de Deus”. Para o Nietzsche a descrença era uma “nova aurora” que iluminaria os homens de sua época.[1]Entretanto, mesmo em meio a todo esse processo a religião não se extinguiu, contrariando todas as expectativas.
O teólogo presbiteriano Timothy Keller, descreve um fenômeno atual que tem ocorrido nos Estados Unidos, Europa e Brasil: o simultâneo aumento do ceticismo e crescimento da religião. Conforme Keller, “tanto a fé quanto o ceticismo estão em alta”.[2] Conforme o estudo Valores dos Brasileiros, 96% da população citou fé e esperança como princípios essenciais de suas vidas. No Brasil, a população geral se torna cada vez mais religiosa. Um levantamento recente conduzido pelo Instituto alemão Bertelsmann Stifung analisou a religiosidade de 21 países e concluiu que o Brasil tem a terceira população religiosa do mundo, ficando atrás apenas da Indonésia e Marrocos, países de maioria islâmica.
A busca pela dimensão religiosa tem crescido no Brasil e no mundo, pois os indivíduos que vivem neste momento histórico são dominados por uma latente procura por sentido existencial e por evolução pessoal. As experiências de fé hoje são as mais diversas e se dão, com grande frequência, fora dos âmbitos institucionais da religião organizada. De meditação transcendental a conexão direta com a natureza, muitos estão expressando sua espiritualidade com mais frequência e longe de dogmas e ritos.
Diante deste cenário religioso que se descortina no mundo e especialmente no Brasil, surge uma importante questão: Como será a relação dos brasileiros com a religião nos próximos anos? Ao que tudo indica, a população brasileira continuará cada vez mais religiosa, porém, experimentará uma baixa institucionalidade em sua prática de fé. Penso que a religião organizada sofrerá mudanças radicais nas próximas décadas, com a atualização das suas visões institucionais, modos de atuação e comunicação. Elas se tornarão muito mais abertas, flexíveis e igualitárias em suas estruturas e organizações, visto que os futuros líderes religiosos serão muito mais espiritualizados e cada vez mais desistitucionalizados.
* Rodolfo Capler é teólogo, escritor e pesquisador do Laboratório de Política, Comportamento e Mídia da Fundação São Paulo-PUC-SP
[1] NIETZSCHE, Friedrich. A gaia ciência. In: Os pensadores, v. 32. São Paulo (SP): Abril Cultural, 1973.
[2] KELLER, Timothy. A fé na era do ceticismo. São Paulo: Vida Nova, 2015, p.21.