A hipocrisia (e o cinismo) na vacinação de crianças em Gaza
Governo de Israel admite morte de crianças por arma de fogo ou explosão, mas, por doença contagiosa, prefere evitar
Na história das guerras, alguns episódios têm o condão de revelar “novamente” certa hipocrisia que, de tão evidente, acabou invisível. No último final de semana, Israel suspendeu por três dias o conflito armado, para permitir a vacinação de crianças palestinas contra a poliomielite. Outra pausa humanitária está prevista daqui a um mês, para a aplicação da segunda dose. Nesse intervalo, bombas continuarão caindo normalmente sobre a Faixa de Gaza.
A preocupação da ONU, que disponibilizou 1,2 milhão de doses de vacina, deve-se ao fato de a moléstia ter ressurgido no território palestino, depois de 25 anos. E Israel decidiu colaborar: afinal, os menores de Gaza podem até morrer por explosão, arma de fogo ou qualquer outra violência – mas, por poliomielite, convém evitar.
E o motivo é simples: a vulnerabilidade dos filhos de judeus ultraortodoxos, cujos pais, de inclinação antivacina, não autorizaram que se imunizassem. Ou seja: ao estender a mão aos palestinos, o que o governo de Israel pretende é proteger a própria população – em um exemplo claro de que, em massacres, não existe concessão desinteressada.
Na verdade, não se trata nem de hipocrisia, pois as verdadeiras razões foram expostas pela imprensa de Jerusalém para justificar a bandeira branca. O caso é um cinismo clássico – mais um da política de Benjamin Netaniahu. De quem não se furta de manejar a vida do outro por gozar da impunibilidade.