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Por José Benedito da Silva Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
A política e seus bastidores. Com Laísa Dall'Agnol, Victoria Bechara, Bruno Caniato, Valmar Hupsel Filho, Isabella Alonso Panho e Ramiro Brites. Este conteúdo é exclusivo para assinantes.
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Deltan: Não tem 30 deputados comprometidos com o básico para mudar o país

Ex-chefe da Lava-Jato em Curitiba, ex-procurador, que tenta se eleger deputado com a bandeira anticorrupção, diz que o país precisa de um novo Congresso

Por Rosana Felix
6 jun 2022, 12h32

Um dos principais cabeças da Lava-Jato, Deltan Dallagnol, o ex-coordenador da força-tarefa da operação em Curitiba — a mais produtiva e a mais barulhenta da maior iniciativa anticorrupção da história do país –, estreia na política como candidato a deputado federal pelo Paraná. Apesar dos reveses recentes sofridos por ele e pela investigação que comandou, ele se orgulha do trabalho realizado, tanto que a luta contra a corrupção é o seu principal tema de pré-campanha, como mostrou reportagem de VEJA na edição desta semana.

Filiado ao Podemos desde dezembro de 2021, ele tem viajado pelo país apresentando o Projeto 200+, que busca convencer a sociedade civil a eleger deputados e senadores comprometidos com três pontos: combate à corrupção (com o fim do foro privilegiado e prisão em segunda instância); redução ou extinção do fundo eleitoral; e preparação política para debater assuntos relevantes ao país.

Além da luta anticorrupção, o ex-procurador empunha outra bandeira com potencial para angariar muitos seguidores e até eleitores em outubro: políticas públicas para crianças com autismo. Envolvido com o tema a partir de um diagnóstico na família, ele contou a VEJA que ficou indignado com a diferença nos tratamentos bancados por planos de saúde e pelo Sistema Único de Saúde (SUS) – que é zero. O tema tem aparecido em suas redes sociais por meio de lives e conversas com especialistas da área, e vai virar assunto na campanha.

Em meio a uma agenda concorrida, entre entrevistas a rádios e palestras em centros universitários, Deltan conversou com VEJA por telefone, durante um trajeto entre Maringá e Londrina, no interior do Paraná.

O senhor está gostando de fazer campanha política? Nunca sonhei em ser político. Tenho vocação de serviço público, e hoje vejo na política o caminho necessário para as mudanças que almejo no país: redução da corrupção, promoção da prosperidade, reforma administrativa, reforma tributária, compaixão, cuidado com as crianças. Quero ser uma pessoa muito preparada para dar uma resposta de alto nível para esses assuntos, a partir de estudos, dedicação. Cresço muito com os contatos que estou fazendo, com os aprendizados que estou tendo, estudando sobre finanças públicas, por exemplo, e ouvindo as demandas da sociedade. O que eu for fazer, seja o que for, será sempre com senso de propósito, a partir da minha visão de mundo cristã. Mas se perguntar se era um sonho, um objetivo de vida, digo que nunca foi. Se o sistema tivesse dado uma resposta adequada para o problema da corrupção, eu ainda estaria no Ministério Público.

Acha que conseguirá fazer diferença na política, com esse sistema que temos, com os políticos que temos no Brasil? Acredito que pessoas precisam dar esse passo à frente se queremos mudar essa realidade. Reconheço que uma pessoa sozinha não vai fazer diferença, vai ser uma voz pregando no deserto. Por isso tenho apoiado de forma muito intensa o projeto para levar mais de 200 deputados e senadores de diferentes partidos para o Congresso que tenham o compromisso do combate à corrupção, defendendo a prisão em segunda instância e o fim do foro privilegiado, que tenham o compromisso com a capacitação política e redução em 2/3 ou extinção do fundo eleitoral. É um projeto que foi lançado por entidades suprapartidárias, que é conhecido como “200+”. Entendo que a mudança no Brasil depende de um novo Congresso, com esses compromissos básicos. Que são básicos, mas se passar hoje uma régua, não encontra 30 que preencha esses requisitos. E seria um grande passo para um Congresso melhor. Não importa quem as pessoas queiram para presidente, se não houver um Congresso, bom vai ficar refém de negociata, fisiologismo, do toma lá e dá cá.

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Quem o senhor irá apoiar para presidente? Eu não tenho falado para a campanha para presidente porque polariza. Há algo com o qual todos concordamos, que são esses requisitos básicos para o Congresso Nacional, porque não temos congressistas preparados para discutir educação, saúde, reforma tributária, microempresa. Não temos pessoas lá que estejam preparadas para os desafios do país. Todos nós queremos o combate à corrupção, fim do foro privilegiado, a grande maioria dos brasileiros quer a prisão em segunda instância. A imensa maioria dos brasileiros quer a redução ou extinção do fundo eleitoral, que passou de 2 bilhões de reais para 5 bilhões de reais. Isso não é só problema em termos de valor, mas é algo que provoca o engessamento da política. Quando você tem um fundo bilionário, a classe política não é renovada. Quem escolhe quem vai ser eleito são os caciques, sem democracia interna. Eu quero ver um país melhor e uma condição para isso é um Congresso melhor e quero lutar por isso. Por isso estou viajando para vários lugares do Brasil.

“A mudança no Brasil depende de um novo Congresso, com esses compromissos básicos (combate à corrupção, redução do fundo eleitoral e capacitação política). Que são básicos, mas se passar hoje uma régua, não encontra 30 que preencha esses requisitos”

Como político, o senhor terá foro privilegiado. O que acha disso? Para mim, é ruim ter foro privilegiado. Eu não quero ser julgado pelo STF, não quero ser julgado pelo Gilmar Mendes, não quero ser julgado pelo Ricardo Lewandowski, pelo Dias Toffoli. Eu quero ser julgado por um juiz técnico de primeira instância. Se algum dia eu for a julgamento por qualquer razão, eu confio na primeira instância, que é técnica e concursada. O STF tem ministros muito bons, mas tem ministros que se portam contra o combate à corrupção e, ao meu ver, têm tomado decisões absolutamente equivocadas, demonstrado ódio aos procuradores da Lava-Jato e nem poderiam estar julgando. Eu vou continuar defendendo as mesmas bandeiras, mas só agora eu tenho a obrigação de me manifestar sobre os mais variados temas porque o eleitor tem direito de saber.

O cenário mudou muito nos últimos anos, de uma época em que houve até estreia no cinema de filme com procurador e juiz tratados como heróis nacionais, para um momento de muito reveses contra a Lava-Jato. O que mudou no Brasil de lá para cá? É a mesma coisa que mudou na Itália, na Romênia e na Grécia. Sempre que há ação forte contra o sistema corrupto, há uma reação muito forte. Na Romênia, a Laura Kovesi (procuradora que comandou ação anticorrupção no país) liderou o processo contra parlamentares, ministros de estado, primeiros-ministros e depois foi alvo de investigações por corrupção. Na Grécia, a (procuradora) Eleni Raikou também revelou corrupção da alta política, e ela também sofre investigações agora. Na Itália, depois da Operação Mãos Limpas, fizeram mais de 100 investigações contra o magistrado Antonio Di Pietro. Mas o apoio popular não diminuiu, porque a população entende o que está acontecendo. As pesquisas que saíram nos últimos anos mostram que mais de 80% da população ainda apoia a Lava-Jato e que a população tem a percepção de que há uma reação política contra a operação. O sistema político organizado está reagindo, e se formou uma maioria no Supremo, com a resistência heroica de alguns ministros, que está esvaziando o combate à corrupção, em grande medida derrubando no tapetão condenações como quando mudam da Justiça Federal para a Eleitoral investigações sobre corrupção relacionada à caixa dois, e fazem a aplicação retroativa dessa regra.

A saída do ex-juiz Sergio Moro do Podemos tira a força do movimento contra a corrupção no seu partido? Não vejo isso. Vejo que a mudança tem que ser suprapartidária, com pessoas comprometidas que tenham compromissos básicos listados pelo 200+. Não acredito que a mudança para problemas complexos vai vir de cima para baixo. Não vai. Veja o que aconteceu com as Dez Medidas contra a Corrupção, com o pacote anticrime. A mudança não vai ocorrer de cima para baixo. Se for para a gente mudar, a gente tem que arregaçar as mangas e construir o país que a gente quer de baixo para cima, como sociedade civil organizada.

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Está confiante nessa missão? Eu confio na possibilidade de mudança porque vi uma operação impossível acontecer com a Lava-Jato. E depois, quando teve a condenação de indenizar o ex-presidente Lula, se alguém me falasse o que iria acontecer nas 36 horas seguintes eu não iria acreditar. Mais de 12 mil pessoas se mobilizaram e fizeram depósitos Pix na minha conta sem eu pedir, totalizando mais de 500 mil reais.

O senhor ainda tem orgulho da Lava-Jato? Faria algo diferente? Eu tenho orgulho de ter participado dessa grande equipe de agentes públicos que, com a ajuda da população, conquistou três coisas inéditas no Brasil: colocou corruptos poderosos atrás das grades, conseguiu recuperar 15 bilhões de reais e conseguiu revelar o monstro da corrupção brasileira. Isso era algo esperado desde o Descobrimento do Brasil, desde que o padre Antonio Vieira disse que o verdadeiro ladrão não era aquele que era enforcado por roubar galinhas, mas que o ladrão eram os governantes que chegavam na nossa terra para roubar nossos bens e ainda mandavam enforcar. Onde você vê as pessoas avançando contra os corruptos que saqueiam o país, vai haver uma reação de quem quer se manter no poder. A Lava-Jato pela primeira vez rompeu o ciclo histórico de que a impunidade gera corrupção e corrupção garante impunidade. Tenho orgulho de ter feito parte desse processo mas tenho plena certeza de que isso não é suficiente. A Lava-Jato deu um grande passo, mas dá para avançar muito mais. Sempre dá para fazer algo diferente. Mas olho para trás e vejo que não deixei de fazer nada dentro da lei, de modo legítimo, para que a gente conseguisse avançar contra o sistema político corrupto que ainda governa nosso país.

“Onde você vê as pessoas avançando contra os corruptos que saqueiam o país, vai haver uma reação de quem quer se manter no poder. A Lava-Jato pela primeira vez rompeu o ciclo histórico de que a impunidade gera corrupção e corrupção garante impunidade”

Como o autismo virou um tema de campanha? Identifiquei nessa área um problema muito grande na área de saúde pública, que demanda atenção e solução. Foi só recentemente que foram identificados tratamentos e terapias com comprovação científica. Antes as crianças eram institucionalizadas e havia um entendimento de que o autista teria problemas intelectuais pela vida toda. Os estudos mostraram que terapias comportamentais poderiam elevar a capacidade intelectual. Na época, ninguém acreditou, porque era uma mudança muito brusca de entendimento. Mas os tratamentos começaram a ser replicados e viram que realmente dava certo. As terapias foram se aperfeiçoando e novos métodos foram aperfeiçoados. Mas as terapias para autismo precisam ser intensivas e precoces, é preciso começar o quanto antes, para aproveitar a plasticidade da primeira infância. É um assunto em que a medicina evoluiu muito recentemente, mas a maioria das crianças ainda não tem acesso. Um bom plano de saúde pode pagar até 25 horas semanais de terapia, mas o SUS dá zero de tratamento. Por necessidade familiar comecei a estudar o assunto e isso não escondo, mas não tenho intenção de ficar falando algo que pode limitar ou impactar no futuro a vida de uma criança. Por estudar o assunto, ele se tornou uma pauta relevante para mim.

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