Era eu naquele 1º de maio de 1994. Era eu, somente eu, sentado em frente à televisão. Aguardava ansiosamente Ayrton Senna, que iria correr e vencer. Esse era o plano de um domingo há exatos 30 anos.
Minha mãe, meu padrasto e meus irmãos dormiam em uma casa simples, mas aconchegante no Rio de Janeiro. Logo que acordei fui à padaria, tomei café da manhã e nada da corrida de Fórmula 1 começar.
Havia tensão no ar com um acidente fatal dois dias antes. Nunca tinha sido tão difícil correr como naquele domingo, há 30 anos.
E eu estava ali vendo a televisão, esperando. Ayrton era capaz de gerar esse magnetismo que poucas coisas são capazes de proporcionar. Pelo menos para mim, ficar em frente à TV não faz parte da minha vida.
Naquele tempo – naquele momento exato, inclusive -, eu sentia como se o Brasil todo pudesse ter jeito. Hoje tenho muito mais dúvidas do que certezas.
Aliás, horas depois do início daquela fatídica corrida e daquela terrível curva que nunca mais direi o nome… passaria a ser bem mais pessimista com a vida.
Meu amor pelas corridas também acabaria. Havia aprendido com um tio chamado Ricardo Leitão, brilhante advogado trabalhista em São Paulo, que corridas eram instigantes e a competição também.
O vazio deixado pelo Ayrton foi gigantesco. Nunca fui muito chegado a heróis. Mas se houve um em minha vida, era ele: o Senna.
Quando a corrida começou eu estava com a barriga cheia e segurava um copo de suco de laranja – amarelo como o capacete do piloto que eu acreditava que sairia vitorioso.
Não aconteceu. Nunca mais aconteceria. Não sentiria nunca mais aquilo que tanto adorava em um domingo de sol, por alguns anos sempre ao lado de Ricardo, que havia morado conosco.
A batida, em um primeiro momento, foi suficiente apenas para eu me entristecer com o fato de que não haveria música, não haveria pódio ou a alegria dominical que me deixava exultante desde muito novo.
Mas o terror de perdê-lo começou a crescer enquanto eu, assustado, via uma poça de sangue, o corpo imóvel, a narração contida do Galvão e o carro bastante destruído em um dos lados.
Não fazia sentido pra mim a possibilidade daquela morte. Eu achava que Ayrton era imortal, assim como o sentimento de que era uma questão de tempo para o Brasil se tornar o país ideal para se viver, como dito por Vladimir Maiakovski. “Dizem que em algum lugar, parece que no Brasil, existe um homem feliz”.
Era eu descrito pelo poeta russo. Ao menos até aquele dia, apesar de nem ser homem ainda mas apenas um adolescente esperançoso. O resto da história todos sabem. O Brasil ficou sem Senna.
Quando a notícia chegou, eu já havia acordado todos os familiares que viam, atônitos, a morte do maior piloto de todos os tempos.
Eu queria sumir, desaparecer, me tranquei no banheiro e fui tomar banho enquanto chorava. A situação ficou tão ruim que meu pai me ligou e pediu para eu reagir.
Eu estava com ingresso para o Flamengo e Vasco no Maracanã, também naquele domingo há 30 anos. Disse a meu pai que não iria mais. Marcelo brigou, me fez prometer que eu iria.
A arquibancada de cimento do templo do futebol, então, viu o que nunca se havia visto. Torcedores rivais, flamenguistas e vascaínos, cantando num uníssono “ole ole ole olá, Sennaaaaa, Sennaaaaa”.
Era o triste um minuto de silêncio. Em meio à tristeza, cantei como se não houvesse amanhã e até tive um pingo de esperança de novo sobre a vida, agora diante de outro inesperado. Mas essa é uma outra história!
Obrigado, Ayrton Senna do Brasil!