As recentes revelações sobre as ramificações das facções criminosas com a política e os mais diversos setores privados para lavar o dinheiro do tráfico somadas à persistência das altas taxas de criminalidade no país e à cobrança de novas estratégias de ação a nível federal levaram a Procuradoria-Geral da República (PGR) a definir um prazo para a criação de uma unidade especializada no combate às organizações criminosas.
Espécie de versão nacional do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), com procuradores autorizados a agir em mais de um estado e em investigações simultâneas, o novo departamento tem a expectativa de ser lançado até agosto, de acordo com o vice-procurador-geral, Hindenburgo Chateaubriand.
“Hoje, nós sabemos que um procurador sozinho não tem condições de levar a fundo o combate ao crime organizado. No Ministério Público Federal, a gente lida essencialmente com o trabalho feito pela Polícia Federal. Da nossa parte, o foco é o tráfico internacional de drogas, cujas organizações atuam num território enorme dentro e fora do país. Eles trabalham com uma facilidade incrível e, nós, temos uma série de impedimentos burocráticos para atuar, além de falta de integração. Um procurador sozinho não tem condições de levar a fundo o combate ao crime organizado”, afirmou Chateaubriand a VEJA.
O vice-procurador-geral explicou que a estrutura atual do MPF não permite um trabalho integrado entre os procuradores e que a “limitação territorial é indesejável quando se combate fenômenos complexos, que ultrapassam fronteiras”. Segundo Chateaubriand, a nova unidade fará com que a instituição deixe de ser uma “mera expectadora” no combate ao crime organizado para se tornar uma referência. “Nosso conselho superior ainda precisa que os procuradores a compor esse grupo tenham atribuições nacionais. Isso deve acontecer até o final do semestre ou, no máximo, o mês de agosto.”
A intenção da PGR, sob o comando de Paulo Gonet desde dezembro de 2023, é que o grupo comece com ao menos vinte procuradores. “Eles vão poder atuar não apenas em relação às organizações criminosas, mas também em questões de direito ambiental e digital, por exemplo, que também ultrapassam fronteiras”, disse Chateaubriand.
Segundo o vice-procurador-geral, a criação do Gaeco nacional ainda facilitará uma troca efetiva de informações com membros da União Europeia a partir de um convênio com a Eurojust. A agência focada em questões judiciais dos estados-membros possui um vasto material sobre grupos criminosos que atuam também no Brasil.
“Flagelo”
No início de março, durante a primeira reunião do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos estados e a União (CNPG), o procurador-geral da República, Paulo Gonet, firmou o compromisso de combater o “flagelo” do crime organizado. “Devemos ter uma ação conjunta para unirmos todas as nossas competências em uma ação eficiente nesse combate. É um desafio que eu assumi e, se eu tiver o apoio e a parceria de todos os procuradores-gerais, tenho certeza que teremos um trabalho proveitoso”, declarou. Em apoio a Gonet, o presidente do CNPG, César Mattar Júnior, do Ceará, destacou que a “unidade não pode ser uma retórica, tem que se traduzir em trabalho”.