Nas diretrizes para o programa de governo, o PT mostrou que não atina bem o papel atual das empresas estatais. Na diretriz nº 80, prometeu fortalecer “os bancos públicos — como BB, CEF, BNDES, BNB, Basa e a Finep — em sua missão de fomento ao desenvolvimento econômico, social e ambiental e na oferta de crédito a longo prazo”.
A Revolução Industrial da Inglaterra não precisou de empresas estatais. Não foi o que ocorreu nos países europeus do continente que buscavam se industrializar para alcançar a prosperidade e a riqueza dos ingleses. Não possuíam as mesmas condições, construídas ao longo de décadas, como bancos e ferrovias. Tratava-se de “falha de mercado”: o setor privado não conseguia atuar nessas áreas, inclusive por não haver oferta adequada de crédito.
Nessa situação, cabe ao Estado suprir a falha via empresas estatais. Assim que o setor privado for capaz de assumir essa atividade, a falha desaparece. Cumprirá, então, privatizá-las e assim aumentar sua eficiência. O Japão privatizou as suas estatais no fim do século XIX e a Europa nos anos 1980 e 1990. No Brasil, as privatizações da Telebras, da Cia. Vale do Rio Doce e da Embraer são ótimos exemplos dessa realidade.
“O Brasil dispõe de empresas privadas de classe mundial e de mercado de capitais capaz de oferecer crédito”
O país dispõe de empresas privadas de classe mundial e de um mercado de capitais capaz de oferecer crédito de longo prazo. Não há, pois, razões de natureza econômica ou social para manter empresas estatais. Sucede que o PT e outros segmentos da esquerda as entendem sob outra perspectiva. Movidos por visões anticapitalistas, pela defesa ultrapassada da intervenção estatal na economia ou por um suposto papel estratégico das estatais, creem que elas deveriam promover o desenvolvimento. Não percebem que o “desenvolvimentismo” do pós-guerra ficou para trás ou deu errado.
O BB é a prova inconteste desse arcaísmo: não poderá exercer as funções do passado, quando emprestava sem peias, a juros de subsídio, para apoiar a agricultura e a indústria, graças ao acesso ilimitado de recursos no Banco Central, sem custos, via “conta movimento”. Felizmente, para ele e para o Brasil, a conta foi extinta. Se o PT levar adiante suas ideias obsoletas, abusará do poder de acionista controlador, proibido pela lei. Prejudicará os acionistas minoritários e o banco.
O BB poderia atender a tais posições intervencionistas se os subsídios corressem à conta do Orçamento, o que não parece simples diante da delicada situação fiscal do país. Mesmo assim, haveria o risco de, como fizeram Guido Mantega e Arno Augustin no governo Dilma, o Tesouro não honrar tempestivamente o compromisso. Como dificilmente o PT se dará conta do erro de suas ideias, o BB precisará de argumentos para buscar convencer Lula de que vivemos outros tempos.
Já o BNDES deve continuar estatal. Supre falhas de mercado de início mencionadas, apoiando atividades não atrativas para o setor privado, mas terá importância declinante diante do crescente papel do mercado de capitais.
Publicado em VEJA de 7 de dezembro de 2022, edição nº 2818